Você está sempre adiando suas tarefas? Ou não consegue se concentrar direito no que precisa fazer, deixando sua mente andar por ai? A jornalista e autora Caroline Williams tem os mesmos problemas. Ela resolveu visitar um laboratório dedicado a estudar e "curar" esse problema. Abaixo, ela dá o seu relato da experiência:
"Estou no Boston Attention and Learning Lab - um laboratório americano que tenta treinar e educar o cérebro a se concentrar melhor.
As técnicas desenvolvidas aqui ajudam pessoas com sofrimento muito maior do que o meu. Algumas não conseguem se concentrar por terem danos cerebrais, doenças ligadas a traumas (transtorno de estresse pós-traumático, ou TEPT) ou deficit de atenção (Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade, ou TDAH).
Eu queria saber se uma pessoa como eu, sem essas condições extremas, também pode se beneficiar de novas técnicas.
O neurocirurgião Joe DeGutis, que trabalha no laboratório, se mostrou cético com a proposta.
"É difícil melhorar o funcionamento já normal para algo acima da média ou de nível superior, apesar de algumas empresas de treinamento de cérebros tentarem vender isso."
Mas depois de alguns testes online de concentração, consegui convencê-lo de que sou péssima em focar minha atenção. Na minha família, sou até famosa pela falta de concentração. Sempre que surge alguma tarefa que foi abandonada na metade, sem conclusão, meus familiares dizem que ela parece uma "Tarefa Caroline". Meus amigos dizem que tenho um "cérebro borboleta", já que ele está sempre voando por aí.
Esperança
Mas existe esperança para pessoas que, como eu, costumam interromper o que estão fazendo para olhar seu Facebook, sonhar acordada ou ir tomar um cafezinho no meio do trabalho. Estudos nos Estados Unidos indicam que esse é o quadro de 80% dos estudantes e 25% dos adultos. Com o surgimento de novas distrações, como smartphones, o cenário só piora.
E com prejuízo à saúde mental - com mais doenças, estresse e conflitos em relações. Um estudo de 2010 dos psicólogos Matthew Killingsworth e Daniel Gilbert, de Harvard, mostrou que as pessoas que deixam seu cérebro "voar longe" são menos felizes do que as que se concentram em suas tarefas.
Para o psicólogo Tim Pychyl, procrastinação é um problema emocional. Diante do estresse, as pessoas resolvem se dar "um pequeno presente" instantâneo, mesmo que isso venha nos prejudicar no futuro.
Áreas do cérebro
A mudança está toda no cérebro. Os pesquisadores do Boston Attention and Learning Lab trabalham para melhorar as ligações entre duas regiões do cérebro: o córtex pré-frontal (acima dos olhos, que nos ajuda a tomar decisões) e o córtex parietal (atrás dos ouvidos, e que coordena nossas sensações).
Juntos, eles formam a rede de atenção dorsal, que é a parte do cérebro que trabalha quando estamos concentrados em uma tarefa. Para que ela opere bem, é preciso "desligar" outra parte do cérebro conhecida como "rede de modo default" - responsável pela criatividade, pelo ócio ou por "viajar" com a cabeça.
Testes mostram que as pessoas com problema de concentração estão usando a parte esquerda do cérebro - que é a menos eficiente para esse tipo de tarefa.
Os cientistas queriam descobrir quais das duas hipóteses explicavam minha falta de atenção: estou usando demais a parte errada do cérebro para me concentrar em uma tarefa? Ou não estou conseguindo desligar minha "rede de modo default"?
Foco, foco, foco
Sou submetida a testes de atenção contínua - para ver o quão "ligada" eu consigo ficar em meio a tarefas tediosas e repetitivas.
O primeiro teste se chama "Não Toque na Betty". A tarefa é aparentemente fácil. Por 12 minutos, vários rostos de homens surgem em uma tela. A cada face masculina, eu devo apertar um botão. Mas quando o único rosto feminino (o de Betty) surge, não posso apertar.
Apesar de parecer fácil, descubro que minha margem de erro é de 51% - muito pior do que a média de voluntários "saudáveis" (20%). O pior resultado que eles haviam registrado nesse teste era de 40%.
Os testes mostram que a tarefa dos cientistas será dura: melhorar minha concentração em apenas quatro dias - que foi o tempo livre que nós tivemos para nos dedicar a essa experiência.
A primeira experiência é usar um pulso magnético fraco para tentar "desacelerar" o meu "campo de olho frontal" - uma região na parte esquerda do cérebro. Com isso, a parte direita - responsável pela concentração - trabalharia mais.
A sensação não é das piores pelos primeiros cinco minutos. Mas depois, sinto como se alguma coisa estivesse estalando dentro do meu cérebro. Cinco minutos depois e a sensação é muito irritante.
Passado isso, eu repito testes semelhantes ao "Não Toque na Betty". Mas meus resultados pioram. No terceiro dia de testes, eu sigo sem apresentar nenhuma melhora - o que gera frustração em mim e nos cientistas.
Mas de repente, no final do terceiro dia, meu índice de acertos começa a saltar. No mesmo dia, eu passo de uma margem de 11 a 30% de acertos para algo como 50 a 70%.
Eu começo a perceber que estava errando vários resultados porque estava pensando em como escreveria este artigo, ou como estaria meu filho sem mim, já que estou viajando. Ou se eu deveria tomar cerveja ou vinho no fim do dia.
Controlando as viagens da mente
Para o neurocirurgião DeGutis, isso é um grande avanço. Estar ciente do que você está pensando é conhecido na psicologia como "metaconsciência" - e é uma ferramenta útil para quem está tentando controlar uma cabeça que "viaja longe".
"Todos que passam pelo treinamento descobrem que estão em um estágio em que ficam um pouco mais metaconscientes. Eles estão cumprindo suas tarefas e conseguem perceber que estão pensando em outras coisas", diz o neurocirurgião.
Sara Lazar, neurocientista em Harvard, descobriu algo semelhante em seus estudos. Ela identificou outra parte do córtex que facilita que a mente "viaje". É o córtex cingulado posterior. Quanto maior o controle que exercemos sobre essa parte do cérebro, mais nós nos concentramos.
Eu certamente senti algo assim em meu cérebro quando trabalhava na concentração.
No último dia, eu fiquei ansiosa para saber os resultados dos meus últimos testes. Os cientistas fizeram questão de dizer que os resultados não eram totalmente científicos, e que eles não me incluiriam em seus estudos e artigos.
Mesmo assim, eles dizem que o "treinamento" para melhorar minha concentração funcionou em alguma medida. Meu índice de erro no teste "Não Toque na Betty" baixou de 51% (a pior nota entre todos os "saudáveis") para 9,6% - um índice considerado entre os melhores. DeGutis diz que a melhora é real - e não apenas dada à minha familiaridade maior com o jogo.
Outro teste que revela quanto tempo demora para meu cérebro voltar a focar em uma tarefa depois de ser distraído com outra coisa também teve resultado positivo: um escore de 46% subiu para 87% (em uma escala onde 0 é a pior taxa de concentração e 100% a melhor).
De fato, depois dos quatro dias no laboratório, eu me sentia mais calma e focada. Será que realmente consegui mudar meu cérebro em apenas quatro dias?
"Não estruturalmente, mas sim funcionalmente - na forma como você se engaja com seu cérebro. Alguma coisa mudou", diz o cientista."
Versão original desta reportagem: BBC Notícias
Fonte: BBC Brasil
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