A Semana - Opiniões
Esporte + Cultura = Saúde
Pelo futuro de nossas crianças e jovens
A natação é um dos mais completos esportes praticados pela humanidade.
Pratiquei esporte competitivo desde os 9 anos de idade. Ia todos os dias a Associação Esportiva São José, fazia parte de uma das mais competitivas equipes de natação do estado de São Paulo. Nadava diariamente, em média, de 6 a 8 mil metros. Fazia ainda exercícios físicos fora dágua para aquecer, corridas e musculação para deixar o corpo mais preparado para as competições nas quais participávamos.
Era rigoroso o treinamento. Os técnicos exigiam muito de todos os atletas. Para atingir o nível técnico elevado que possuíamos a cobrança dos treinadores fazia sentido. Mesmo com toda a dedicação, empenho e “pressão” que eventualmente sofríamos, formávamos uma família feliz. Éramos todos jovens (que tinham entre 12 e 20 anos), tínhamos excelente saúde, conhecíamos amigos de outras equipes, viajávamos para várias cidades (dentro e fora do Brasil),...
Nos momentos em que não estava dentro das piscinas, eu e meus colegas íamos a escola, fazíamos cursos de inglês, jogávamos bola, saíamos para um cineminha e sempre estávamos juntos. Até as paqueras e namoros eram com colegas do esporte. Formávamos o que se poderia chamar de “geração saúde”.
Atualmente minha filha é bailarina, minha esposa faz sapateado, meu menino joga futebol numa escolinha e eu continuo estudando, fazendo o meu doutorado. Estamos sempre ocupados com alguma atividade que nos faz crescer. Faz bem para o corpo, para a cabeça e também para a alma. Qualquer hora dessas, quando a agenda ficar um pouco menos corrida voltarei para as piscinas para me tornar um atleta master (com mais de 35 anos) e competir novamente. Tenho saudades do esporte e de seu ambiente saudável...
E por que estou contando toda essa história pessoal?
A música, a dança, a literatura, o teatro e todas as atividades culturais
dão objetivo e horizontes para o futuro de nossas crianças e jovens e
evitam que os mesmos fiquem ociosos e caiam no vício.
Sinto que a nossa juventude anda muito ociosa. Penso que a resposta para problemas como o alcoolismo, as drogas ilícitas, a anorexia, a bulimia, a violência e tantas outras pragas que atormentam a vida desses jovens se encontra no esporte e na cultura.
Nosso país não tem projetos consistentes de esporte na escola. Esse é um erro grosseiro de nosso planejamento curricular. A educação física deve ser encarada com muito mais respeito e ter uma atuação mais integrada com as outras disciplinas. Não sinto isso como um erro cometido pelos professores que atuam na área, pelo contrário, conheço muitos deles que se interessam em realizar projetos juntamente com os outros educadores das escolas em que trabalham...
A alteração tem que ser realmente de base curricular. Deve haver um aumento de carga horária para 4 ou 5 aulas semanais e a possibilidade de transformar essa participação em prática competitiva com a criação de escolinhas esportivas dentro das próprias unidades educacionais públicas ou privadas. A criação de equipes de vôlei, basquete, futebol, futsal, atletismo, tênis de mesa, xadrez, natação, ginástica rítmica e tantos outros esportes é importante não apenas para o corpo de nossas crianças.
Ao se criarem alternativas esportivas dentro das escolas damos aos estudantes um rumo em suas vidas e lhes legamos uma educação integral. O esporte não é bom somente para o corpo, ensina a trabalhar em equipe, dá ao atleta uma ótima coordenação motora, ajuda-os a se disciplinarem para o treinamento e a competição com repercussões positivas para o trabalho em sala de aula e os tira do ócio.
O mesmo movimento deveria acontecer em relação à cultura e, especificamente a arte nas escolas. Grupos de teatro, bandas, rádios estudantis, turmas de dança, mostras de artes plásticas, aulas de produção de quadrinhos, modelagem e pintura, salas de leitura, cursos de produção de vídeos e tantas outras alternativas poderiam auxiliar muito na formação de gerações mais criativas, atuantes, responsáveis socialmente e de resultados melhores nas próprias disciplinas.
Aprender música é compartilhar conhecimentos clássicos que nos unem
a nomes como Mozart, Beethoven, Villa-Lobos, Tom Jobim, George Gershwin e
tantos outros grandes estudiosos e compositores.
Crianças e adolescentes estimulados desde a mais tenra idade poderiam aprender música clássica e saborear os acordes e notas de Bach, Beethoven ou Mozart; peças teatrais baseadas em autores nacionais e estrangeiros seriam encenadas e ajudariam a melhorar o rendimento em português, literatura ou história; filmes produzidos pelos próprios estudantes iriam ajudá-los a entender melhor o mundo que os cerca e os mobilizariam a defender o meio-ambiente ou se solidarizar em relação a crianças abandonadas e/ou idosos em asilos.
O estudo da arte de Tarsila, Di Cavalcanti, Picasso, Michelângelo e tantos outros mestres ajudaria a dar mais sentido para suas vidas e cores para o seu cotidiano; a produção de quadrinhos ou o trabalho na gravação de programas de rádio os auxiliaria a entender que a arte depende de estudo, inspiração e também de transpiração...
Oficinas de arte e escolinhas esportivas seriam remédios muito eficazes contra o ócio que empurra nossas crianças e adolescentes para as ruas e para os descaminhos dos vícios. As escolas se tornariam locais muito mais agradáveis e estimulantes aos olhos desses estudantes que as encarariam como um segundo lar e passariam mais horas dentro das unidades educacionais em que estudam.
Os professores de educação física contariam com torneios regulares de âmbito municipal e estadual para que seus estudantes/atletas pudessem competir e mostrar suas habilidades. Ao mesmo tempo em que cobrariam bons resultados nas outras matérias escolares para que os treinamentos pudessem continuar acontecendo.
Esportes coletivos como o futebol, o vôlei ou o basquete ajudam
a criar
sentido coletivo, a repartir as responsabilidades e
a partilhar
os louros da glória ou as dores das derrotas.
As aulas de artes, oficinas literárias ou as produções para a rádio estudantil e os vídeos em processo de criação poderiam estar integrados ao trabalho desenvolvido pelos professores de biologia, geografia, matemática, física, inglês,... Dessa forma o interesse por todas as disciplinas iria certamente aumentar bastante!
Não devemos pensar que o objetivo final dessas equipes esportivas ou dos grupos culturais deve ser necessariamente o sucesso, com a revelação de grandes atletas ou de novos expoentes culturais. Se um projeto dessa natureza se tornar política de estado é certo que iremos trazer a tona talentos que estão sendo desperdiçados tanto na área cultural quanto na esportiva. Podemos assistir ao surgimento de vitoriosos como João do Pulo, Gustavo Borges, Daiane dos Santos, Oscar Schimdt, Hortência, Giba ou Fernanda Venturini na área esportiva e, quem sabe, destaques da cultura como Paulo Autran, Fernanda Montenegro, Milton Nascimento, Tom Jobim, Elis Regina, Ana Botafogo,...
O objetivo maior deve ser, no entanto, o da criação de pessoas melhores. Integridade, cidadania, ética, saúde, cultura mais ampla, solidariedade, criatividade e autonomia para as crianças e adolescentes que passam por nossas escolas deve ser o real objetivo de um projeto como esse. Criança saudável é aquela que é bem alimentada, tem um ambiente familiar que a estimula e a trata com carinho, freqüenta escolas e é incentivada a estudar, participa de eventos culturais, pratica esportes e tem tempo para brincar...
O conceito de felicidade e desenvolvimento integral passa por todos esses quesitos. Não adianta melhorar a qualidade de nossas escolas e deixar o resto do tempo dos estudantes totalmente ocioso. Não há como cobrar mais estudo e a realização das tarefas se não existir a orientação dos professores e a cobrança da família. Crianças ou e adolescentes precisam aprender a ter objetivos, planejamento e disciplina para que sejam bem sucedidos e se sintam presentes, atuantes e importantes para o mundo em que vivem.
Isso me faz lembrar do filme “A Corrente do Bem”, de Mimi Leder, em que ao ser inquirido pelo professor de geografia sobre o que poderia fazer para melhorar o mundo, um aluno da sétima série responde que eles nada podem fazer, pois até para ir ao banheiro na escola têm que pedir autorização. Falta-lhes autonomia, eles carecem de objetivos, o ócio em que vivem os projeta para um futuro de poucas certezas e muitíssimas dúvidas.
É nesse sentido que defendo a idéia de uma reformulação dos projetos curriculares com a finalidade de previsão entre seus trabalhos futuros de atividades esportivas e oficinas culturais. Teremos a partir de então, um amanhã muito mais luminoso para as gerações que puderem participar dessas atividades e, suas respostas para perguntas semelhantes àquela do filme serão muito diferentes, primando para a efetiva realização e transformação da realidade...