Filosofando
Sobre mestres e professores
Georges Gusdorf
O mestre é aquele que ultrapassou a concepção de uma verdade como fórmula universal, solução e resolução do ser humano, para se elevar à idéia de uma verdade como procura.
O mestre não possui a verdade e não admite que alguém possa possuir. Faz-lhe horror o espírito de proprietário do pedagogo, e a sua segurança na vida.
O obscurantismo pedagógico procura asilo e refúgio na tecnicidade. Ele aborda os problemas do ensino através da particularidade das faculdades humanas, propondo-se educar a atenção, a memória, a imaginação, ou pela descrição das especialidades didáticas, propondo-se então a tarefa de facilitar a aprendizagem do cálculo, do latim ou da ortografia.
O pedagogo transforma a sua classe numa oficina que trabalha com vista a um rendimento; ele mantém a sua boa consciência à custa de gráficos e de estatísticas sabiamente dosadas e cheias de promessas.
No seu universo milimetrado, faz figura aos seus próprios olhos de feiticeiro laico e obrigatório, manipulador de inteligência sem rosto.
O mestre autêntico é aquele que nunca esquece, qualquer que seja a especialidade ensinada, que é da verdade que se trata. Há programas, bem entendido, e atividades especializadas.
É mister, tanto quanto é possível, respeitar os programas. Mas as verdades particulares repartidas através dos programas não são senão aplicações e figurações de uma verdade de conjunto, que é uma verdade humana, a verdade do homem para o homem.
A cultura não é outra coisa senão a tomada da consciência, por cada indivíduo, dessa verdade que fará dele um homem.
O pedagogo assegura o melhor possível ensinamentos diversos; reparte conhecimentos. O mestre quer ser antes de tudo um iniciador da cultura. A verdade é para cada um o sentido da sua situação.
A partir da sua própria situação em relação à verdade o mestre tenta despertar os seus alunos para a consciência da verdade particular de cada um.
Georges Gusdorf. Professores para quê? (1970)