Aprender com as Diferenças
O tempo de cada um em deficiência mental
Por Débora Didoné - Edição Especial da Revista NOVA ESCOLA - Outubro 2006
Ficamos felizes em ter recebido de uma amiga querida a revista acima porque ela é rica de depoimentos e de informações sobre pessoas com deficiências variadas, e o ingresso ainda que por pouco tempo no universo riquíssimo tanto dessas pessoas como daquelas que as orientam e com paciência e generosidade nos alimenta o espírito; sabemos bem que é a marca de muitos professores brasileiros, levar esses alunos a horizontes jamais sonhados de realização humana.
A História de Hoje
Aos 7 anos, este garoto atento ao exercício nem sequer pronunciava o próprio nome: Henrique. Sua família pouco sabia como ajudá-lo. Na escola, ela pode conhecer a si mesmo, o manejo das coisas, as outras crianças... Estudar foi a primeira porta aberta para o desenvolvimento, que ele encontrou num ensino que respeita O TEMPO DE CADA UM.
“Hoje a escola é sua casa” conta Regina Graner, professora da 4ª série da EMEF Professor Taufic Dumit, em Piracicaba, a 160 quilômetros de São Paulo. “Ele conversa, participa das aulas e troca idéias com os colegas.”
Para Henrique Michel da Silva, é uma grande conquista. Aos 10 anos, está aprendendo a comandar a própria vida, que antes era dominada pela deficiência mental. Alem de ter dificuldade para falar e se fazer entender, ele não conseguia comer nem se vestir sozinho. Sua mãe achava isso um impedimento insuperável. “Ele sempre foi mais lento para aprender as coisas” justificava a dona de casa Elizângela de Fátima Oliveira da Silva quando era indagada pela professora do filho.
Elizângela não imaginava do que Henrique seria capaz se fosse incentivado de maneira adequada. Foi com a ajuda da professora Marta Giuste da Silva, na 1ª série, que ele conseguiu dizer seu nome claramente pela primeira vez. “Comecei um trabalho com ele desde a pronúncia.”, diz a educadora. Daí em diante o processo deslanchou. O menino revelou-se um dedicado aprendiz na sala de aula, daqueles que não se calam cada vez que têm uma dúvida. Ao mesmo tempo, a professora conversou comigo com a mãe de Henrique e conscientizou-a de que a escola regular tinha a obrigação de receber seu filho.
Na sala de apoio, o garoto contou com uma professora para ajudá-lo a se desenvolver no que tinha mais dificuldade. Com o tempo passou a ler histórias por meio de imagens e a contá-las aos amigos. “Ele já monta pequenas frases, desenha e organiza livrinhos” diz a educadora especializada Maria Aparecida Valelongo Cunico.
Há pouco tempo, o destino provável de Henrique seria uma classe só com crianças com retardo mental. Hoje, seu direito de estudar na escola regular vem sendo respeitado, ainda que falte à maioria das pessoas entender o que é deficiência mental. “É um atraso na adaptação ao aprendizado, ao convívio social e às funções motoras” explica o psiquiatra José Belisário Cunha, da Associação Brasileira de Neurologia e Psiquiatria Infantil (ABENEPI) em Belo Horizonte.
Quem tem deficiência é capaz de muita coisa: ler, escrever, fazer contas, correr, brincar e até sempre independente. “A grande novidade é que, se a criança for estimulada a descobrir seu potencial, as dificuldades deixam de persistir em tudo o que ela faz”, afirma Belisário.
Ou seja, ela precisa de novos desafios para aprender a viver com mais autonomia. E não há lugar melhor do que a escola para isso. Qual o papel do professor nessa história?
Em primeiro lugar, bancar o desconfiado. O diagnóstico de deficiência mental não determina o potencial da criança.
“Pode ser que o aluno não apresente na escola os problemas que tem em casa. Isso resulta, muitas vezes, da falta de acompanhamento da própria família” diz Belisário. Por exemplo, como uma criança consegue desenvolver a fala se a família não conversa com ela?
Nas aulas de leitura, a professora aproveitava a empolgação de Henrique para ajudá-lo a se desinibir na frente dos amigos. “Ele foi se soltando até conseguir divertir a turma toda com uma história”, diz ela. O garoto dava um toque de emoção às tramas, como quando encenava o sopro do lobo na casa dos três porquinhos. “A classe toda aplaudia”, lembra Marta. Henrique numa faltou a uma só aula.
Claro que a Educação Inclusiva tem algumas dificuldades operacionais importantes, que não podem ser ignoradas. Para que dê certo é preciso que haja empatia, vontade de superar barreiras tanto da parte da professora como do aluno, é preciso estimular o entusiasmo do aluno, fazer com que suas reações, sua afetividade, sejam respeitadas. Aí e somente aí os problemas começam a perder a gravidade e a se tornarem banais diante da riqueza da educação ampliada e sólida que o aluno passa a receber.