De Olho na História
João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

O Oeste e as bases da democracia nos Estados Unidos - 04/08/2006
O surgimento da maior potência do mundo

'

Imagem-de-homem-a-cavalo-junto-ao-gado
A agricultura e a criação de gado foram as
principais bases econômicas do Velho Oeste.

John Wayne e Clint Eastwood são os arquétipos dos típicos cowboys do século XIX para a grande maioria de habitantes dos Estados Unidos e do mundo. Seus personagens de filmes de “bang-bang” (como costumavam ser chamadas tais produções cinematográficas até bem recentemente) sempre apresentaram características tais quais a virilidade, pouca ou nenhuma sociabilidade, rudeza e pioneirismo. Será, no entanto, que eles realmente personificam com a devida competência a história daquele período?

Para responder essa pergunta temos que voltar ao século XIX e a expansão territorial norte-americana rumo ao Oeste antes mesmo de seu início. Temos que nos lembrar que a Independência das 13 colônias britânicas, ocorrida entre 1776 e 1781, motivou o surgimento de uma nação que carregava consigo as bandeiras da liberdade, do liberalismo e da prosperidade. Essas metas eram reconhecidas como propósitos e objetivos até mesmo em sua constituição (documento vigente até os dias de hoje), criada por seu patrono e primeiro presidente George Washington.

Nesse sentido grandes levas de imigrantes europeus adentraram o país durante a segunda metade do século XIX em busca da realização do sonho de emancipação econômica, liberdade individual (superando o ostracismo e a pobreza que viviam no campo ou nas nascentes cidades industriais européias) e terra.

Eram ingleses, italianos, irlandeses, franceses, galeses, escoceses e europeus de tantas outras nacionalidades que tinham em comum não apenas os seus sonhos, mas também as origens humildes, pouca ou nenhuma instrução, a rudeza e que chegavam nos Estados Unidos com pouco mais que as roupas do corpo e a família a tiracolo.

Imagem-de-pessoas-simples-sentadas-com-semblantes-cansados
Os pioneiros que foram para o Oeste eram pessoas que pouco ou nada
tinham a perder, descendiam de europeus que vinham em busca do
sonho de liberdade e prosperidade da nova nação e carregavam
suas famílias, mantimentos e armas em seus carroções.

Foram incorporados ao cotidiano da estreita faixa de terras que originou a mais poderosa nação do mundo nos séculos vindouros e se atiraram numa corrida desenfreada rumo as terras recentemente compradas pelos americanos na região da Louisiana junto a França. Enquanto permaneceram nas 13 colônias originais foram pouco mais do que mão de obra abundante que barateou o mercado local e permitiu a prosperidade das manufaturas e da agricultura.

Homens e mulheres calejados pelas duras experiências vividas na lavoura e nas primeiras fases da industrialização européia, esses imigrantes sabiam que o futuro para eles não estava na continuação de sua existência enquanto trabalhadores urbanos ou rurais. Imaginavam tais pessoas que a liberdade e o progresso relacionavam-se a posse de propriedades e negócios. A fronteira que se delineava a oeste do território do recém-libertado país era o que realmente lhes daria a possibilidade de consecução de seus sonhos...

A eles se juntaram todas as pessoas que pouco ou nada tinham a perder em trocar o pouco que haviam consolidado nas cidades e campos do leste pela aventuresca e pioneira expedição rumo ao Oeste. Sabiam que teriam que enfrentar o inóspito território local, a natureza ainda selvagem e principalmente os nativos. Tinham consciência que teriam que construir suas vidas em regiões sem qualquer estrutura e que a eles cabia o importante papel de “agentes civilizadores”.

Eram descendentes de colonizadores que haviam chegado nas 13 colônias ao longo dos dois séculos iniciais do empreendimento britânico e que ainda não haviam logrado sucesso em realizar o sonho de “fazer a América”. Constituíam a parcela mais pobre e mão de obra menos qualificada que havia sido relegada as funções braçais e aos trabalhos pesados e embrutecedores.

Foram justamente os imigrantes e a população mais pobre e desprovida dos estados do leste que se mobilizaram em direção as novas terras da fronteira oeste dos Estados Unidos. Esse grande contingente populacional teve a árdua tarefa de desalojar os índios de suas terras e de, nos dizeres dos nativos, violentar a terra com a qual tinham relações fraternas que se perdiam no tempo de tão antigas.

Imagem-de-cidade-do-Velho-Oeste
Dodge City (em 1883) foi uma das mais importantes cidades
do Velho Oeste. Apresentava todas as características mais
marcantes das poeirentas e violentas cidades do
florescente oeste norte-americano.

Constituíram caravanas e dotaram-se de recursos que lhes permitiam não apenas enfrentar as adversidades, mas também iniciar a prospecção das possibilidades das terras para as quais estavam se destinando. Foram aos poucos realizando a “maior reforma agrária” do mundo (conforme alguns especialistas e pesquisadores) ao delimitar as propriedades que originaram ranchos, depois vilas que vieram a se tornar cidades.

Ao trilhar os rumos daquelas terras também estipularam as rotas, construíram as estradas e permitiram o mapeamento local. Estimularam o surgimento das grandes ferrovias que viriam a ligar o leste e o oeste num contínuo movimento de massas e produtos que muito contribuíram para o firmamento de uma poderosa e riquíssima nação.

Foram os responsáveis pelo estabelecimento de centros de produção agrícola e produção pecuária que celebrizaram a história local e povoaram o imaginário de escritores e roteiristas que, por sua vez, retransmitiram essa leitura dos acontecimentos para as novas gerações de americanos através da literatura, dos quadrinhos, do cinema e da televisão.

Entretanto, a despeito de todo o romantismo e prosperidade associados a conquista do oeste, há também o lado belicoso e violento que levou ao desaparecimento de grupamentos indígenas inteiros e também a anexação de territórios que até então pertenciam aos mexicanos. Arregimentados pelo governo dos Estados Unidos, os pioneiros compuseram forças armadas que se confrontaram com as tropas do país vizinho e que levaram a melhor na disputa pelas ricas terras de estados como a Califórnia, o Novo México ou o Texas (entre outros).

As regiões conquistadas revelaram-se de fundamental importância para promover o desenvolvimento da pátria do Tio Sam. Possuíam ricas jazidas de minerais (entre os quais o petróleo) e que se tornaram no século XX centros de desenvolvimento tecnológico onde estão algumas das mais importantes metrópoles daquele país, como Los Angeles, Dallas e São Francisco.

Imagem-de-revolver
O revólver Colt calibre 45 foi uma das armas mais populares
da conquista do Oeste e rivalizava na preferência dos
cowboys com as armas da marca Winchester.

Aplicavam-se nessas disputas territoriais com indígenas e mexicanos alguns conceitos que posteriormente se tornariam políticas de estado do governo norte-americano. Antecipavam-se em alguns anos a “big stick policy” (a política do porrete) e a “democrática” idéia de que a “América pertencia aos americanos”. Os americanos ainda se sentiam compelidos a enfrentar todas as dificuldades que se colocavam em seu caminho acreditando que isso fazia parte de seu “destino manifesto” de se tornar a maior potência mundial.

No caso da “big stick policy” e da idéia de que a “América aos americanos pertencia” o que teoricamente se pretendia era que os países da América recém libertados do jugo das metrópoles européias ou que ainda estivessem lutando por sua emancipação teriam o apoio dos “ianques” em caso de novas ameaças das antigas potências coloniais que os haviam dominado.

O que não se esclarecia totalmente é que o “porrete” era acionado sempre em benefício maior de seu articulador do que em favor dos parceiros que por ele deveriam obter ganhos. Também não se explicava com a devida competência que a América deveria pertencer aos “norte”-americanos...

Nesse ponto revela-se também que os conceitos de democracia estão submetidos a lógica liberal e a seus claros propósitos de consolidar a economia de mercado e expandir as possibilidades de lucro dos americanos e, principalmente, de seu governo. O enriquecimento não é consequência da expansão e do militarismo necessários a sua consecução, mas o principal mote de toda a expedição pioneira que levou ao surgimento da poderosa nação que conhecemos atualmente.

Deve-se ainda ressaltar que o caráter intervencionista e beligerante dos Estados Unidos (que o levou ao Vietnã e também a ações militares em praticamente todos os continentes, com especial destaque para as operações no Oriente Médio) também foi, de certa forma, moldado nas experiências da conquista do Oeste.

Não é outro o motivo que levou tanto Clint Eastwood quanto John Wayne a celebrizarem-se como astros do cinema (que ironicamente tem suas principais bases de produção na região Oeste) não apenas como durões cowboys que enfrentavam com poucas palavras e muita coragem e determinação os contratempos do Velho Oeste, mas também como militares rígidos e decididos que comandavam tropas em preparação ou ação em batalhas do século XX...

Avaliação deste Artigo: 3 estrelas
COMPARTILHE

DeliciusDelicius     DiggDigg     FacebookFacebook     GoogleGoogle     LinkedInLinkedIn     MySpaceMySpace     TwitterTwitter     Windows LiveWindows Live

AVALIE O ARTIGO





INDIQUE ESTE ARTIGO PARA UM AMIGO










5 COMENTÁRIOS

1 alcides medeiros duarte - araranguásc.
muito bem escrito,ainda mais em se tratando de algo que aconteceu já a tanto tempo.As ilustrações princilpamente da cidade de Dodge City, adorei.muita veracidade.parabéns.
03/08/2010 19:46:05


2 sergio RJ - Rio de Janeiro
muito interessante o artigo, o conhecimento do passado é que ensina os procedimentos do futuro, é a partir do conhecimento que o Homem direciona seu raciocínio.
03/07/2009 20:46:19


3 Salete - Montes ClarosMG
Como dizia a minha avó: Quem sai aos seus não degenera! O Bush seguiu muito bem os ensinamentos de seus antepassados...
14/12/2008 09:57:05


4 tessa - laguna
bom artigo! eu espava mesmo querendo ler algo sobre isso valeu! se escreve algo sobre os estados unido no velho oeste me fala! xau!
19/06/2008 14:48:25


5 EUZEBIO - criciuma sc
bom artigo!
28/04/2008 15:32:15


ENVIE SEU COMENTÁRIO

Preencha todos os dados abaixo e clique em Enviar comentário.



(seu e-mail não será divulgado)


Os conceitos e opiniões emitidos em artigos assinados são de inteira responsabilidade dos autores.