Desde muito cedo, Humaira Bachal entendeu a falta que a educação faz para o desenvolvimento das pessoas. Na comunidade de Muwach Goth, situada na periferia de Karachi, cidade portuária do Paquistão, a garota ouviu várias histórias que ilustravam essa deficiência, como a de mulheres que morriam ao tentar dar a luz em casa porque suas famílias não sabiam como encaminhá-las ao hospital. Uma delas, inclusive, aconteceu em sua própria casa: um primo faleceu porque a mãe não soube ler a data de validade de um medicamento.
Mudar essa questão era uma ideia latente para Humaira, até porque era grande o número de meninas e meninos que não frequentavam a escola, muitas vezes, por escolha da família, condição que só perpetuaria as dificuldades na sua comunidade. E foi aos 13 anos que ela teve a ideia de compartilhar com suas amigas os aprendizados que adquiria na escola, vivência possível pelo apoio da mãe, que escondia os estudos da garota de seu pai, que acreditava que a menina tinha mais era que casar.
Humaira começou dando aulas improvisadas em sua casa, com apoio de sua irmã mais nova Tahira, para dez amigas. Ela também tornou-se uma porta voz da educação na sua comunidade, falando às famílias da importância das crianças frequentarem a escola, discurso nem sempre acolhido pelos moradores.
Mas ela persistiu e, em dois anos, o grupo inicial somou 150 alunos. Hoje, ela dirige a Fundação Dream que ensina cerca de 1200 meninos e meninas da comunidade e é símbolo da luta por um aprendizado decente.
Com apoio de doações nacionais e internacionais – a cantora Madonna é uma das que já reverteu verba para a manutenção da instituição -, Humaira finaliza a construção de uma nova casa para abrigar a escola, que já conta com uma equipe de 33 professores. Por lá, os alunos e profissionais têm acesso a programas de formação, de saúde e orientação, além do letramento, tão importante para solucionar questões básicas como as que viveu sua família.
Enquanto na sua unidade, os alunos têm acesso a uma gama diversificada de conhecimentos e a salas de aula equipadas com mobiliário adequado, as escolas públicas da região só reforçam a precariedade educacional do território: sem janelas, móveis ou portas.
E em vez da decoreba, tradicional na maioria das escolas paquistanesas e em muitas do globo, Humaira Bachal zela por um processo em que meninos e meninas interajam e desenvolvam competências e habilidades para uma vida plena de desenvolvimento. Resistências à parte, seu sonho é o de construir uma universidade.
Como a comunidade segue bastante conservadora e ainda é muito difícil para meninas e mulheres acessarem o direito à educação, a Fundação Dream também investe no modelo de sua origem – a proposta de educação domiciliar. Com foco em adolescentes e jovens mulheres, um grupo de professores se desloca a algumas casas da comunidade, apoiadas por líderes locais, que aprovam a agenda educacional às mulheres e, portanto, sustentam o sistema, evitando possíveis retaliações violentas.
O programa oferece aulas de conhecimentos básicos de letramento e numeramento, e ainda, para as meninas interessadas, um currículo de apoio ao ingresso escolar na educação básica (equivalente ao ensino fundamental II). Para apoiar meninas que deixaram os estudos, a organização faz visitas frequentes às famílias, esperando convencê-las da importância da educação e ajudando as jovens a permanecerem na escola em diálogo com os sistemas assistenciais da cidade.
Desde maio de 2014, um total de dez garotas já conseguiu passar nos exames de matrícula, e dessas, cinco continuaram seu processo formativo e atingiram o certificado equivalente ao Ensino Médio. Como, em média, no Paquistão cada mulher tem quatro filhos, a organização acredita ter impactado, ao menos 20 crianças, que futuramente terão garantido seu acesso à educação.
Fonte:
Porvir
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