Carpe Diem
Um mundo em constante mutação
David Schlesinger
Cresci em New London, Connecticut, que foi um grande centro de pesca de baleias no século XIX. Nas décadas de 1960 e 1970, porém as baleias haviam desaparecido havia muito tempo, e os principais empregadores da região estavam ligados aos militares – o que não admira, em se tratando dos tempos do Vietnã. Os pais dos meus amigos trabalhavam na Electric Boat, na Marinha, na Guarda Costeira. Com a paz, a região sofreu uma nova transformação, e hoje é mais conhecida por seus grandes cassinos de Mohegan Sun e Foxwoods e pelo centro de pesquisas farmacêuticas da Pfizer. Alguns empregos se foram, outros vieram; certas competências se tornaram obsoletas, ao passo que outras passaram a ser necessárias. A região mudou, as pessoas mudaram. Evidentemente New London não está sozinha. Quantas cidades que viviam de moinhos não viram seus moinhos fecharem as portas; quantas cidades que viviam de sapatos não viram os fabricantes de sapatos irem embora; quantas cidades que outrora foram potências têxteis não compram, agora, tecidos chineses?
(David Schlesinger, diretor da Reuters América, em memorando enviado a todos os funcionários do setor editorial; Reproduzido na obra “O Mundo é Plano – Uma breve história do século XXI”, de Thomas L. Friedman, da Editora Objetiva)
Ao ler o trecho acima reproduzido de um memorando enviado pelo diretor de uma empresa jornalística do porte da Reuters a seus editores logo me coloquei a pensar no que havia acontecido ao longo de meu tempo de vida nas cidades onde morei. Queria comprovar aquilo que Schlesinger escrevera e que Friedman destacara através de seu esplêndido livro “O Mundo é Plano”.
Minha infância toda foi passada em São Sebastião, no litoral norte de São Paulo, cidade que desde então teve toda a sua vida econômica atrelada ao porto e a Petrobrás. De lá para cá não mudou muita coisa, a não ser que, devido ao pagamento de royalties pelo uso da localidade pela Petrobrás, o município enriqueceu e a prefeitura tornou-se outro importante núcleo empregatício (para o bem e para o mal como bem podemos pensar...).
O comércio cresceu, os bairros periféricos também, os residenciais de veraneio expandiram-se, as estradas alongaram-se, a vida dos pescadores humildes foi ficando cada vez mais difícil, as temporadas de férias são cada vez mais atribuladas e desagradáveis pelo excesso de pessoas que por lá se estabelecem por uma, duas ou três semanas e os serviços públicos essenciais parecem nunca estar prontos para recepcionar tantas pessoas de uma só vez, mesmo com os caixas da prefeitura estando mais cheios,... É, os tempos mudaram...
A minha adolescência transcorreu em São José dos Campos. A cidade já era um pólo de desenvolvimento econômico e tecnológico. O INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), o ITA (Instituto Tecnológico da Aeronáutica), o CTA (Centro Técnico Aeroespacial) e a Embraer (Empresa Brasileira de Aeronáutica) já permitiam antever um futuro brilhante para a cidade. Passou por crises e sobressaltos, sem dúvida, especialmente ao final dos anos 1980 e início da década seguinte...
Mas empresas diversas tornaram São José a cidade dos sonhos de muita gente, inclusive minha. Moderna, com grandes e bem projetadas avenidas, comércio bem equipado, restaurantes qualificados, cinemas, livrarias, praças, teatros, universidades, empregos... E, o melhor de tudo, apesar de cosmopolita e integrada ao mundo, ainda não perdeu o charme interiorano e o ritmo mais cadenciado de quem mora em cidade de médio porte.
Enquanto isso, a vinte quilômetros de distância, a pequena e pacata Caçapava, minha cidade de origem, continuava na mesma passada, lenta, vagarosa, quase parando... Situada entre São José dos Campos e Taubaté, na próspera região do Vale do Paraíba paulista, sendo atravessada pela movimentada Via Dutra, esperava-se que o progresso e o crescimento também batessem a sua porta...
É verdade que hoje em dia a agricultura e a pecuária já não são mais as pontas de lança da economia da cidade, a indústria e os serviços tornaram-se as áreas de maior empregabilidade e rendimentos do município, mas a vocação de cidade-dormitório (as pessoas moram lá, mas trabalham nos municípios vizinhos), que existia nos anos 1970 ainda é mantida, esse é, inclusive, o meu caso...
Tudo mudou bastante, mesmo em Caçapava e São Sebastião, onde as coisas foram um pouco mais lentas, aparentemente... O que importa constatar é que a vida das pessoas também mudou... Tudo está num ritmo mais acelerado, um tanto quanto neurótico, a exigência de produtividade nunca esteve tão alta, o tempo para si mesmo e para a família reduziram-se apesar da tecnologia e de suas promessas de paz, prosperidade, felicidade...
Hoje já não se procuram especialistas, nem generalistas, mas pessoas que sejam tudo isso e, além do mais, criativas, envolventes, bem relacionadas,... É um mundo em constante mutação e nós também temos que ser camaleões, com novas colorações de pele a todo o momento. Já não podemos só desabrochar como as flores ou evoluir como as lagartas que se transformam em borboletas... Será que é isso que queremos para nossas vidas?