Alex Garcia Alex Garcia Pessoa Surdocega; Formação em Educação Especial com Habilitação em Deficientes da Audiocomunicação, Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria-RS; Curso de Especialização em Educação Especial; Presidente da Associação Gaúcha de Pais e Amigos dos Surdocegos e Multideficientes - AGAPASM; Membro da World Federation of Deafblind - WFDB; Autor da obra Surdocegueira: empírica e científica; Vencedor II Prêmio Sentidos; Rotariano Honorário - Rotary Club de São Luiz Gonzaga-RS. Líder Internacional para o Emprego de Pessoas com Deficiência - Professional Program on International Leadership, Employment, and Disability (I-LEAD) graduado poela Mobility International USA / MIUSA; Ministrante de Palestras, Cursos, Seminários, Conferências sobre Surdocegueira e Múltideficiência em Congressos Nacionais e Internacionais; Publicação de Artigos sobre o Tema em Revistas Científicas, Jornais e Sites; Participação em Pesquisas na Universidade Federal de Santa Maria; Santa Maria-RS.
As Origens da Educação de Surdocegos / Princípios Orientadores na Educação de Surdocegos
Alex Garcia
As
Origens da Educação do SurdoCego
Destacar algo sobre a Surdocegueira através dos tempos
significa relembrar nomes e locais que, para nós que vivemos
o cotidiano da Surdocegueira, tornam-se imortais, verdadeiros mitos
daquilo que caracterizou as primeiras investidas educacionais nesta
área.
Nosso tempo permite um breve relato desta história.
A primeira criança Surdocega que foi educada com sucesso foi
Laura Bridgman que entrou no Instituto Perkins1 (EUA) em 1837.
Mas ainda, mais afável experiência foi
proporcionada à humanidade por Anne Sullivan, professora
surda e não menos notável aluna Helen Keller2 que
estudou na Perkins por muitos anos. Como podemos notar, a
Educação Surdocegos nasceu nos EUA,
consequentemente, hoje em dia, há mais portadores de
Surdocegueira sendo educados e reabilitados neste país que
no restante do mundo.
De acordo com Kenmore (1977), os programas para
Educação de Surdocegos na Europa tiveram seu
início na França (1884), seguindo-se na Alemanha
(1887) e Finlândia (1889). Convém destacar que, em
cada um destes locais, o número de alunos era muito pequeno.
Em 1977, foram catalogados apenas 350 Surdocegos em atendimento em 13
países.
A História Brasileira
A História da Surdocegueira no Brasil tem início
em 1953 com a visita da já mundialmente conhecida Helen
Keller (Soares, 1999). Esta visita sensibilizou uma grande
personalidade, que anos mais tardes seria nacionalmente conhecida por
seus esforços.
Trata-se da Educadora Nice Tonhozi Saraiva. Saraiva, já
trabalhando na Educação de cegos no Instituto de
Cegos “Padre Chico” em São Paulo
dedicou-se também a Educação de
Surdocegos a partir de 1962 quando tão logo voltou dos EUA.
Ainda em 1962, fundou a SEADAV – Serviço de
Atendimento ao Deficiente Audiovisual. Em 1963, por
intervenção do estado a SEADAV foi transferida de
São Paulo para São Bernardo do Campo. Em 1968, a
SEADAV passou a se chamar ERDAV – Escola Residencial para
Deficientes Audiovisuais. Em 1977, para garantir maior autonomia da
escola, foi novamente alterada e passa a ser chamada de FUMAS
– Fundação Municipal Anne Sullivan, que
ficou sendo a mantenedora da Escola de Educação
Especial Anne Sullivan, que funciona até os dias de hoje.
1 - Instituto Perkins para cegos, Waltertown, Massachusetts, EUA.
2 - Keller, considerada nos tempos atuais a mais surpreendente
Surdacega de todos os tempos.
Princípios
Orientadores na Educação de Surdocegos
Nossa experiência já mostrou há muito
tempo, que o simples fato de tocarmos na palavra Surdocego ou
Surdocegueira na presença do ser humano provém de
imediato um mundo desfigurado, um mundo sem luz nem som, portanto
solitário e, para muitos, inatingível,
consequentemente impossível de ser, pelo menos, em parte
modificado.
Esse é o mundo, a realidade da Surdocegueira vista por
alguém de fora.
Porém, nosso objetivo ainda deve ser cumprido; desmistificar
esta visão é necessário.
Pois bem! Educar um Surdocego, sendo este apenas Surdocego ou
apresentando outra deficiência associada, é um
processo bastante complexo, principalmente tratando-se da Surdocegueira
pré-lingüística, o que veremos mais
adiante, aqui mesmo neste espaço. Sobretudo, no que se
refere à Surdocegueira pré e
pós-lingüísticas, estratégias
educativas adequadas a cada grupo e inseridas neste, a cada pessoa
poderão não o ser para outra, dado que cada
pessoa é um ser único.
No entanto, existem alguns princípios que, em nosso tempo de
convivência e participações,
mostraram-se úteis podendo ser importantes para futuras
intervenções.
Estes princípios podem ser agrupados em três
grupos:
1. Atitude do Educador.
2. Ambiente de
Educação/Aprendizagem.
3. Relações com o Surdocego.
a) Atitude do Educador
Ao desenvolvermos qualquer trabalho junto ao Surdocego, é de
fundamental importância a colaboração
que as famílias têm junto aos profissionais de
outros serviços para a Educação do
Surdocego, no sentido de termos abordagens de cunho transdisciplinar em
que as pessoas que dela fazem parte partilhem os mesmos objetivos.
Consequentemente, a família e o educador não se
sentem tão isolados sendo estes então os
principais impulsionadores da Educação do
Surdocego.
“Os outros técnicos trabalham diretamente com ela
durante o processo de avaliação e ajudam a
implementar as estratégias mais específicas nos
ambientes naturais ao Surdocego.” (Smith e Lavack, 1997).
Também considerando a complexidade do trabalho, acarretando
dessa forma abandono por parte de educadores e de equipe
transdisciplinar, a família é,
freqüentemente, o único elemento que ano
após ano continua o trabalho com o Surdocego.
Assim, quando esta está envolvida é mais
fácil manter a consistência das
estratégias e dar continuidade ao trabalho, principalmente a
este significativo grupo de deficientes, dado que grande parte da
intervenção, principalmente nas primeiras idades
de um Surdocego pré-lingüístico
é reforçada ou realizada no ambiente familiar
(Smith e Lavack, 1996).
Como acontece na Educação de qualquer pessoa,
outro princípio a considerar é a
independência. O educador e a família devem
procurar ajudar o Surdocego a funcionar o mais independente
possível nos ambientes em que se encontra inserido.
Para Surdocegueira pré-lingüística,
contribuir para independência pode significar ter muita
energia, criatividade, tolerância de nossa parte, pois pode
ser mais fácil fazer a tarefa pelo Surdocego do que
ensiná-lo a fazer. Para a Surdocegueira
pós-lingüística, independência
pode significar o uso de algum equipamento especial, e, com certeza, a
aprendizagem de modelos de comunicação
alternativos.
Uma grande parcela de indivíduos Surdocegos ainda
não é capaz de defender os seus
próprios direitos, sendo essencial que quem contate com eles
sistematicamente respeite os seus direitos individuais, como por
exemplo:
1. Ter consciência da privacidade do
Surdocego pré-lingüístico, isto
é, não discutir assuntos relacionados com ele na
sua presença. O fato de freqüentemente
não conseguir falar ou ter dificuldades em pensar
não significa não compreender que se
está a falar dela. (Cushman, 1992).
2. Ter consciência que um Surdocego
pós-lingüístico pode defender seu ponto
de vista e seus direitos apesar de ser Surdocego. Sua capacidade
intelectual pode estar em plenas condições de
desenvolvimento.
3. Permitir que tenha a dignidade de correr alguns
riscos naturais, deixando o Surdocego fazer tudo aquilo que puder por
si só, embora, por vezes, possa ser inconveniente para os
outros.
b) Ambiente de Educação e Aprendizagem
É indispensável para qualquer Surdocego criarmos
um ambiente de aprendizagem que constitua uma verdadeira
experiência de aprendizagem. Devemos organizar um ambiente em
que o Surdocego possa estar ativo, promovendo ele próprio a
aprendizagem, ou seja, um ambiente que convide a resposta.
Devemos envolver o Surdocego numa aprendizagem ativa possibilitando, de
algum modo, ter controle sobre seu ambiente e
motivação para iniciar respostas que controlem
acontecimentos. É fundamental considerar a abordagem
multisensorial principalmente quando a Surdocegueira apresenta
problemas de desenvolvimento e problemas sensoriais.
“Como o Surdocego poderá ter dificuldades em
aprender através da audição e da
visão, beneficiará de uma
intervenção baseada no desenvolvimento de outros
sentidos” (Cushman, 1992).
As experiências táteis são
indispensáveis. É a forma de se adquirir
informação acerca do mundo, principalmente se o
indivíduo for totalmente cego. Os canais auditivos
também são importantes, pois ajudam o
indivíduo a funcionar nos ambientes. Adicionalmente, os
sentidos do olfato, do gosto e do movimento também
ajudarão a compreender melhor o mundo que nos rodeia. De
acordo com Cushman (1992), cada um dos sentidos deve ser incorporado
numa intervenção integrada, de modo a encorajar o
Surdocego a explorar o mundo a sua volta. É essencial
ensinarmos habilidades funcionais1 ao Surdocego. Quanto mais funcional
for o ensino, maior é a possibilidade de êxito,
pois melhor compreende o seu significado. Assim é muito
importante, tanto para o surdo pré quanto para o
pós-lingüístico, analisarmos o valor de
uma determinada habilidade.
Questões como:
1. Para que aprender isso?
2. Será relevante para sua vida futura?
3. Promove sua independência?
São muito importantes e devem ser consideradas.
c) Relações com o Surdocego
As experiências e atividades devem centrar-se nos interesses
dos Surdocegos.
Com Surdocegos pré-lingüístico este deve
conhecer suas preferências e interesses em determinados
objetos e atividades usando sua observação para
isso e usando este conhecimento como ponto de partida para a
seleção de atividades.
Por outro lado, o Surdocego
pós-lingüístico, que é em
grande parte mais susceptível a mudanças, seus
interesses também devem ser respeitados, principalmente
aqueles que visem à integração social,
sua comunicação, e seu crescimento
pessoal/individual.
Outro aspecto capital, principalmente com relação
ao Surdocego pré-lingüístico e dar tempo
para que ele responda.
Uma criança Surdocega precisa de mais tempo para a
manipulação e exploração
tátil. Se tiver outros problemas associados, o tempo deve
ser ainda maior. Ela precisa de tempo para dar sentido ao que acontece
em sua volta “por isso as mudanças de materiais,
de atividades, não ficam confusas” (Chen e
Dote-Kwan, 1995).
1 - O conceito de funcionalidade refere que tudo o que aprendemos deve
ser susceptível de ser utilizado e contribuir para aumentar
a sua autonomia pessoal (Viera e Pereira, 1996)
Referências
Bibliográficas
KENMORE J. R. State OD the art: Prespectives on Serving Deaf-Blind
Children.1977.
Soares, R. A História da Educação do
Surdocego no Brasil. In: Toque: Mãos Que Falam. Ano 1,
Nº. 1, São Paulo, 1999.
Waterhouse, E. J. Definições, Responsabilidades e
Direitos dos Surdocegos. In: Anais I Seminário Brasileiro de
Educação do Deficiente Audiovisual –
ABEDEV. São Paulo, 1977.
Chen, D.; Dote-Kwan J. Starting Points:Instructional Pratices for Young
children Whos Multiple desabilities Include Visual Impairment. Blind
Children Center. Los Angeles, Califórnia, 1995.
Nunes M. C. A. Aprendizagem Ativa na Criança Multideficiente
com Deficiência Visual: um guia para educadores. Perkins
School for the Blind, 1999.
Cushman, C. Teaching Children With Multiple Disabilities na Overview.
Perkins School for the Blind, 1992.
Smith, M. e Nancy, L. Teaching Students With Visual and Multiple
Impairments a Resouce Guide. Texas School for the Blind and Visually
Impaired, 1996.
Alex
Garcia
Portador de Surdocegueira.
Formação em Educação
Especial com Habilitação em Deficientes da
Audiocomunicação, Universidade Federal de Santa
Maria; Santa Maria-RS.
Curso de Especialização em
Educação Especial.
Presidente da Associação Gaúcha de
Pais e Amigos dos Surdocegos e Multideficientes - AGAPASM
Membro da Associação Brasileira de Surdocegos -
ABRASC.
Membro da Federação Latino-Americana de
Surdocegos - FLASC
Membro da World Federation of Deafblind - WFDB
Servidor Público, no período de junho de 2002
à julho de 2004, atuando como Assessor Técnico da
FADERS – Fundação de
Articulação e Desenvolvimento de
Políticas Públicas para PPDs e PPAHs no RS
Ministrante de Palestras, Cursos, Seminários,
Conferências sobre Surdocegueira e Múltipla
Deficiência Sensorial em Congressos Nacionais e
Internacionais.
Publicação de Artigos sobre o Tema em Revistas
Científicas, Jornais e Sites.
Participação em Pesquisas na Universidade Federal
de Santa Maria; Santa Maria-RS.