Planeta Educação

A Semana - Opiniões

João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

Por uma educação mais efetiva e interessante
O que pode melhorar o trabalho em sala de aula?

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Em recente entrevista ao jornal “O Globo”, do Rio de Janeiro, fui questionado quanto a vários aspectos relativos ao funcionamento, a estrutura, a metodologia e ao futuro das escolas e da educação no Brasil. 

A matéria fazia parte de uma pesquisa realizada pelo jornal juntamente a estudantes das redes de ensino daquele estado e tinha como objetivo verificar o que acontece nas escolas hoje - quanto a seu funcionamento, operacionalização, bases, recursos e projetos - e quais seriam, na opinião de quem está estudando, prováveis soluções para o marasmo e a mesmice que imperam na educação nacional. 

No Editorial dessa semana reproduzo os tópicos abordados na entrevista, conduzida pela jornalista Ediane Merola. Seguem abaixo as questões e as respostas completas dadas ao jornal “O Globo”.

1- O presidente da União dos Estudantes Secundaristas disse que a sala de aula não é atraente para o aluno. Você concorda com isso?

Concordo. Acho que a sala de aula é um espaço que realmente isolou-se do mundo e que, com isso, abafou qualquer possibilidade de arejamento das idéias entre os articuladores da ação na escola, tanto os gestores quanto os educadores. Tentamos nos dias de hoje reverter esse processo, mas as tentativas que impetramos carecem de maior profundidade, estudos e aperfeiçoamento. Queremos de forma muito imediata resolver as questões e, por conta disso, procuramos fórmulas mágicas que solucionem nossos problemas, entre os quais o principal é a sala de aula Monótona, cansativa, dissociada da realidade. É extremamente comum entre os professores a adoção de teorias e autores durante algum tempo como "gurus" de um novo procedimento acadêmico, renovador e arejado sem que, em muitos casos (na maioria), tenha-se feito um estudo qualificado desse autor, escola pedagógica, metodologia,... Veja Paulo Freire, por exemplo, um dos maiores educadores brasileiros, com contribuições fantásticas para a educação mundial e brasileira, é um desconhecido dos professores (não enquanto Nome, personalidade, realizador, mas no tocante a sua obra...).

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O tempo está passando... E a escola continua a mesma...
O que podemos fazer?

2- Por que muitos alunos ficam tão desestimulados em sala de aula?

Seus conhecimentos e sua relação com o mundo não são respeitados e, muito menos, aproveitados em sala de aula pelos professores. O conhecimento apresentado a eles não é contextualizado e significativo. A informação que recebem fora da escola, através da mídia, num ritmo acelerado, próprio da globalização, da Internet, da televisão ou dos satélites - é dissonante em relação ao aprendizado escolar. Além disso, a escola ainda é tradicionalista e segue numa linha de ensino através da qual a memorização de informações como fatos históricos, fórmulas matemáticas, regras gramaticais ou paisagens geográficas é mais importante do que a compreensão relativa à importância desses conhecimentos para a vida do estudante. O primeiro passo seria estimular os estudantes a aprender a pensar, a refletir - estimulando a leitura e o contato com os elementos da cultura, da arte, da filosofia,...

3- O que as escolas poderiam fazer para deixar a sala de aula mais interessante?

Há algumas medidas que considero indispensáveis para que a escola como um todo se torne mais interessante para os alunos e também para as pessoas que nela trabalham, entre elas destacaria:

a) Valorizar os estudantes, tornando-os membros ativos dentro da sala de aula a partir das orientações e projetos pensados coletivamente pelo corpo docente para todas as disciplinas escolares.

b) Estipular horas de reunião pedagógica em que os professores discutam alternativas de trabalho mais dinâmicas que envolvam os conteúdos das várias disciplinas e que tornem o diálogo interno entre as matérias moeda corrente, estimulando um trabalho interdisciplinar, sócio-construtivista e baseado em projetos.

c) Unir educação e cultura, num laço que seja indissolúvel e contínuo, através do qual o cinema, o teatro, a música, a literatura, as artes plásticas e qualquer outra forma de expressão de idéias concebida pelos homens seja tema de aulas, debates, projetos,...

d) Estimular pesquisas que não sejam apenas reproduções de livros ou de artigos da Internet, cultivando dessa forma o espírito científico.

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Reconhecer e identificar os estudantes e suas experiências de
vida como elementos importantes para o trabalho em sala de aula
é um passo decisivo para tornar as escolas mais interessantes e produtivas.

4- Falta criatividade por parte das escolas e dos professores?

Existem iniciativas individuais ou coletivas isoladas que merecem reconhecimento. Há professores que utilizam a literatura para projetos de ciências ou matemática, outros que trabalham com as novas tecnologias e realizam produções com seus alunos que se tornam referenciais para outros estudantes; projetos de leitura que reúnem membros da comunidade para contar histórias e ler livros para crianças também são parte da realidade de algumas escolas, assim como trabalhos escolares vinculados a filmes ou histórias em quadrinhos,... Mas são exceções. O mais corrente é a mesmice, a falta de criatividade, o estímulo zero para o aluno crescer e se empolgar com o conhecimento. E como comprovam pesquisas recentes, não é só a falta de mais recursos que ocasiona tudo isso, as escolas precisam mesmo de uma melhor gestão, de mais envolvimento dos professores e de participação dos pais, monitorando, acompanhando a escola e o desenvolvimento de seus filhos e também cobrando as autoridades, os gestores da escola e os professores.

5- Aulas mais práticas (em laboratórios) e fora da sala de aula (em museus, parques de diversão ou cinemas) tornariam o aprendizado mais interessante?

Visitas a exposições, museus, parques, mercados... São sempre interessantes e enriquecem o processo de ensino-aprendizagem, no entanto, devem estar previstas e vinculadas ao currículo e aos conteúdos trabalhados pelos professores, assim como, tem que estar sendo constantemente relacionadas a outras fontes ou referências, como os livros didáticos, jornais, revistas, artigos da Internet, filmes, músicas, literatura,... E em relação a toda e qualquer atividade devem ser organizadas atividades como exercícios, tarefas, avaliações, trabalhos e projetos.

6- Como os alunos também podem contribuir para essas mudanças?

Os alunos devem ser membros ativos do processo de ensino-aprendizagem e não meros receptadores de informações memorizadas e repetidas ano após ano pelos professores. Reconhecer e validar essa participação não é fácil e exige preparo prévio, com planos de aula bem formulados pelos educadores. Como disse anteriormente, há experiências de vida dos alunos que podem muito bem esclarecer e facilitar a compreensão de temas trabalhados em aula, por isso, as aulas devem sempre permitir e estimular apartes dos estudantes. Só para exemplificar, se você tem alunos que vivem as margens de um Rio, cujos pais são pescadores que por ali residem há muitos anos, e seu tema em sala de aula em geografia é a hidrografia, como desprezar as histórias que essa criança pode contar e que a ela foram passadas pelos pais sobre a pesca, a poluição das águas, empresas que estão destruindo as margens do Rio ao retirar areia do local, o desaparecimento da fauna ou da flora...

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A tecnologia integrada à educação exige o conhecimento de suas
possibilidades pelos educadores para que venha a ser plenamente
aproveitada no processo de ensino-aprendizagem.

7- O uso de recursos tecnológicos (lousa eletrônica, data-show) facilita o aprendizado? Ou, pelo menos, atrairiam a atenção do aluno para o conteúdo das matérias?

A inserção de tecnologias sempre é bem vista e atraente aos olhos dos estudantes, até porque eles nasceram no boom dessas inovações, com os computadores e a Internet sendo incluídas no sonho de consumo de todas as famílias e integradas gradualmente aos ambientes por eles freqüentados (supermercados, postos de gasolina, shopping centers, farmácias, locadoras de vídeo,...). Até as escolas já estão contando com esses recursos há algum tempo... Acredito porém que não basta equipar ou dar laptops para todos os estudantes que a educação irá melhorar. Esses recursos são meios através dos quais devemos efetivar a educação e, por isso mesmo, tem que ser entendidos e apropriados pelos professores quanto ao seu uso e possibilidades para depois serem utilizados com propriedade na escola. E, novamente destaco, todo e qualquer novo equipamento ou prática tem que estar associado a planos e projetos de trabalho, ao currículo escolar e aos conteúdos das disciplinas.

8- Os professores já sabem mas, por que, muitos ainda não promovem o debate em sala de aula, não pedem a opinião dos estudantes?

Há professores que fazem isso, acredito porém que esses debates, para que sejam mais efetivos para a educação, carecem de um processo formativo que se inicia ainda na educação infantil e nas primeiras séries do fundamental através do qual os estudantes tomem contato com a ciência, a literatura, as artes, a história, a geografia ou a filosofia para que tenham subsídios e argumentos que lhes permitam participar dessas atividades. Por causa do vestibular, algumas escolas acabam deixando a cultura geral de lado, para investir no conteúdo das disciplinas. Isso é um erro? Elas deveriam Dar mais destaque para cultura geral? O olhar direcionado para um ponto apenas pode fazer com que você chegue a esse lugar mas irá lhe impedir de ver as demais possibilidades de destino que se colocam durante a viagem que você está fazendo. A educação tem que firmar o compromisso de educar para a vida, para a relação com o mundo e com as pessoas, para a cidadania e a ética e, ao mesmo tempo, fomentar o interesse pela ciência, pela matemática, pela história... O foco não pode e não deve ser, nunca apenas uma prova, um exame, seja ele qual for - enquanto as escolas articularem suas forças nesse sentido continuaremos sendo sempre uma nação atrasada, subdesenvolvida, colonizada...

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