No quadro-negro da sala de aula da professora Elieth Portilho estão fotos de pássaros e frutas do Cerrado. As cartilhas falam de temas rurais e práticas do campo e foram elaboradas pela professora e os alunos. É com esse material que ela alfabetiza as crianças no Centro de Ensino Fundamental Pipiripau 2, localizada em um núcleo rural em Brasília.
Neta e filha de professoras de educação no campo, Elieth Portilho não teve dúvidas em seguir a mesma profissão. Apesar da certeza, ao longo da carreira foi questionada sobre a opção. Fazer um mestrado e estudar tanto para dar aula no campo?, foi a pergunta que ela ouviu algumas vezes. Mesmo com as indagações, o ânimo da professora só aumentou.
“São problemas diferenciados dos da zona urbana. Aqui há questões culturais, sociais, ambientais diferentes. Então, é preciso um estudo muito grande e comecei mergulhar e a buscar por que essa inquietação não tem fim. Comecei a estudar o material, a pesquisar, buscar pessoas que escrevem sobre o Cerrado, fui aos assentamentos visitar as famílias e conhecer a realidade deles”, contou.
Essa “inquietação” por falar a mesma língua dos alunos e conquistar o interesse deles para o estudo fez a professora desenvolver o material didático adaptado. “Como trabalhar tão apegada ao livro didático com uma realidade tão complexa?”, perguntava. Parte dos 15 alunos da professora Eliete mora em assentamentos e as famílias vivem da agricultura. Entraram em cena, então, visitas de campo com os alunos para conhecer de perto aquilo que se estuda em sala de aula. Para a leitura, poesias com nomes de pássaros e plantas do Cerrado e receitas com frutas que nascem no quintal de casa.
“O que sinto é que meus alunos conseguiram compreender muito mais quando larguei um pouco o livro didático e passei a ir para o campo. Eles têm mais entusiasmo, mais alegria”, conta.
Além das indagações sobre a escolha de ensinar no meio rural, a professora Elieth também enfrentou críticas ao método de ensino que adota. Há quem considere que ela está preparando os alunos para continuar no campo quando deveria formá-los para viver na cidade. “Alguns dizem que é uma perpetuação da pobreza, que a pessoa tem que ir para a cidade. Mas e se ela quiser continuar no campo? Se meu aluno aprender a ler e interpretar dentro desse contexto, em qualquer lugar ele vai ter sucesso”, conclui.
Ela lembra que está previsto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação a possibilidade de fazer ajustes ao material de ensino para atender à realidade social e cultural do meio onde o professor atua.
Além dos desafios de didática, a professora conta que a educação no meio rural enfrenta outras dificuldades e uma delas é o deslocamento. Durante um tempo, os estudantes iam para a aula de carroça e a pé, enfrentando chuva e sol, e já chegavam à escola cansados e suados, o que dificultava o aprendizado. Após um período de reivindicações, eles passaram a ter ônibus escolar para o deslocamento, acrescenta Elieth.
Em mais de 20 anos de magistério, a professora chegou a atuar em escola da área urbana, mas percebeu que seu caminho estava mesmo no campo. “As pessoas têm um preconceito: você vai fazer mestrado para continuar em uma escolinha do campo?, perguntam Aí é que temos que estudar para recuperar essa perda histórica de exclusão da escola do campo, que sempre foi relegada”, defende.
Fonte: Agência Brasil
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