Planeta Educação

A Semana - Opiniões

João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

Manifesto por uma nova escola
Reprovados outra vez... Temos que dar um basta!

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Era uma vez um país em que a educação era a prioridade número um de todos os governos. Isso desde tempos imemoriais ou, para ser mais exato, desde a fixação das primeiras vilas, aldeias e núcleos produtivos naquelas terras. Como conseqüência dessa preocupação com a formação qualificada de seus habitantes desde a infância, esse país acabou se tornando uma nação próspera, organizada, líder no cenário mundial, politicamente bem estruturada (com bases democráticas sólidas) e eticamente consolidada nos conformes mais respeitados pela comunidade internacional.

Seus estudantes brilhavam anualmente nas competições que reuniam enviados de nações de todos os continentes para avaliar os conhecimentos em matemática, línguas, ciências, geografia e história. O prêmio Nobel já havia sido conquistado várias vezes por expoentes da ciência desse celebrado país em áreas tão distintas quanto a medicina, a física e a literatura (também não foram poucos os prêmios para representantes dessa nação quando o tema era a Paz).

A produção econômica registrava anualmente crescimentos na faixa de 5 a 7%, estabilizada num patamar que garantia a criação de novos empregos, a oferta de produtos em suficiente quantidade e de boa qualidade tanto no mercado interno quanto no externo, as taxas de inflação eram baixíssimas e a relação comercial com os outros países apresentava quase sempre um saldo positivo na balança que avalia a exportação e a importação.

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Uma nova escola tem que motivar muito os estudantes.

As universidades desse país estavam entre as melhores do mundo e seus professores eram estimadíssimos, tinham carreiras estáveis, produziam com grande freqüência novos ensaios e pesquisas, publicavam esses trabalhos e viajavam constantemente para se atualizar e também para disponibilizar seus conhecimentos alhures. A incidência de estrangeiros era grande e o fluxo aumentava ano a ano com a chegada de estudantes provenientes dos quatro cantos do mundo.

As instalações das escolas, em todos os níveis, da educação infantil a universidade, com especial ênfase no ensino fundamental e no médio, eram motivo de orgulho entre os habitantes daquela nação. Cada centavo enviado as escolas realmente chegava ao seu destino e motivava o surgimento de laboratórios de ciências, núcleos de informática, bibliotecas e quadras esportivas de altíssimo padrão.

Se não bastasse isso, desde os primeiros dias no trabalho em educação os professores eram motivados a trabalhar com o máximo de empenho pois seriam valorizados a partir de sua capacidade de realmente implementar o ensino e levar os seus alunos a efetivar a aprendizagem. Existia para eles um plano de carreira e a necessária supervisão e cobrança por parte de seus superiores hierárquicos. Ninguém estranhava ou reclamava essa presença e participação dos diretores, coordenadores ou orientadores nas salas de aula, pelo contrário, esse movimento levava os educadores a sempre se mostrarem dispostos a produzir aulas ainda mais interessantes e instigantes para seus alunos.

Cada escola desse país possuía ainda projetos de ciências, artes plásticas, esportes, literatura, música, tecnologias aplicadas à vida, cinema, teatro,... Aos estudantes eram dadas várias opções que os ajudavam a encontrar-se pessoal e, no futuro, profissionalmente. Isso também os tirava das ruas e acabava evitando maiores complicações com drogas, álcool e violências decorrentes desses vícios.

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A cultura em suas mais diversas formas tem que estar presente nas escolas.

A proposta de trabalho dessas unidades educacionais primava pela busca da reflexão desde o início da vida escolar de uma criança. Nesse sentido aulas de filosofia, leituras freqüentes, contato com as artes e uso da internet, de jornais e revistas (adequados a cada faixa etária) mesclavam-se com brincadeiras de roda, jogos educativos, vídeos e dramatizações reproduzindo as situações da vida real.

A participação dos pais e da comunidade em geral era muito estimulada e tinha ótima repercussão. Críticas provenientes desses pais eram feitas de forma regular e ponderada para depois serem analisadas pelo corpo docente e resultarem em medidas que poderiam atenuar ou resolver problemas detectados. Todos tinham o direito de falar e o compromisso de escutar atentamente. Elogios também eram freqüentes e ajudavam a comprovar a qualidade dos trabalhos e a motivar os educadores a resultados ainda melhores.

E o mais importante, os estudantes eram ouvidos e instados a participar. Eram eles os protagonistas desse trabalho educacional. Não ficavam estáticos, apenas escutando ou reproduzindo o que lhes era passado por seus mestres. Aos professores, com toda a sua experiência, competia organizar e orientar as atividades, monitorar a atuação e a produção de seus estudantes e avaliar o progresso de seus alunos respeitando suas particularidades e ritmos de aprendizagem diferenciados. Mas eram os meninos e meninas que davam vida e rumo para o trabalho educacional.

A educação nesse país precisava deles e de toda a sua energia e vibração para acontecer. Cientes disso, os membros da comunidade a todo o momento pensavam e repensavam seus projetos e trabalhos em educação para criar estruturas de ensino que motivassem sempre as crianças e adolescentes a construir seus saberes, a elaborar uma interpretação própria do mundo em que viviam e a atingir, dessa maneira, a autonomia, a dignidade, a competência e a inserção social para todos esperada.

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A leitura e a escrita são bases fundamentais que devem ser prioridade para a escola.

Bom, mas deixemos de lado as projeções e idealizações da realidade para enfim falarmos daquilo que está realmente acontecendo em nossas escolas... Reproduzo abaixo o trecho inicial de um artigo publicado num dos mais respeitados e influentes jornais brasileiros para que possamos entender o drama que estamos vivendo e explicitar a distância entre o “sonho” e o “feijão” nosso de cada dia...

“O cenário da educação brasileira que surgiu dos três levantamentos apresentados ontem pelo Ministério da
Educação – Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB), Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e Censo da Educação Básica – não é dos mais promissores. Apesar de uma pequena melhora na avaliação dos alunos de 4ª série no SAEB, a seqüência de resultados é ruim. No ENEM, o desempenho médio dos quase 3 milhões de estudantes é o pior desde 2002. No Censo Escolar, o número de alunos no ensino médio continua a cair...” (O Estado de São Paulo, 8 de fevereiro de 2007, pág. A16).

Os resultados dessas provas do MEC registram, nos últimos 10 anos (entre 1995 e 2005), que os exames de matemática e português para os alunos do Ensino Médio tiveram uma mais do que expressiva queda de 10,6 e 32,4 pontos respectivamente. Na 8ª série do fundamental, nesse mesmo período, a média despencou 24,2 pontos em português e outros 13 pontos em matemática. O pequeno avanço de 3 pontos na 4ª série era motivo de comemoração do ministro da educação, que considerava essa a informação mais importante dos relatórios apresentados... (sem comentários!).

Mais do que os resultados cabe a constatação de que o ensino no Brasil foi reprovado mais uma vez e que, chegamos realmente ao fundo do poço. A educação no país está falida e precisa urgentemente de um projeto consistente (e não eleitoreiro), de investimentos sólidos (que garantam a chegada do dinheiro prometido às salas de aula), de professores com fôlego renovado e novas idéias (dispostos a realmente virar a mesa, ganhar o jogo), de uma atualização das propostas de ensino (para que o ensino seja vibrante e eficiente),...

Em suma, precisamos de uma revolução na escola, de uma nova escola, que dê sustentação para o crescimento do país a partir da formação plena e integral de nossos estudantes, como no país dos sonhos que mencionei ao longo dos primeiros trechos desse artigo. Chega de choro, reclamação, crítica vazia e pouco trabalho. Precisamos de uma nova escola, de uma educação engajada, de gente disposta a empenhar-se com todas as suas forças num projeto nacional para o ensino em todos os níveis. Só assim seremos o país descrito no início desse texto, aquele do “futuro” tantas vezes apregoado, gigante adormecido que precisa a todo custo acordar e realizar o sonho de prosperidade que tanto desejamos...

Avaliação deste Artigo: 4 estrelas