A Semana - Opiniões
Ler ou não ler...
Eis a questão!
Todos os anos as escolas preparam listas de leituras que serão pedidas aos alunos. A base dessas relações de livros é variável, em muitos casos sustentam-se nos títulos propostos pelos principais exames vestibulares do país (especialmente para alunos do Ensino Médio e para as duas últimas séries do Ensino Fundamental).
Nas séries anteriores a proposta também existe, mas a forma como a lista de títulos a serem lidos anualmente é elaborada é variável. Cada escola e, mais especificamente, cada professor cria uma relação de livros de acordo com suas próprias aquisições e leituras anteriores.
Trata-se quase sempre de um trabalho executado de forma bastante solitária e isolada pelos professores de língua portuguesa e literatura. Praticamente não há intercâmbio com outros educadores e, consequentemente, uma necessária diversidade e riqueza que poderia surgir a partir de recomendações e sugestões de professores de matemática, ciências, história, geografia, filosofia, inglês, artes ou educação física quase nunca chega a acontecer...
Não se trata aqui de refutar ou censurar as escolhas e alternativas de leituras indicadas pelos professores da área de códigos e linguagens. Pelo contrário, como especialistas dessa nobre área do conhecimento, cabe a eles a decisão final sobre essa relação de livros e isso deve ser respeitado. O que se está sugerindo é que se estabeleça um saudável e imprescindível diálogo durante o planejamento no início do ano letivo para que novas idéias possam surgir a partir da experiência de leitura dos demais colegas educadores.
As crianças têm que ser incentivadas a leitura desde a mais tenra idade...
Nesse sentido cabe, inclusive, criar uma agenda de leituras que acomode pelo menos uma contribuição que contemple livros voltados ao pensamento científico, filosófico, artístico, histórico ou geográfico. Como já tive a oportunidade de mencionar anteriormente, programar a leitura de clássicos como os livros de Isaac Asimov, Phillip K. Dick, H. G. Wells, Júlio Verne ou Mary Shelley (entre tantos outros) iria despertar a curiosidade científica dos estudantes ao mesmo tempo em que ajudaria a melhorar sua relação com a linguagem.
Intercalar autores como Machado de Assis, Rachel de Queiroz, Érico Veríssimo, Carlos Drummond de Andrade e outros grandes mestres da literatura brasileira com autores clássicos que trabalham com temas relacionados à ciência ou a filosofia pode, inclusive, tornar o intercâmbio entre as disciplinas melhor e mais regular. Leituras alternadas iriam fomentar a participação de outros docentes nas considerações e nos debates sobre as obras lidas.
E porque estou abordando essa questão agora, em dezembro, quando o ano letivo está se encerrando?
O motivo para isso refere-se ao fato de que todos os anos muitos alunos apenas “fingem” ler as obras pedidas. Apóiam-se em alguns de seus colegas que efetivamente realizaram essa árdua, porém agradabilíssima tarefa, para coletar informações sobre os títulos requisitados já que em algum momento serão avaliados sobre as referidas produções literárias...
Os universitários devem cultivar o hábito de visitar com freqüência as bibliotecas das instituições em que estudam e também os acervos públicos.
Há muitos que, atualmente, em virtude da expansão e rapidíssimo crescimento da Internet, nem mesmo conversam com os colegas para se informar sobre os livros pedidos pelos professores de português e/ou literatura. A profusão de sites que simplesmente “dão” todas as informações, com fichas completas sobre as tramas, descrições dos personagens, interpretação dos acontecimentos e ainda comentários especializados torna qualquer leitura aparentemente desnecessária...
E o mais interessante é que os casos de alunos que não leram as obras e que se valeram da Internet ou que contaram com o apoio de colegas que leram da primeira a última página da referida bibliografia têm aumentado muito de ano para ano. E não são poucas as situações em que esses “espertinhos” acabam tendo notas melhores do que os aplicados estudantes que leram a obra completa...
E o pior de tudo é que também não são poucos os casos de professores que se dão conta de que os alunos utilizaram esse expediente “fraudulento” para conseguir uma boa avaliação e que, mesmo assim, fecham os olhos para o ocorrido e permitem que esse comportamento reprovável continue a acontecer. Será que não percebem o prejuízo que estão legando para os alunos e também para a comunidade?
Não apenas no que se refere ao conhecimento das obras e de seus autores, mas também no quesito ético e moral. Ao permitir que essa prática condenável de utilização de resumos obtidos a partir da Internet (ou de qualquer outro meio) os professores estão simplesmente dizendo que em nosso país prevalece ainda nos dias de hoje a chamada “lei de Gérson”, aquela em que se preconiza que “temos que levar vantagem em tudo”, custe o que custar...
O exemplo dos professores e dos pais é de essencial importância para que os estudantes se sintam motivados para o exercício da leitura.
Até mesmo por esse motivo aconselho a leitura de obras de filosofia e sociologia nesses novos projetos de leituras a serem criados para os próximos anos. Um pouco de Descartes, Rousseau, Marx, Nietzsche, Platão ou Sartre pode ser muito interessante para que as nossas crianças e adolescentes entendam melhor não só as questões de ética e moral como também as de economia, política, arte, estética,...
Isso obviamente demandaria pesquisa a ser realizada conjuntamente pelo grupo de professores envolvidos nesse projeto. Para a aplicação de livros com autores desse quilate seria necessário que os próprios educadores os lessem com a devida atenção e cuidado para se apropriar de idéias, conceitos, explicações e também para que pudessem analisar, interpretar e considerar os textos e tirar suas próprias conclusões...
Mas até mesmo nesse sentido seria importante. O brasileiro lê muito pouco. E os professores não são exceções nesse sentido. Acabam até mesmo por questão de ofício tendo que ler mais, mesmo assim não da forma constante e esperada. Diga-se de passagem que são também reféns do sistema educacional brasileiro de características evidentemente disciplinares...
Isso os faz ler apenas livros que versam sobre assuntos relacionados às disciplinas com as quais trabalham nas escolas. E o conhecimento é dinâmico. Pede que tenhamos uma visão mais ampla e abrangente do mundo em que vivemos. Temos que adotar uma postura de pesquisadores e abrir os olhos para a ciência, as atualidades, a economia, a política, as artes,...
Acredito que até mesmo pelo fato de sermos tão fechados dentro das redomas disciplinares que nos sufocam acabamos também levando os nossos estudantes a vivenciar e partilhar do mesmo olhar reduzido e reducionista em relação ao mundo que nos cerca. Ao propor leituras que nos trazem ao convívio de literatos, cientistas, filósofos, jornalistas, sociólogos, historiadores, geógrafos e estudiosos de várias áreas do conhecimento tentamos mostrar que há uma riqueza cultural de grandes dimensões a ser descoberta através da leitura.
Embarcar numa boa leitura é garantia de prazer, satisfação, conhecimentos novos e certamente de crescimento pessoal e também profissional. Trata-se mesmo de um diferencial que garante maior qualificação e que lega possibilidades de maior valorização no mercado de trabalho. Se continuarmos permitindo que os alunos não leiam ou se mantivermos os atuais projetos de leitura estaremos ou não comprometendo o amanhã de nossos alunos? Pense bem a respeito e, se precisar posso até mesmo dar algumas sugestões de leituras para aprofundar esse tema...
Obs.: A propósito, que tal dar uma olhada nos artigos do Planeta Literatura (http://www.planetaeducacao.com.br/new/colunas.asp?col=1). O foco principal é a diversidade. Pode ser inspirador....