Pearson desenvolve ferramenta que leva em consideração as notas e tudo o que cerca o aprendizado, como comportamento, sociabilidade, ambiente escolar e familiar
Com a entrada da tecnologia em sala de aula, fica cada vez mais anacrônico avaliar o aluno somente por meio de provas bimestrais. Algumas escolas até tentam ampliar o número de provas, apertando o calendário e aplicando testes semanais, mas o fato é que apostar tudo no conteúdo para estabelecer um parâmetro de aprendizado significa fechar os olhos para outras características importantes para o século 21 que hoje podem ser aferidas com a ajuda da tecnologia.
Assim como acontece no aplicativo que sugere músicas de acordo com o gosto do usuário à medida em que ele passa mais tempo conectado, o ambiente escolar também pode se apoiar em dados para avaliar alunos e permitir uma visão completa sobre o seu desempenho, assim como atuar mais assertivamente para corrigir eventuais deficiências ou motivá-lo para que continue seguindo um caminho de sucesso.
Nos Estados Unidos, o grupo educacional Pearson criou um índice que ajuda a prever a aptidão de um estudante para a universidade três anos antes dos testes SAT (Scholastic Aptitude Test ou Scholastic Assessment Test) e ACT (American College Testing), equivalentes às provas de vestibular e ao Enem no Brasil. Chamado de Middle School College Readiness Index (Índice de Aptidão Universitária para Ensino Fundamental 2, em tradução livre), ele usa como alicerce dados de 11.000 alunos, provenientes de exames nacionais, combinados com fatores como conquistas acadêmicas, comportamento, motivação, engajamento social, circunstâncias familiares e características da escola. Ainda em fase de pesquisa, o algoritmo deve ser incluído na ferramenta SchoolNet e servirá como como medidor de progresso e alerta de intervenção para o próprio aluno e também para pais, professores e diretores.
Para se adaptar ao índice, as escolas não precisam coletar novos dados em pesquisas ou submeter os alunos a mais provas com questões específicas sobre um determinado fator. As avaliações de traços não-cognitivos, como o comportamento, levam em conta anotações diárias do professor a respeito da entrega de lição de casa, pontualidade e questões disciplinares.
Na categoria motivação, são analisadas variáveis ligadas à capacidade do estudante persistir na busca por seus objetivos. O engajamento social avalia sua participação em atividades extracurriculares e a relação com professores e colegas. Por sua vez, o critério familiar leva em conta a história dos pais e a estrutura socioeconômica do lar do aluno. Características da escola, como formação dos professores, ocorrências casos de violência, consumo de drogas ou álcool também são observadas nos resultados.
Uma vez coletados os dados, o sistema mostra a evolução em relação aos 12 meses anteriores e sugere para qual fator o professor ou a escola deve dar mais atenção. “O que descobrimos é que, na 8ª série, a variável de conquistas acadêmicas respondia por 25% do cálculo para aptidão para universidade. Entretanto, comportamento e motivação responderam respectivamente por 22% e 20%, o que de maneira conjunta os torna mais importantes”, diz ao Porvir Kimberly O’Malley, vice-presidente da área de Educação da Pearson.
Segundo Kimberly, essa nova maneira de avaliar o aluno, mais holística, fomenta o “renascimento das avaliações”, termo que também batiza um estudo dos pesquisadores britânicos Michael Barber e Peter Hill. Com a ajuda dos algoritmos, diz a executiva, “você deixa de julgar o aluno pelo desempenho em um único dia. Isso fazia sentido para um mundo de papel onde a circulação dos dados era difícil. Hoje é muito diferente por causa da tecnologia”, afirma.
Cada nível de usuário da ferramenta de avaliação organiza os dados de uma maneira diferente. Alunos podem ter uma visão global de seu desempenho, enquanto professores podem selecionar caso a caso ou simplesmente agrupar resultados para ajudar os que estão ficando para trás e tomar decisões o mais rápido possível.
"Você deixa de julgar o aluno pelo desempenho em um único dia. Isso fazia sentido para um mundo de papel onde a circulação dos dados era difícil. Hoje é muito diferente por causa da tecnologia"
Além facilitar o diagnóstico com vistas ao sucesso universitário, a tecnologia também tem o poder de poupar o tempo do professor em atividades repetitivas dentro da sala de aula, como acontece com exames orais. Nos Estados Unidos, a lei determina que compreensão e expressão oral, escrita e interpretação de texto dos estudantes que não têm o inglês como primeira língua sejam avaliados anualmente, mas isso demanda um tempo considerável pelos métodos tradicionais. Um professor é destacado para avaliar um a um. No estado do Arizona, no sudoeste do país, 100 mil estudantes (a maioria de famílias em que o espanhol é a língua materna) de 2 mil escolas só precisam telefonar para um número específico fornecido pela escola e responder a perguntas que vão desde a descrição de uma imagem a situações de seu cotidiano.
“A maior parte dos testes feitos em outros estados permite a quem aplica avaliar o estudante enquanto ele responde às perguntas. Nós fazíamos isso. Mas estávamos preocupados com a precisão da nota e com a impossibilidade de revisão, uma vez que as respostas não eram gravadas”, explica Irene Hunting, vice-superintendente do departamento de avaliação do Arizona, que oferece curso especial de inglês desde o jardim da infância.
No caso do Arizona, a mudança para a avaliação com a ajuda no computador não reduziu custos, uma vez que o programa usado para avaliar as gravações é pago. Mas trouxe maior flexibilidade e confiabilidade a todo o processo. Com dois ou três professores diferentes responsáveis pela aplicação em cada escola, o estado não tinha meios para comprovar a habilidade desses profissionais para avaliar e saber, por exemplo, se todos os alunos tinham o mesmo tempo para responder às perguntas. “Nós mudamos a prova oral para que ela fosse administrada por telefone, as respostas passaram a ser gravadas e avaliadas por um computador, com o resultado sendo entregue no mesmo dia”, diz Irene.
A executiva da Pearson vê vantagens que vão além dos processos escolares, e podem ser sentidas pelos próprios alunos. “Quando um aluno faz teste oral diante de um adulto nunca viu na vida, provavelmente não terá seu melhor desempenho porque fica nervoso”, diz Kimberly. Segundo ela, com a tecnologia simples, o resultado possui uma precisão maior e chega em menos tempo, tornando-se mais útil para orientar o aluno.
A correção de redações, outro processo bastante lento, também pode ser feito de maneira automatizada com o programa WriteToLearn (Escreva para Aprender), que conta com um algoritmo abastecido por 20 milhões de palavras e expressões registradas em livros e enciclopédias. O sistema consegue detectar erros de ortografia, gramática e passa um pente fino em outros fatores como organização e argumentação, apontando potenciais problemas.
No ano letivo 2015-2016, o programa será usado por 53 mil estudantes de escolas públicas do condado de Gwinnett, na Georgia, estado que fica no sudeste dos EUA. No dia a dia, o WriteToLearn permite com que a prática de escrita seja mais constante por tirar dos ombros de professores a carga de correção. A partir do momento em que envia seu texto, o estudante recebe explicações personalizadas, dicas e notificações que o estimulam a progredir.
Mas como isso se traduz em melhor desempenho? Segundo Kimberly O’Malley, da Pearson, neste caso a prática pode levar à perfeição. “Resultados preliminares indicam grande relação entre o uso da plataforma e o desempenho dos alunos em provas de redação do estado. Estudantes que enviaram três ou mais textos tinham uma probabilidade maior de aprovação no exame de redação da 5ª série”.
Fonte: Porvir
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