A inclusão de crianças surdas ao sistema educacional - 12/11/2007
Por Mário Osava
Rio de Janeiro, 11 março (IPS) - Eduardo Monte, 51 anos, é um engenheiro brasileiro surdo. Consultor para várias empresas pequenas, ele também atua na área de projetos sociais no Rio de Janeiro.
Aos seis anos começou a sofrer de problemas de
audição, tornando-se mais surdo com o passar de
cada ano, e mesmo assim, conseguiu estudar em escolas normais. Para ele
foi uma experiência muito positiva embora tenha enfrentado a
eventual discriminação de professores que
não souberam lidar com alunos portadores de necessidades
especiais.
A experiência de Eduardo é uma rara
exceção no Brasil. Um estudo sobre a
educação dos surdos, realizado no ano 2003 pelo
IBGE, identificou apenas 344 alunos surdos matriculados nas
universidades brasileiras.
O Ministério de Educação (MEC) estima
que 80% das crianças e adolescentes surdos não
freqüentam a escola. Segundo o censo oficial de 2000, o Brasil
tem uma população de 182 milhões, dos
quais 5,75 milhões são surdos, equivalente
à população inteira da Dinamarca.
Deste total, 796.344 tinham menos de 24 anos. Já no censo de
2003, foi constatado que 56.024 surdos estavam matriculados nas escolas
primárias e secundárias do pais, com 2.041
formando-se do ensino médio nesse ano.
Para Marlene Oliveira Gotti, assessora técnica da Secretaria
de Educação Especial do Ministério de
Educação, muitos pais de família nem
sabem que os seus filhos surdos possuem o direito de estudar. "Das
poucas crianças que vão à escola", diz
ela, "muitas acabam desistindo porque não conseguem
acompanhar instrução em português
falado, já que o método mais utilizado
é fundamentado no oralismo".
A intenção da Política de
Inclusão Educacional do governo tem como objetivo reverter
esta situação e assumiu o desafio de proporcionar
"educação para todos" através da
inclusão de 30% de crianças surdas à
rede de ensino dentro dos próximos três anos. O
projeto visa instruir a Língua Brasileira de Sinais, ou
LIBRAS, para 27 mil professores e intérpretes em centros de
treinamento estabelecidos nos 27 capitais estaduais brasileiros. Ainda,
cursos de pós-graduação em LIBRAS,
reconhecida legalmente em 2002 como a língua oficial da
comunidade surda no Brasil, serão estabelecidos.
O projeto prioriza a inclusão de crianças com
deficiência auditiva dentro de salas de aulas normais com
já foi realizado com portadores de outras
deficiências. Atualmente, a maioria de alunos deficientes
recebem instrução em salas ou
instituições especiais.
Segundo Gotti, a imensidão do Brasil impossibilita o acesso
de alunos surdos às escolas especiais do pais, o quinto
maior em território do mundo. Muitos teriam que mudar longe
de casa para poder assistir a uma escola especial para surdos.
Ainda mais, o objetivo é tanto a
educação quanto a inclusão social. "A
escola representa a sociedade. Não podemos criar mundos
separados para aqueles que ouvem e aqueles que não" diz
Gotti. Para ela "a compreensão profunda do potencial do
deficiente auditivo pode acabar com o preconceito e a
discriminação, e esta compreensão
é produto da convivência e do conhecimento
pessoal."
Segunda a Lei, nenhuma escola pode rejeitar uma criança com
necessidades especiais, e todas as instituições
educativas devem adaptar para atender estas necessidades, diz Gotti.
A Federação Nacional de
Educação e Integração de
Surdos, FENEIS, tem questionado a eficácia desta
política, e apóia a criação
de escolas bilíngües (português e
língua de sinais) para atender às necessidades
desde a pré-primária.
Segundo Tanya Felipe, pesquisadora em lingüística e
assessora da FENEIS, a incorporação de
crianças surdas não proporciona
inclusão verdadeira. Ela cita a qualidade
precária das escolas e o fato que "nem os professores nem as
redes municipais e estaduais, responsáveis pela
educação primária e
secundária, querem estas crianças" diz ela para a
Inter Press Service (IPS).
O deficiente auditivo é visto como uma carga. Senta-se
silenciosamente no fundo da sala, sem contribuir nem aprender nada.
"Uma professora admitiu que nem percebeu que tinha um aluno surdo na
sala até o final do ano", citou.
"O projeto do governo inclui a criação de salas
de apoio para os deficientes auditivos, já reconhecendo que
as salas normais não conseguem dar conta do recado", diz a
lingüista Tanya. "Ao invés de dar `apoio` devem
ensinar em ambos idiomas, português e LIBRAS," frisou. "Os
surdos são diferentes de outros portadores de
deficiências pois possuem uma língua
própria, visual, sinalizada, com uma gramática
única e logo uma ‘cultura’ diferente",
anotou.
A maioria de crianças com deficiências auditivas
vem de pais ouvintes que não sabem a Língua de
Sinais, portanto, as crianças chegam à escola sem
linguagem nenhuma. Já que a criança chega
à escola sem saber nem a língua portuguesa nem a
Língua de Sinais "não podemos ter a
alfabetização como meta - ela tem apenas um ano
de idade em termos lingüísticos e não
seis ou sete" diz a especialista.
A doutora Tanya acredita que a criança precisa ter contato com a "comunidade dos surdos" para adquirir a linguagem através de interação social verdadeira, acrescentou. Mesmo assim, reconheceu que o projeto do MEC representa um "passo para frente", levando a educação para crianças surdas até o interior do país, e obrigando as escolas que anteriormente se esqueceram dos surdos a aceitá-los. "Agora", segundo ela, "a dificuldade é criar as condições em que o aluno surdo pode aprender."
A iniciativa do governo conta com o reconhecimento de
instituições federais como o INES (Instituto
Nacional de Educação de Surdos),
depósito de décadas de experiência. O
INES, com 600 alunos surdos, terá o primeiro departamento
universitário Português - LIBRAS, anunciou o
diretor Marcelo Cavalcanti.
O departamento começará a funcionar no final
deste ano. O Instituto já ministra cursos de LIBRAS para
professores de estados fora do Rio de Janeiro, na forma de
seminários promovidos pelos governos locais, "mas a
resistência inicial à política de
inclusão continua sendo uma barreira formidável",
diz Cavalcanti.
Para Eduardo Monte, o engenheiro surdo, a melhor forma de ensino para
um estudante surdo, seja numa escola normal ou especial "depende da
habilidade de cada um a se comunicar. Alguns conhecem mais a
Língua de Sinais enquanto outros são oralizados
(falam e lêem lábios), e outros são
bilíngües (falam Português e LIBRAS)"
No caso do Eduardo, a comunicação oral predomina,
devido, tal vez, ao fato de poder falar português antes de
perder a audição.
Fonte
Editora ARARA AZUL
Este texto pode ser reproduzido, livremente com fins educacionais,
desde que a fonte seja citada:
Home Page www.editora-arara-azul.com.br
Notas:
1) O
presente artigo de autoria de MÁRIO OSAVA, traduzido e
divulgado por AARON RUDNER através de
brasils@yahoogrupos.com.br no dia 25 de março de 2005,
publicado com texto original em inglês, no Jornal
USA Today,
encontra-se
disponível para leitura em E-BOOKS da Editora ARARA AZUL
(www.editora-arara-azul.com.br) a partir de abril de 2005. Segue a
este, mensagem de divulgação do mesmo.
2) O
Sr. MARCELO CAVALCANTI é vice-diretor do INES.
Mensagem de AARON RUDNER em http://br.groups.yahoo.com/group/brasils/ em 25/03/05
“Uma
amiga surda em Chicago encaminhou este artigo para mim. Foi divulgado
pela IPS, Inter Press Service, uma agência que fornece
notícias a jornais no mundo todo. O artigo original era em
inglês e eu o traduzi pois acho importante que todos tenhamos
conhecimento que os acontecimentos que vivemos aqui estão
sendo observados pelo mundo.
Aliás, que um
"país em desenvolvimento" tome atitudes como adotar a Lei de
Libras e implementar uma política de inclusão de
tamanha escala representa um marco na história dos surdos.
Por tanto, é tão importante que nós,
surdos e ouvintes envolvidos na comunidade de surdos, ajamos para que o
Brasil implemente uma política verdadeiramente inclusiva e
não apenas abandonar alunos surdos em escolas de ouvintes
como está sendo feito.
Assim como o Brasil olha para
fora, outros países também olham para
cá.
Os nossos passos
afetarão não apenas a vida dos surdos aqui, mas
no resto do mundo também. A minha amiga recebeu o artigo
através de um grupo servidor de notícias do mundo
surdo.
Assinar é
grátis e o endereço, caso queira assinar,
é:
USA-L_News@yahoogroups.com
Por favor, peço que
divulguem esta notícia.
1 lorena cristina dias macedo - quirinopolis
e muito bom esse projeto ,estamos fazendo um tese sobre esse asunto.
28/09/2010 16:12:34
2 Lorene Cristina Vasconcelos Donda da Silva - Rio de Janeiro
É triste presenciar um desfecho tão ruim para um país formidável como o nosso, do qual, nos gabamos de sermos diferentes, misturados, cores, culturas, gestos...
Temos a tendência de copiar o que está fora do país e achei muito interessante quando essa frase foi citada: Assim como o Brasil olha para fora, outros países também olham para cá. essa é a mais pura verdade! Vamos parar de copiar aquilo que é lindo, belo, maravilhoso e modificar nossa maneira de ver as coisas. Ver e não fingir...
Até quando vamos nos iludir que apenas as leis educacionais vão solucionar nossos problemas nas escolas de todo país? E não digo só as escolas públicas, mas as privadas também. Não importando o ano, a fase ou o ciclo em que o aluno se encontra, estamos sendo sempre condescendentes com os problemas que possuímos e, em se tratar de educação, nem ao menos, fazemos nossa parte. Sejamos sinceros quanto professores: quantos buscam uma fonte de novos conhecimentos? Quantos buscam entender e atender a necessidade de um aluno? Quantos de nós já ignoramos as oportunidades que nos são concedidas de melhorar nosso desempenho como profissional?
A verdade e a mais pura verdade é que sempre será mais fácil por a culpa no sistema, até por que, ele não se defende mas, se cada profissional tivesse a ousadia de se preparar, fazer sua parte e contagiar o maior número de pessoas a fazerem o mesmo, tudo seria diferente. Existiria uma educação de qualidade, uma inclusão verdadeira e cidadãos capazes de modificar o mundo.
Nas últimas semanas, ouvi da boca de uma grande profissional: “...os surdos são somente surdos. Eles não ouvem mas sentem, pensam e agem como qualquer pessoa no mundo!” – essas palavras fizeram com que eu enxergasse de maneira mais apropriada a necessidade de todos os profissionais da educação conhecerem as LIBRAS, não por ser um requisito legal, mas por ser necessário. Vivemos em um país grande, com milhares de pessoas e todos se comunicam. Então por que não fazermos um esforço para ampliarmos a nossa comunicação, pararmos de ser egoístas e enxergarmos que somos a extensão do outro? Precisamos manter relações sociais, faz parte da necessidade de sobrevivência de todos os seres humanos.
01/04/2009 16:34:05
3 Susy Dayanne Leal - Tangará da Serra MT
Sou Deficiente Auditiva,estou estudando a faculdade UNIC Tangará da Serra Sul de Odontologia. Tenho noticia. Eu não entendo o que os professores Faculdade Unicexplicam. Eu já conversei com Diretora Sônia mas ela não aceita a professora interprete pq ela só interesse o dinheiro e está nem aí os alunos.
Eu e o meu pai Nelson fomos no forum e o promotor não aceita nosso pedido.
Não acredito. Na verdade,o promotor não cumpriu.
Estou lutando muito.. Não posso sofrer e o meu pai também não pode!
Não posso deixar a aula da faculdade.
Não consigo apagar de faculdade da minha memória.
Não consigo viver sem professora de libras. /
Preconceito ou ignorante?
Abraço para todos vocês!
31/03/2009 16:46:26
4 Leonira O. Rodrigues - Vilhena RO
Ol@ a tod@s internautas que direta ou indiretamente são amantes de LIBRAS. Eu a mais de dez anos pesquiso, estudo, faço curso sobre essa temática, e no momento estou precisando de material que aborde os temas: COMUNIDADE SURDA, IDENTIDADE SURDA, LINGUAGEM SURDA.
Se possível me envie ok.
Abarços.
Referente ao artigo amei realmente temos que refletir a educação para surdo em nossas escolas, hoje há uma inclusão excludente, mas existe profissionais que estão se mobilizando para que haja uma inclusão de qualidade no âmbito educacional e com certeza isso será uma realidade concreta. Temos que educar na diversidade não só para surdos ou deficientes em geral, mas sim, para todos numa mesma perspectiva.
13/01/2009 15:38:35
5 Antonio Ricardo Penha - Rio de Janeiro
No dia 09 e 10 de outubro estarei juntamente com a minha mulher Christiane Penha no I Congresso Nacional de Tradução e Interpretação da LIBRAS na Universidade Federal de Santa Catarina, onde apresentaremos um trabalho sobre o tema. Não somos surdos. Mas somos testemunhas da capacidade intelectual desse grupo que tem conseguido vencer mesmo diante de tantas barreiras impostas pelo preconceito e principalmente pelo desconhecimento das suas habilidades profissionais. Os surdos não precisam de favores e sim terem acessos aos direitos previstos na constituíção para todos os brasileiros. Sou graduado em Teologia com mestrado em filosofia, e nas duas graduações tive colegas surdos. Atualmente sou aluno do curso de pedagogia e lá estão os surdos estudando e participando ativamente dos trabalhos. Creio que a lição que nos passam está bem clara. Precisamos estar unidos a esta causa,pois sem dúvida alguma é um precedente para outras que incentiva a menoria a buscar por direitos previstos na lei.
26/09/2008 19:34:53
6 marisa - limeira sp
Tenho exatamente as mesmas dúvidas do Vinícius G. de Melo, vcs podem me ajudar?
Obrigada.
14/09/2008 17:12:22
7 Clélia Regina Ramos - Petrópolis
Kelly, envie um e-mail diretamente para editora@uninet.com.br e a EDITORA ARARA AZUL terá prazer em ajudá-la com indicações específicas sobre seu tema de dissertação.
03/04/2008 12:54:46
8 Kelly Sulâiny Alves Constante - Anápolis-Go
Sou mestranda em educação e minha dissertação será " A inclusão de alunos especiais no ensino superior". e gostaria que vcs me mandassem algum material sobre este tema ou indicações p/ o mesmo, é possível?
17/03/2008 13:46:15
9 Sônia Beatriz Paim Arnold - São Leopoldo
Em pleno século XXI é lastimável encontrar falas ultrapassadas e preconceituosas como esta que "a escola representa a sociedade. Não podemos criar mundos separados para aqueles que ouvem e aqueles que não", na minha opinião esta fala admite uma total falta de compreensão de quem é o sujeito surdo, a sua língua materna (LIBRAS)... Na verdade quando se defende a escola especial para surdos, não é para"criar mundos separados", mas é justamente para dar-lhes o direito de aprender sua LÍNGUA materna para que possa participar ativamente na sociedade. Deveria ser universal o conhecimento por parte das pessoas que falam e escrevem sobre a educação de surdos que não se aprende uma língua sem ter contato com ela O surdo passa pelas mesmas etapas que o ouvinte em seu desenvolvimento. A surdez por si só não provoca atraso nas aquisições. O que ocorre muitas vezes é que a não exposição do surdo a sua língua materna, a língua de sinais, dificulta a apropriação da linguagem, pois ele não tem acesso à língua oral em virtude da surdez. De acordo com Vygotsky (GOLDFELD, 1997) a linguagem não é só um instrumento de comunicação. Ela é a base do pensamento, essencial para o desenvolvimento cognitivo do indivíduo. A linguagem funciona como mediadora das funções mentais superiores: memória mediada, atenção voluntária, análise e síntese, abstração, dedução e outras.
Portanto, a criança, inserindo-se e interagindo em um grupo social, internaliza a língua deste grupo e a utiliza tanto para comunicar-se como para alcançar um determinado desenvolvimento cognitivo. Esta língua não pode ser "ensinada" sistemática e formalmente por alguém. A criança naturalmente a adquire num contexto dialógico e espontâneo.
A maioria das crianças surdas, devido a sua limitação auditiva, não tem possibilidade de adquirir naturalmente e espontaneamente uma língua, pois convivem com comunidades que fazem uso de línguas de modalidade oral-auditiva, praticamente inacessíveis ao surdo. Exceção a isto são os surdos filhos de pais surdos, que adquirem espontaneamente a língua de sinais utilizada em seu ambiente.
Assim, podemos concluir que as dificuldades da criança surda vão além da simples comunicação, atingindo todas as áreas do desenvolvimento, pois a cultura, a linguagem e o diálogo são imprescindíveis para o desenvolvimento infantil. Sabe-se atualmente que as línguas espaço-visuais, ou línguas de sinais, são as únicas que garantem ao surdo um ambiente lingüístico e cultural adequado para que ele consiga conceber uma teoria de mundo e forme a sua identidade. E muito mais poderia escrever e esclarecer a vocês sobre a educação de surdos, por isso faço um convite a todos os educadores de surdos e comunidade surda: escrevam, manifestem sua experiência com relação a importância da scola especial para surdos. Abraço a todos.
Professora Sônia B. P. Arnold
11/03/08
11/03/2008 00:02:07
10 Vinicius Gontijo de Melo - Santo Antônio do Monte
Este Projeto do Mec que visa acabar com as Escolas Especiais, já passou pelo legislativo,executivo ? Está sendo debatido no Congresso? O que parece é que a coisa está acontecendo de forma velada sem contudo existir uma discusão com a sociedade ( comunidade de pais). Os próprios funcionários das Escolas Especiais não estão sabendo de nada concreto. O que há de consistente neste projeto? A onde posso encontrar o texto do Projeto?
É de autoria de quem? É um projeto que visa incluir o deficiente na escola regular ou acabar com a APAES que são estadualizadas? (Afinal acabar com as APAES, o Mec não vai, pois enquanto existir pais e amigos de deficientes e auto defensores ela vai continuar) O problema é a despesa para o estado em manter uma APAE com Técnicos pagos pelo estado?
Gostaria de uma orientação a estes questionamentos e se possivel um retorno.
29/01/2008 11:24:23
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