Limitações e Independência
Marcela Cálamo Vaz Silva
Todo
mundo possui limitações, afinal, somos humanos e,
mesmo aqueles que pensam que podem tudo, acabam esbarrando em alguma
limitação.
Eu tenho várias que crescem à medida que a idade
vai aumentando. Há algum tempo, por exemplo, comecei a ter
dificuldade de ler letras miúdas.
Ia afastando o papel dos olhos até que pudesse ler algo.
Às vezes, nem afastar resolvia e eu ficava com raiva de
não conseguir ler o que queria. Resolvi meu problema com um
par de óculos.
Benditos óculos! Hoje leio qualquer letrinha com eles. Minha
visão espacial é outra
limitação que tenho. Não há
como eu imaginar algo em determinado lugar sem que este seja colocado
lá.
Cada vez que invento de mudar os móveis de lugar aqui em
casa, Benê sabe que terá muito trabalho pela
frente, pois terá de arrastá-los muitas e muitas
vezes.
Também não posso ficar em pé, nem
mesmo com aquela cadeira de rodas stand up, pois arriscaria ter uma
fratura se forçasse meus joelhos.
Benê procura deixar tudo que preciso no dia a dia ao meu
alcance, mas, às vezes, ele esquece que não posso
levantar e deixa coisas essenciais lá no alto.
Se for algo que não quebra, uso uma vassoura, um rodo e puxo
caso contrário, fico com raiva, brigo com Benê
quando ele chega e ele, coitado, morre de remorso.
Não consigo levantar coisas com as duas mãos,
pois não tenho total equilíbrio em meu tronco.
Porém, sou bastante forte e, na maioria das vezes,
levanto o que preciso com uma das mãos, enquanto com a outra
me seguro na cadeira para não desequilibrar.
Ultimamente, vou descobrindo limitações em
relação a meu pequeno, Luís Felipe de
dois anos.
Não consigo pegá-lo "na marra" para coisa alguma,
já que não tenho como tirá-lo do
chão sem a ajuda dele. Se quero que vá para o
berço, ele também precisa querer e, assim, sobe
em meu colo e do colo eu o ponho no berço.
Acontece que, na maioria das vezes, ele não quer. Finca no
chão feito estaca e não há como
tirá-lo de lá.
Brigar, se estressar tentar usar a força não
adianta, já testei e foi só nervosismo
à toa.
Nessa hora, fiquei com raiva de não poder
pegá-lo, mas, em seguida, percebi que era somente mais um
teste para achar soluções às
adversidades de meu dia a dia.
Desde então, coloco em ação minha
capacidade de contornar limitações com
criatividade, achando formas, a cada dia, de tornar a ida ao
berço algo atrativo a ele. Funciona e é bem mais
tranqüilo.
Serão, esses, exemplos de superação?
Minhas limitações continuam existindo, eu
não as supero.
Porém, na medida em que se destacam, vou descobrindo formas
de contorná-las, para que interfiram o menos
possível em minha rotina, sobretudo quando estou sozinha com
meus filhotes.
Achar soluções para problemas diários,
sejam quais forem, é algo que se torna natural quando a
independência está nos guiando.
Não se trata de acordar e pensar “hoje vou superar
minhas limitações”!
“Hoje vou superar minhas deficiências!"
Mas, sim de pensar "Hoje vou cuidar da vida e ser o mais independente
que eu puder!".
Marcela Cálamo Vaz Silva
Paraplégica desde os seis anos, cadeirante, mãe
de dois meninos, escritora (ainda acho estranho me definir assim),
mantenho um Blog e sou co-autora do livro infantil “Rodas,
pra que te quero”, baseado em minha infância.
Belas palavras da Autora relatando sua alegria pelo convite para
participar da coluna “Aprender com as
Diferenças”,
no Portal Planeta Educação.
Marta puxa você sempre funcionando como o passarinho que
espalha a semente, né? Quando crescer quero ser igual a
você.
O que seriam de minhas palavras escritas se não tivesse a
Rede SACI em minha história?
Estar presente no Planeta Educação
será uma honra e uma grande alegria.
Não há nada que me deixe mais feliz que estar em
veículos cujos objetivos sejam a melhoria de ensino e a
inclusão da criança na sociedade a partir da
escola.
Obrigada, obrigada, obrigada.
Quero escrever um texto (está se desenrolando na
cabeça ainda) sobre o meu despertar para a luta pela
Educação Inclusiva.
Infelizmente, os adultos com deficiência, em sua maioria,
buscam melhorias naquilo que possam desfrutar.
Eu tenho visto pais de crianças com deficiência,
educadores etc. engajados na luta, porém, não sei
de nenhum adulto com deficiência preocupado com isso.
As preocupações giram em torno de locais
acessíveis, rampas, banheiros adaptados, emprego,
discriminação, preconceito, sexualidade, enfim,
assuntos importantíssimos, sem dúvida, mas que
nem precisariam ser discutidos se a inclusão
começasse na base.
Mas acho que essa falta de interesse é natural, a gente
só desperta mesmo para questões que
não nos afetam imediatamente quando algo nos chama a
atenção, ou quando alguém nos insere
num mundo que não conhecíamos, no meu caso,
você foi essa pessoa, quando me inseriu na lista de pessoas
que recebem os boletins enviados pelo Fábio Adiron.
Quando dei por mim, estava totalmente envolvida pela
inclusão das crianças, querendo, de alguma forma,
contribuir.
Meu livro acabou funcionando como ponto de partida, mas tenho tanto a
dizer ainda.
Ano passado dei minha primeira (e única ate agora) palestra
e o tema foi Educação Inclusiva.
Escrevi um texto imenso pra me guiar (qualquer hora te mando), estava
uma pilha, afinal, eram estudantes universitários (UMC) e
minha única experiência havia sido com
crianças no Colégio São Bento, poucos
meses antes. Acabou dando tudo certo e eu fiquei feliz demais.
Agora, voltando ao Planeta, o que posso escrever sobre mim?
Meu nome é Marcela Cálamo Vaz Silva,
Paraplégica desde os seis anos, cadeirante, mãe
de dois meninos, escritora (ainda acho estranho me definir assim),
mantenho um blog e sou co-autora do livro infantil Rodas, pra que te
quero, baseado em minha infância. Acho que isso é
o principal.
Mais uma vez, obrigada e, por favor, transmita meu agradecimento
à Elisete.
Grande beijo,
Tchela.