A Semana - Opiniões
As lições do pesadelo
Os remédios amargos que temos que tomar...
Acordar assustado durante a noite nos últimos dias em virtude de qualquer barulho diferente no quintal ou na varanda se tornou rotina entre milhares de paulistas. Em cidades próximas de presídios o medo foi ainda maior. Reféns dos bandidos que atormentaram o estado de São Paulo, terminamos a semana retornando a normalidade de nossas vidas ainda pensando nas mortes e atentados perpetrados a comando do PCC (Primeiro Comando da Capital).
Ouvimos autoridades manifestando sua indignação. Vimos o olhar assustado das pessoas nas ruas. Sentimos, com pesar a dor das famílias que perderam entes amados nessa guerra que se estabeleceu nas ruas e penitenciárias paulistas.
Iniciaram-se discussões acerca dos acontecimentos. A evidente liderança do PCC começou a ser investigada e descobriu-se que a estrutura desse comando criminoso é muito mais completa e bem organizada do que se pensava a principio.
É necessária e urgente a reforma do judiciário.
Descobriu-se, por exemplo, que integrantes dessa organização de bandidos estão sendo preparados para ingressar no serviço público, na área que atende ao judiciário ou ao legislativo, para que suas interferências nos procedimentos internos pudessem favorecer os lideres de suas falanges nos tribunais, em transferências dentro dos presídios ou até mesmo com o repasse de informação sobre autoridades que se levantassem contra a criminalidade organizada.
Constatou-se também que grupos como o PCC ou o CV (Comando Vermelho) estão bancando os estudos de alguns de seus membros para que se formem em direito e se tornem leais defensores de seus interesses tendo pleno conhecimento da lei de suas brechas, atalhos,...
As discussões acerca dos telefones celulares levaram a aplicação imediata de restrições ao uso desses aparelhos em alguns presídios do estado de São Paulo. Trata-se apenas de medida paliativa, que não irá solucionar a questão.
A questão prisonal brasileira demanda ações a curto, médio e longo prazos. Não há formulas mágicas. Os remédios, mesmo aqueles que devem solucionar as dores de cabeça mais imediatas, são amargos. E não se deve desperdiçar nenhuma gota desses medicamentos. Somente pacientes disciplinados conseguem superar suas enfermidades...
As restrições ao uso do celular devem ser
aplicadas a todos os presídios.
Entre as mencionadas medidas imediatas estão aquelas de repressão e combate mais intenso à criminalidade. Os especialistas têm mencionado a necessidade de isolar os líderes dos comandos (com o recolhimento dos mesmos aos presídios de segurança máxima, a restrição de visitas a uma ou duas vezes por mês, à redução das horas ao ar livre, a utilização de câmeras de monitoramento dos movimentos desses detentos durante as 24 horas do dia, ...), bloquear os celulares em todas as penitenciarias, construir presídios menores, dividir os presos por nível de periculosidade (e quanto mais perigosos maior o isolamento) e aumentar o rigor nas revistas feitas durante as visitas de familiares e advogados.
A médio prazo são necessárias ações como promover um combate mais ostensivo e eficaz contra a criminalidade, preparar e equipar adequadamente as policias brasileiras (a ponto de dotá-las ao nível das melhores forças européias ou norte-americanas), estudar e aplicar modelos bem sucedidos de combate ao crime organizado (como na Itália ou nos EUA), verificar e pesquisar os sistemas penitenciários de países que terceirizaram (ou privatizaram) esses serviços, modificar a legislação penal prevendo a aplicação de sanções (como mais meses ou anos) aos presos que sejam pegos com celulares e, quem sabe, aplicar políticas como a de Nova Iorque, de tolerância zero contra o crime (obs.: não devemos nos esquecer que a renda, a escolaridade e outros benefícios também devem ser melhorados entre os policiais e que deve ser integrada e totalmente informatizada a ação das policias brasileiras e das guardas municipais).
A questão social depreende investimentos que permitam melhorar a
educação, a saúde, a habitação,... Somente com a superação das
mazelas sociais é que a segurança pública poderá melhorar...
As mais importantes medidas são, porém, aquelas que têm que ser realizados a longo prazo. Essas deveriam, inclusive, constar dos projetos de governo dos postulantes à presidência da república nos próximos quatro anos.
Referem-se à mudanças que têm como foco não mais a segurança, mas a questão social. Afinal de contas, como dizem na gíria, “o buraco é mais embaixo” e não adianta tentar “tapar o sol com a peneira”. As questões de segurança pública decorrem da falta de empregos, da educação deficiente oferecida pelo poder público, da alta carga tributária que sufoca o setor produtivo da economia, dos deteriorados serviços de saúde oferecidos à população,...
Reformas emperradas no Congresso como a judiciária ou a fiscal; disputas políticas que se travam em prol do interesse mesquinho de partidos ou pessoas; desvio de verbas públicas; super faturamento de obras e projetos; corrupção de agentes públicos e falta de investimentos em setores vitais da economia também têm que se tornar prioridades nacionais e levar a mobilização da população por um Brasil melhor e, consequentemente, mais seguro...
O Brasil só tem uma opção que é mudar e para melhor. Essas transformações não podem ser aguardadas, devem acontecer a partir da manifestação desse desejo e necessidade a partir da própria população. Não podemos esperar que os governos tomem as medidas imprescindíveis ao resgate da dignidade do brasileiro. Temos que fazer a nossa parte para que as lições do pesadelo nos levem a um futuro muito melhor.