Planeta Educação

De Olho na História

João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

Do tropeirismo à cafeicultura...
Uma Breve história do Vale do Paraíba

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O tropeirismo foi uma das ocupações que movimentou
inicialmente a economia da região valeparaibana.

Historicamente a região valeparaibana passou a ter significância no cenário nacional a partir de sua vinculação aos progressos advindos da corrida do ouro iniciada no Brasil Colônia entre o final do século XVII e início do XVIII. O surgimento das primeiras notícias motivou milhares de pessoas a se deslocar para a nascente região das “Geraes” em busca de rápido enriquecimento que poderia ser auferido com a descoberta e exploração de novas jazidas.

De São Paulo, como não poderia deixar de ser, também partiram centenas de pessoas. O afluxo inicial, por sinal, havia sido feito por paulistas que se encaminharam para Minas na esteira das descobertas realizadas pelos bandeirantes. Desse povoamento inicial surgiram as primeiras vilas estabelecidas no entorno das regiões auríferas e também os primeiros conflitos entre mineradores e governo colonial.

O primeiro registro significativo de conflitos travados na região, por exemplo, confrontava paulistas e migrantes provenientes das demais regiões da colônia e do reino português em busca de espaço nesse eldorado recém-estabelecido. Esse embate ficou conhecido historicamente como a Guerra dos Emboabas.

Porém, o destino dos paulistas do Vale do Paraíba não se concretizou a partir do brilho do metal dourado. Pelo menos não para a grande maioria de habitantes dessa incipiente região de São Paulo (não podemos esquecer que estamos nos referindo ao período de formação das primeiras vilas e povoados valeparaibanos, que depois iriam se consolidar para que ocorresse o surgimento de cidades de grande importância e destaque no cenário político e econômico brasileiro durante os séculos XIX e XX, como Taubaté e São José dos Campos).

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As entradas e bandeiras ajudaram a fixar a região do Vale do Paraíba como um ponto de partida e de chegada dos colonos que desbravaram o interior de São Paulo e do Brasil.

O principal subsídio para a sobrevivência da região continuava sendo a agricultura de subsistência, praticada em roças rústicas, de forma bastante primária em termos técnicos, sem qualquer tipo de sofisticação. A situação rudimentar vivida pela agro-pecuária do Vale do Paraíba daquela época pode ser facilmente explicada pelo próprio isolamento pelo qual passavam os estados do Sul do país e também São Paulo.

Sem grandes perspectivas em termos comerciais, ofertando produtos que não eram interessantes ao mercado português, carecendo de melhores vias de comunicação por terra e por mar com as demais regiões do Brasil (apesar da existência e manutenção de portos em Parati e Ubatuba), a solução para os paulistas havia sido à busca de recursos suplementares a economia colonial.

O surgimento das Entradas e Bandeiras explica, sobremaneira, essa tentativa paulista de encontrar novas formas de sobreviver. A subida da serra e a criação da vila de Piratininga que viria a ser conhecida mundialmente como São Paulo constituem os primeiros movimentos dessas novas atividades paulistas. O desbravamento do território e o estabelecimento de rotas no emaranhado das matas da Serra do Mar levaram os primeiros habitantes da região paulista, identificados até então como vicentinos em função da principal base ocupacional da região ser até aquele momento a cidade litorânea de São Vicente, a fundar a futura capital dos paulistas e também a criar os caminhos que levavam ao Vale do Rio Paraíba.

O trabalho disponível para os paulistas foi o apresamento de escravos indígenas (que supria o mercado interno brasileiro em períodos de crise econômica ou ainda durante certos momentos de nossa história em que o tráfico de escravos africanos ficava dificultado pela disputas internacionais) e o comércio de gêneros alimentícios provenientes do sul do país (em especial o charque) para o abastecimento da capital instalada em Salvador, na Bahia e nas demais proeminentes e enriquecidas cidades do ciclo do açúcar nordestino brasileiro.

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Religiosos das ordens que se estabeleceram no Brasil, com destaque para os jesuítas, também estiveram presentes no processo de estabelecimento das vilas e povoados do Vale do Paraíba.

O Vale do Paraíba se tornou, então, rota de passagem dos bandeirantes, dos mascates (vendedores ambulantes), dos interessados em adquirir escravos aborígines, de jesuítas e demais religiosos das ordens estabelecidas em nosso país e, também, das poucas autoridades coloniais que se dispunham a fiscalizar e tentar identificar e controlar o nascente e crescente comércio da região.

As primeiras vilas surgidas no Vale do Rio Paraíba viviam eminentemente às custas da venda de seus produtos originários da produção de subsistência. Essa produção agropecuária se transformava, então, em refeições servidas nas estalagens, tabernas e pequenos estabelecimentos que abrigavam os viajantes.

Isso acaba se prolongando como realidade valeparaibana nas nascentes vilas e povoados da região ao longo de mais de um século, até o momento em que o ocaso (a decadência) e a conseqüente pobreza vividos pela população local são superados em virtude do estabelecimento da produção cafeeira, ainda na primeira metade do século XIX, a partir das décadas de 1830-1840.

O marasmo como regra da economia regional valeparaibana ao longo do século XVIII e nas primeiras décadas do XIX só não foi total em virtude da existência da Casa de Fundição de ouro estabelecida em Taubaté e do aparecimento de regiões produtoras de açúcar em rincões locais. “A casa de Fundição de Taubaté, instalada em 1695, arrecadou para os cofres reais, no período de 1696-1697, 14.080 oitavas de ouro, ou seja, mais de treze arrobas” e foram instalados engenhos de açúcar em Guaratinguetá, Jacareí e Lorena num total de 170 estabelecimentos.

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O café foi o grande dinamizador da economia do Vale do Paraíba a partir do século XIX. De sua riqueza ascendeu São Paulo ao posto de maior pólo econômico brasileiro.

Entretanto é o surgimento da produção cafeeira que define a plena recuperação econômica de São Paulo e o seu estabelecimento, a partir da segunda metade do século XIX como maior produtor de riquezas em nosso país. Para que isso acontecesse foram fundamentais alguns fatores que permitiram o estabelecimento bem-sucedido do café em São Paulo e, particularmente no Vale do Paraíba, ou sejam:- A disponibilidade de terras nas regiões sudeste e sul do país; a base de formação da posse de terras pautar-se ainda na primeira metade do século XIX no regime de sesmarias (o que seria revisto apenas em 1850 com o surgimento da Lei de Terras); a existência de mão de obra escrava ociosa em virtude da decadência dos engenhos de açúcar do nordeste brasileiro; as condições climáticas, topográficas, pluviométricas e a existência de rotas fluviais no Vale do Paraíba; além da capacidade do solo local favorável ao plantio dessa cultura agrícola.

O advento do café foi ainda mais importante se analisarmos as mudanças que acabou fomentando no sistema de trabalho que se adotava no país. Se no princípio os cafeicultores foram subsidiários do sistema escravista dominante no restante do país, também foram os “coronéis” do café de São Paulo que estimularam a substituição do trabalho escravo pelo assalariado em busca de maior produtividade e, como resultado disso, maiores ganhos.

Para isso a partir da década de 1850 surgiram as primeiras iniciativas locais que bancavam a vinda de imigrantes europeus, especialmente de italianos (também de alemães, portugueses e espanhóis) para substituir os negros na lida do café. Além dos claros resultados obtidos quanto ao aumento do rendimento das lavouras, os paulistas também foram motivados a partir para tal ação em virtude das decisões jurídicas tomadas pelo governo brasileiro em favor de uma gradual extinção da escravidão no país.

O surgimento das leis escravistas (Lei Eusébio de Queiroz de 1850, Lei do Ventre Livre de 1871, Lei dos Sexagenários de 1885 e, finalmente a Lei Áurea em 1888) levou a uma oferta cada vez mais reduzida de escravos no território brasileiro e acabou promovendo um aumento abusivo no valor dos cativos em oferta. Isso acarretava prejuízos ou a diminuição dos lucros e por esse motivo foram promovidas às imigrações européias.

Todos esses momentos e fatores foram decisivos para que se pudesse conceber um modo de vida muito particular e próprio para São Paulo e, conseqüentemente, para o Vale do Paraíba paulista. As influências advindas das etnias (índios, portugueses, negros e imigrantes europeus) que por aqui viveram e que acabaram por se mesclar e dar origem ao caipira valeparaibano também forneceram os elementos essenciais para o surgimento das bases cotidianas da vida nessa região.

PAZIN, José Luiz. Os fundamentos históricos da industrialização do Vale do Paraíba. http://www.lo.unisal.br/nova/ead/estudo6.html . Acesso em: 02 maio 2005.

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