Planeta Educação

Aprender com as Diferenças

Elisete Oliveira Santos Baruel Diretora de Educação da Vitae Futurekids; Pedagoga; Especialização e Extensão na Área da Aprendizagem e Fracasso Escolar pela USP; Especialização em Gestão em Educação e Novas Modalidades de Ensino – Educartis Corporation pela FECAP – Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado; Estágio Supervisionado no Projeto Educativo “Fazer a Ponte” – Ministério da Educação de Portugal e Study Group Reggio Emilia – Itália – Preschools and Infant-Toddler Centers – Istituzione of the Municipality of Reggio Emilia – Friends of Reggio Children International Association. E-mail: elisete.baruel@fk1.com.br

A inclusão de crianças surdas ao sistema educacional
Por Mário Osava

Rio de Janeiro, 11 março (IPS) - Eduardo Monte, 51 anos, é um engenheiro brasileiro surdo. Consultor para várias empresas pequenas, ele também atua na área de projetos sociais no Rio de Janeiro.


Aos seis anos começou a sofrer de problemas de audição, tornando-se mais surdo com o passar de cada ano, e mesmo assim, conseguiu estudar em escolas normais. Para ele foi uma experiência muito positiva embora tenha enfrentado a eventual discriminação de professores que não souberam lidar com alunos portadores de necessidades especiais.


A experiência de Eduardo é uma rara exceção no Brasil. Um estudo sobre a educação dos surdos, realizado no ano 2003 pelo IBGE, identificou apenas 344 alunos surdos matriculados nas universidades brasileiras.


O Ministério de Educação (MEC) estima que 80% das crianças e adolescentes surdos não freqüentam a escola. Segundo o censo oficial de 2000, o Brasil tem uma população de 182 milhões, dos quais 5,75 milhões são surdos, equivalente à população inteira da Dinamarca. Deste total, 796.344 tinham menos de 24 anos. Já no censo de 2003, foi constatado que 56.024 surdos estavam matriculados nas escolas primárias e secundárias do pais, com 2.041 formando-se do ensino médio nesse ano.


Para Marlene Oliveira Gotti, assessora técnica da Secretaria de Educação Especial do Ministério de Educação, muitos pais de família nem sabem que os seus filhos surdos possuem o direito de estudar. "Das poucas crianças que vão à escola", diz ela, "muitas acabam desistindo porque não conseguem acompanhar instrução em português falado, já que o método mais utilizado é fundamentado no oralismo".


A intenção da Política de Inclusão Educacional do governo tem como objetivo reverter esta situação e assumiu o desafio de proporcionar "educação para todos" através da inclusão de 30% de crianças surdas à rede de ensino dentro dos próximos três anos. O projeto visa instruir a Língua Brasileira de Sinais, ou LIBRAS, para 27 mil professores e intérpretes em centros de treinamento estabelecidos nos 27 capitais estaduais brasileiros. Ainda, cursos de pós-graduação em LIBRAS, reconhecida legalmente em 2002 como a língua oficial da comunidade surda no Brasil, serão estabelecidos.


O projeto prioriza a inclusão de crianças com deficiência auditiva dentro de salas de aulas normais com já foi realizado com portadores de outras deficiências. Atualmente, a maioria de alunos deficientes recebem instrução em salas ou instituições especiais.


Segundo Gotti, a imensidão do Brasil impossibilita o acesso de alunos surdos às escolas especiais do pais, o quinto maior em território do mundo. Muitos teriam que mudar longe de casa para poder assistir a uma escola especial para surdos.


Ainda mais, o objetivo é tanto a educação quanto a inclusão social. "A escola representa a sociedade. Não podemos criar mundos separados para aqueles que ouvem e aqueles que não" diz Gotti. Para ela "a compreensão profunda do potencial do deficiente auditivo pode acabar com o preconceito e a discriminação, e esta compreensão é produto da convivência e do conhecimento pessoal."


Segunda a Lei, nenhuma escola pode rejeitar uma criança com necessidades especiais, e todas as instituições educativas devem adaptar para atender estas necessidades, diz Gotti.


A Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos, FENEIS, tem questionado a eficácia desta política, e apóia a criação de escolas bilíngües (português e língua de sinais) para atender às necessidades desde a pré-primária.
Segundo Tanya Felipe, pesquisadora em lingüística e assessora da FENEIS, a incorporação de crianças surdas não proporciona inclusão verdadeira. Ela cita a qualidade precária das escolas e o fato que "nem os professores nem as redes municipais e estaduais, responsáveis pela educação primária e secundária, querem estas crianças" diz ela para a Inter Press Service (IPS).


O deficiente auditivo é visto como uma carga. Senta-se silenciosamente no fundo da sala, sem contribuir nem aprender nada. "Uma professora admitiu que nem percebeu que tinha um aluno surdo na sala até o final do ano", citou.


"O projeto do governo inclui a criação de salas de apoio para os deficientes auditivos, já reconhecendo que as salas normais não conseguem dar conta do recado", diz a lingüista Tanya. "Ao invés de dar `apoio` devem ensinar em ambos idiomas, português e LIBRAS," frisou. "Os surdos são diferentes de outros portadores de deficiências pois possuem uma língua própria, visual, sinalizada, com uma gramática única e logo uma ‘cultura’ diferente", anotou.


A maioria de crianças com deficiências auditivas vem de pais ouvintes que não sabem a Língua de Sinais, portanto, as crianças chegam à escola sem linguagem nenhuma. Já que a criança chega à escola sem saber nem a língua portuguesa nem a Língua de Sinais "não podemos ter a alfabetização como meta - ela tem apenas um ano de idade em termos lingüísticos e não seis ou sete" diz a especialista.

A doutora Tanya acredita que a criança precisa ter contato com a "comunidade dos surdos" para adquirir a linguagem através de interação social verdadeira, acrescentou. Mesmo assim, reconheceu que o projeto do MEC representa um "passo para frente", levando a educação para crianças surdas até o interior do país, e obrigando as escolas que anteriormente se esqueceram dos surdos a aceitá-los. "Agora", segundo ela, "a dificuldade é criar as condições em que o aluno surdo pode aprender."


A iniciativa do governo conta com o reconhecimento de instituições federais como o INES (Instituto Nacional de Educação de Surdos), depósito de décadas de experiência. O INES, com 600 alunos surdos, terá o primeiro departamento universitário Português - LIBRAS, anunciou o diretor Marcelo Cavalcanti.


O departamento começará a funcionar no final deste ano. O Instituto já ministra cursos de LIBRAS para professores de estados fora do Rio de Janeiro, na forma de seminários promovidos pelos governos locais, "mas a resistência inicial à política de inclusão continua sendo uma barreira formidável", diz Cavalcanti.


Para Eduardo Monte, o engenheiro surdo, a melhor forma de ensino para um estudante surdo, seja numa escola normal ou especial "depende da habilidade de cada um a se comunicar. Alguns conhecem mais a Língua de Sinais enquanto outros são oralizados (falam e lêem lábios), e outros são bilíngües (falam Português e LIBRAS)"
No caso do Eduardo, a comunicação oral predomina, devido, tal vez, ao fato de poder falar português antes de perder a audição.

Fonte Editora ARARA AZUL
Este texto pode ser reproduzido, livremente com fins educacionais, desde que a fonte seja citada:
Home Page www.editora-arara-azul.com.br

Notas:
1) O presente artigo de autoria de MÁRIO OSAVA, traduzido e divulgado por AARON RUDNER através de brasils@yahoogrupos.com.br no dia 25 de março de 2005, publicado com texto original em inglês, no Jornal USA Today, encontra-se disponível para leitura em E-BOOKS da Editora ARARA AZUL (www.editora-arara-azul.com.br) a partir de abril de 2005. Segue a este, mensagem de divulgação do mesmo.
2) O Sr. MARCELO CAVALCANTI é vice-diretor do INES.

Mensagem de AARON RUDNER em http://br.groups.yahoo.com/group/brasils/ em 25/03/05

“Uma amiga surda em Chicago encaminhou este artigo para mim. Foi divulgado pela IPS, Inter Press Service, uma agência que fornece notícias a jornais no mundo todo. O artigo original era em inglês e eu o traduzi pois acho importante que todos tenhamos conhecimento que os acontecimentos que vivemos aqui estão sendo observados pelo mundo.
Aliás, que um "país em desenvolvimento" tome atitudes como adotar a Lei de Libras e implementar uma política de inclusão de tamanha escala representa um marco na história dos surdos. Por tanto, é tão importante que nós, surdos e ouvintes envolvidos na comunidade de surdos, ajamos para que o Brasil implemente uma política verdadeiramente inclusiva e não apenas abandonar alunos surdos em escolas de ouvintes como está sendo feito.
Assim como o Brasil olha para fora, outros países também olham para cá.
Os nossos passos afetarão não apenas a vida dos surdos aqui, mas no resto do mundo também. A minha amiga recebeu o artigo através de um grupo servidor de notícias do mundo surdo.
Assinar é grátis e o endereço, caso queira assinar, é:
USA-L_News@yahoogroups.com
Por favor, peço que divulguem esta notícia.

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