Seminário discute a relação da criança com a cidade e como transformar experiências urbanas em aprendizados
As crianças aprendem o tempo todo. Um simples trajeto até a escola pode estar recheado de experiências: a banca de jornal, o prédio da esquina, o movimento da rua e a convivência com pessoas. Tudo se transforma em oportunidades de aprendizagem. Nesta segunda-feira (26), em São Paulo, um seminário organizado pelo Laboratório de Educação, em parceria com a Escola do Parlamento da Câmara Municipal de São Paulo, levantou o debate sobre o papel da criança na cidade.
“A criança é uma cidadã desde que ela nasce. Ela não deve ser tratada como uma futura cidadã”, defende Beatriz Cardoso, diretora executiva do Laboratório de Educação. De acordo com ela, as experiências no espaço urbano são importantes para a sua formação. “É vivendo a cidade que as crianças poderão ampliar seu cotidiano, que em geral tende a ser muito controlado. As referências delas serão ampliadas em função do que podem experimentar”, relaciona.
As formas de compreender a cidade na infância variam conforme as experiências de cada criança. Para exemplificar isso, a educadora Cristina Pereira apresentou alguns perfis fictícios, como a criança que mora no centro e faz todos os seus trajetos andando, a que se locomove sozinha pelo transporte público e a que só conhece a cidade que é mostrada pela sua família. Todas aprendem coisas diferente com noções de cidade diferentes, que podem ser mais ou menos limitadas.
Durante o seminário, foram apresentadas experiências práticas de como é possível aprender com as cidades. Na Dinamarca, as crianças experimentam o espaço público ao pendurarem a chaves de casa no pescoço e irem à escola acompanhadas de colegas da vizinhança. Enquanto isso, no Japão, o movimento Independent Kids (veja o vídeo abaixo) estimula que elas possam ir sozinhas, passando por trens ou ônibus sem a companhia de um adulto. Outro exemplo mencionado foi o projeto Little Free Library, iniciado nos Estados Unidos, que transforma pequenas caixas de correio em bibliotecas gratuitas espalhadas pelas ruas de cidades.
Para trazer um exemplo nacional, a socióloga e educadora Nayara Brettas apresentou o projeto “Criança Fala: Escuta Glicério”, que realiza a escuta de meninos e meninas que vivem em cortiços na região do Glicério, em São Paulo. “Precisamos sair da nossa paralisia e ver que tudo é possível”, defende, ao mencionar a inclusão das crianças no projeto e como elas ajudam na elaboração de políticas públicas. “Não é só o que a criança aprende com a cidade, mas o que aprendemos com ela”, diz.
Embora os casos sejam exemplos bem-sucedidos de interações com o espaço público, o arquiteto Luiz Eduardo Suarian Brettas, da empresa pública SP Urbanismo, diz que ainda temos muitos desafios para incluir uma criança mais autônoma na cidade.
Para o pediatra Daniel Becker, é necessário garantir itens como transporte público de qualidade, espaços abertos e saneamento básico. Segundo ele, a vida moderna traz para a criança características que, necessariamente, não são as melhores para o seu desenvolvimento. Além da desigualdade social, que piora a situação da infância nas cidades, o médico chama atenção para outros fatores como a redução do convívio com a família, a exposição ao mundo da publicidade e a falta de interação com o espaço público, que coloca a rua como um local de perigo.
José Armênio de Brito Cruz, do Instituto Arquitetos do Brasil, reforça a ideia de que a rua ainda gera insegurança em muitos cidadãos. De acordo com ele, a cidade privatizada e o desconhecimento geram medo. Para ele, além de incentivar a apropriação do espaço, é preciso investir em qualidade de infraestrutura. “A cidade é uma obra coletiva em formação”, diz.
Assista ao vídeo Independent Kids (legendas em inglês)
Fonte: EBC
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