Planeta Educação

A Semana - Opiniões

João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

Pense globalmente, viva localmente
Editorial

Desenho de um engarrafamento de veículos com um carro sobre o outro
Gastamos mais tempo no volante de nossos carros do que com a família!

Todas as semanas tenho uma rotina de viagens pelas estradas da região onde moro que me levam aos locais onde trabalho ou estudo. Será que tudo isso é realmente necessário? Fico me perguntando o quanto falta de lógica na determinação dos caminhos trilhados ao longo de nossas vidas já que, invariavelmente, como eu, há muitas e muitas pessoas que viajam de lá para cá, de cá para lá, gastando somas consideráveis com transporte (além de outros custos) e, mais importante ainda, contribuindo para que o efeito estufa e o aquecimento global ameacem ainda mais nossas existências...

Vou dar uma amostragem dessa falta de bom senso utilizando o meu próprio exemplo para que possamos ter uma idéia mais clara sobre o tema. Acompanhe a seguir o meu raciocínio...

As segundas e quintas-feiras subo a Serra da Mantiqueira, localizada no estado de São Paulo, rumo a estância climática de Campos do Jordão, onde sou professor e pesquisador de um Centro Universitário ali estabelecido. São 140 quilômetros que se acumulam em meu velocímetro entre a ida e a volta (estando no Campus evito sair para gastar menos combustível e, consequentemente, poluir um pouco menos o planeta). Como são dois dias por semana, podemos computar 280 quilômetros a mais para as minhas estatísticas.

Desenho mostrando a poluição de um escapamento cobrindo alguém.
O quanto de poluição produzimos ao andar excessivamente com nossos carros?

As quartas-feiras vou a São Paulo no período da manhã (agora com menor freqüência, já que estou em processo de elaboração do meu projeto) para as aulas e reuniões relativas ao meu doutorado na PUC-SP. Considerando-se apenas a distância, são mais 280 quilômetros rodados (entre a ida e a volta). Como o trânsito na capital paulista é dos mais complicados, o gasto com combustíveis e manutenção do carro é maior do que somente a distância é capaz de nos fazer pensar.

Ao ficar parado numa das marginais (Tietê ou Pinheiros) ou ainda numa das grandes avenidas e ruas de São Paulo dispendemos enormes quantidades de poluentes na atmosfera e transformamos a vida na metrópole num caos ainda maior do que se poderia esperar.

Além disso, vai-se o tempo de nossas vidas, muito mais caro a cada um do que na maioria das vezes pensamos. Já cheguei a ficar parado ou rodando em velocidade baixíssima na Marginal Tietê por períodos de tempo equivalentes a 4 e até 5 horas... Contabilizando-se todo o tempo perdido nas ruas de qualquer grande cidade, quantos dias, semanas e meses de nossas vidas perdemos por ali, dentro de um automóvel? O que poderíamos ter feito com esse tempo adicional?

Penso que poderia ter estado junto com os familiares e amigos, ou ainda, que daria para ter lido vários livros e assistido tantos filmes que ainda não consegui ver... Se todo aquele tempo me fosse devolvido acho que jamais o perderia novamente... Preferiria andar na chuva, jogar bola, bater papo com os colegas, escrever novos textos, dar outras aulas ou simplesmente passear com meus cães...

Desenho de uma pessoa mostrando os bolsos vazios
Além de destruir o meio-ambiente, gastamos demais com
os deslocamentos excessivos que fazemos...

As terças, quartas à tarde e sextas-feiras vou a São José dos Campos, onde trabalho no Planeta Educação, como editor e articulista. Como moro numa pequena cidade vizinha, chamada Caçapava (a capital alternativa do Vale do Paraíba, se me permitem uma brincadeirinha!), rodo mais 40 ou 45 quilômetros entre minha residência e o serviço (ida e volta). Como são três dias por semana, completo aproximadamente de 130 a 150 quilômetros nessa viagem.

Se aplicarmos uma projeção matemática sobre esses dados para 1/3 das pessoas que trabalham comigo apenas no Planeta Educação, ou seja, para umas dez pessoas aproximadamente, que proporção teremos?

Somente as minhas viagens a trabalho e estudos totalizaram 700 quilômetros semanais (isso sem levar em conta os deslocamentos que realizo por motivos pessoais, como idas ao supermercado, ao shopping, aos centros de lazer, a restaurantes,...). Multiplicando-se essa quantidade por 10 pessoas que trabalham comigo teríamos um montante de 7 mil quilômetros rodados por semana (apenas a título de obrigações profissionais, repito!). Num mês teríamos aproximadamente 30 mil quilômetros rodados apenas por essas 10 pessoas...

Se nossos veículos tivessem o mesmo rendimento médio, ou seja, se o consumo desses automóveis fosse de 15 quilômetros por litro, teríamos gasto apenas entre essas 10 pessoas o equivalente a 2 mil litros de combustíveis... Se em cada cidade do porte de São José dos Campos existirem 100 empresas com perfil assemelhado ao nosso, com os mesmos 10 funcionários que consomem 2 mil litros de combustíveis por mês, seriam então 200 mil litros de gasolina ou álcool mensalmente apenas para fins profissionais nessas empresas e especificamente na localidade mencionada...

Charge do George Bush dentro da água dizendo que o aquecimento global é só uma teoria
Enquanto continuarmos pensando que “O aquecimento global é só uma teoria”,
abreviamos o tempo de existência e sobrevivência de várias espécies, inclusive da própria humanidade...

O problema é que esses cálculos são apenas aproximações... Há pessoas que rodam muito mais do que eu diariamente... Assim como existem tantos outros que circulam menos... Diria, para efeitos de cálculo, que o meu caso seja uma média (para baixo) do quanto de combustível se consome diariamente em nosso país para fins profissionais... E isso nos interessa de que maneira? Pelo simples fato de que quanto mais gastarmos, mais poluímos e menos chances teremos de escapar dos efeitos nocivos do aquecimento global que estão a consumir o planeta e condenar a existência de qualquer forma de vida nesse mundo...

Li uma entrevista na revista Época dessa semana (nº 466, de 23 de Abril de 2007), com o escritor e ambientalista Bill McKibben, de 46 anos (pesquisador que foi um dos primeiros a escrever sobre o aquecimento global para o público leigo), em que o entrevistado propõe que “pensemos globalmente e compremos localmente”, numa indicação de caminhos interessantes para a humanidade reverter os perigos climáticos que atormentam a vida humana e a existência dos demais seres do planeta Terra.

Ao propor tal idéia, McKibben remonta a modelos que já adotamos e que fomos progressivamente abandonando em virtude das modernidades tecnológicas que encurtaram tanto a distância entre os países (como os automóveis, trens, aviões,...). Nesses sistemas o alimento e os produtos não viajavam milhares de quilômetros para chegar aos consumidores, o direcionamento era local ou regional.

Isso significaria dar um passo para trás na história da humanidade, abandonando todos os avanços conquistados até o presente momento? Não, na verdade representaria a utilização de forma mais racional dos recursos, que fosse menos nociva ao meio-ambiente e que permitisse uma diminuição sensível e acentuada dos níveis de emissão de poluentes no ar de toda a Terra.

Ao pensar na proposição de McKibben relativamente ao consumo, procurei ir um pouco além no conceito e refleti sobre a necessidade de não apenas os produtos circularem menos, mas também as pessoas... Se nosso trabalho fosse mais localizado e regionalizado, destruiríamos menos o meio-ambiente, diminuiríamos os nossos custos, economizaríamos recursos naturais e também dinheiro... Além do mais, o dispêndio com saúde também seria reduzido já que estaríamos menos propensos as doenças da contemporaneidade como o stress e os problemas cardíacos...

Para completar, teríamos mais tempo para realizar nossas funções, projetos e trabalhos com mais competência, poderíamos ficar por mais horas com nossas famílias e amigos, teríamos condições até de praticar esportes, curtir nossos maiores hobbies ou de, simplesmente, para a alegria de muitos, dormir até um pouco mais tarde...

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