Filosofando
João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

O que não mais ensinamos em casa e na escola... - 06/06/2017
João Luís de Almeida Machado

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rendimento, análise, crítica

Os tempos mudaram. A nova geração de estudantes é formada por nativos digitais. A globalização exige que as pessoas entrem na disputa acirrada por espaço no mercado de trabalho. A competição é a tônica e, com ela, as cobranças aumentam. A velocidade da vida faz com que o dia pareça cada vez mais curto, sempre parecendo faltar tempo para algumas coisas essenciais em nossas existências...

Já ouvimos isso tantas vezes e continuaremos a escutar por algum tempo se nada fizermos para rever nossas prioridades.

A educação, por exemplo, área essencial para a formação destas novas gerações, o quanto incorporou destas novas demandas a seu cotidiano? A metrificação e os exames nacionais e mundiais que avaliam o rendimento são exemplos daquilo que aos poucos foi surgindo na seara das escolas sem que fosse possível aos professores uma análise mais completa e crítica destas demandas, surgidas nos anos 1990 a partir de ações do FMI e do Banco Mundial...

A reformulação dos currículos, dando ênfase a questão das competências e habilidades, o surgimento de novas teorias que versam sobre inteligências múltiplas, o uso de tecnologias educacionais no contexto escolar com maior frequência, a personalização como meta para melhor atender os estudantes, o ensino híbrido, as metodologias ativas e tantas outras mudanças ocorridas e em desenvolvimento... Tudo isso está sendo devidamente estudado, avaliado, incorporado aos poucos ao trabalho educacional e explicado da forma como deveria aos estudantes e a toda a comunidade atendida?

A resposta todos nós já sabemos, ou seja, um sonoro NÃO é o que recebemos ao questionar as mudanças em curso e a velocidade a elas implementada.

O que pensar a respeito de tudo isso se as informações são fragmentadas e o tempo de análise e compreensão é curto demais para tudo o que se demanda? O que se quer é apenas a possibilidade de pensar as alterações de forma a se implementar, de fato, o que for considerado procedente e válido pela sociedade e, no caso das escolas, pela comunidade envolvida.

Ao refletirmos sobre isso constatamos, por exemplo, que há ensinamentos que não mais ocorrem nos bancos escolares e, tampouco, no âmbito familiar. Saberes importantes, relacionados a questões essenciais, de formação do caráter, definição de valores, interesse pelo conhecimento, relações interpessoais e, mesmo, respeito próprio, estão sendo deixadas de lado.

Se fizéssemos uma pequena lista abordado estas lições que estão hoje esquecidas ou relegadas ao ocaso/ostracismo nas escolas e famílias poderíamos elencar tópicos como:

- Respeito pelo outro, em especial pelos mais velhos;

- Respeito por si mesmo;

- Respeito pelo meio-ambiente, por outros seres vivos, por aquilo que é construído coletivamente;

- Capacidade de ouvir o outro, dando a ele o devido tempo, reconhecendo suas opiniões, ainda que diferentes das suas e se permitindo apreciar e aprender com o que é de seus interlocutores;

- Capacidade de trabalhar em grupos, superando o individualismo;

- Capacidade de se manifestar com argumentos e não por meio de opiniões vagas ou achismos;

- Interesse pelo conhecimento em suas diferentes formas;

- Interesse genuíno pela leitura e pelas artes;

- Capacidade de se relacionar de forma autêntica sem que interesses específicos norteiem as interações;

- Compreensão e aplicação de conceitos de ética e cidadania;

- Valorização de suas origens, hábitos e costumes;

- Tolerância em relação as diferenças e compreensão de que a diversidade é o que torna os seres humanos mais ricos e plurais em sua existência;

- Capacidade de se solidarizar, ajudar, ter empatia e iniciativa para com os outros e em busca de um mundo melhor.

Ensinamentos como estes estão, teoricamente, embutidos no currículo escolar, nos temas transversais e devem repercutir na prática dos professores, afinal, um exemplo vale mais que mil palavras. No ambiente doméstico, entre os familiares, o discurso supera, também, a prática.

Temos mais situações em que imperam os sermões, ainda que proferidos por adultos que cada vez mais se eximem de seus atos concretos e agem de forma infantilizada, numa eterna busca de sua própria satisfação e eliminação de qualquer tipo de responsabilidade maior mesmo no que tange à educação de sua própria prole.

Não que os educadores não tenham tal responsabilidade, pelo contrário, a eles cabe assumir compromissos também neste campo, no entanto, sua ação é complementar a da família no que tange a tais saberes. A formação mais ampla e plena tem que ser compartilhada e esta não pode ocorrer numa base em que aos professores e demais componentes das escolas respondam por 50% ou mais no que tange a tais conhecimentos, valores e ações.

O respeito pelas outras pessoas é algo que se vê, se percebe e em relação ao qual se aprende em casa, inicialmente, com as atitudes e ações dos pais ou responsáveis. A escola irá reiterar estes comportamentos por meio da prática diária de gestores, professores e demais funcionários. Também irá trabalhar isso por meio de conteúdos, textos, tarefas ou outras atividades, que complementam as ações e referendam tais práticas de respeito.

O mesmo é válido para todos os demais saberes que temos deixado de lado em casa e na sala de aula, ou seja, da capacidade de escutar, da tolerância e respeito em relação as diferenças, a valorização das origens, o interesse pela ciência e pelas artes, o hábito da leitura ou a empatia e solidariedade são todas ações que começam em casa, são reforçadas na escola e que, pelos estudos, se consolidam ainda mais entre os alunos desta nova geração. Diga-se de passagem, que eles não apenas precisam destes exemplos, ações e orientações... O que vemos hoje, num mundo em que crianças, adolescentes e jovens padecem como nunca de males como depressão, ansiedade, síndromes variadas, estresse, entre outras enfermidades físicas e psíquicas, é que eles estão gritando cada vez mais alto, por meio de suas vozes, atitudes e corpos, que precisam muito de ações que os levem a uma vida mais equilibrada, saudável e feliz.



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