Cinema na Educação
Hotel Ruanda
O Schindler africano
É inevitável que ao assistir Hotel Ruanda façamos uma comparação com o premiado e cultuado filme A Lista de Schindler, do diretor Steven Spielberg. Há evidentes pontos de encontro especialmente no que se refere aos personagens principais e ao clima de catástrofe reinante nos países em que acontece a ação. O que também impressiona muito aos espectadores é saber que as histórias apresentadas nas telas são reais e que o todo aquele sofrimento aconteceu...
Guardadas as devidas proporções históricas, há um outro pormenor que pode ser percebido pelo público. Trata-se da forma diferenciada como os dramas da vida real foram tratados pela mídia internacional e pelos governantes dos países mais ricos do mundo. Na 2ª Guerra Mundial, ainda que de forma tardia, os países foram entrando no conflito e se posicionando contra a tirania e as violências praticadas pelos nazistas.
Mobilizados pelo poder econômico da comunidade judaica do mundo todo, os principais órgãos noticiosos do planeta foram informando a população mundial das atrocidades de guerra cometidas pelos seguidores de Adolf Hitler. Após o cessar fogo e os tratados de paz, a memória do holocausto foi sendo recuperada e se tornou tema de museus, estudos, pesquisas, livros, filmes,...
O massacre da população de Ruanda, um pobre país exportador de chá e café, localizado na região central do continente africano, ex-colônia da Bélgica, não foi capaz de movimentar a imprensa internacional. Calcula-se que aproximadamente um milhão de pessoas tenha morrido na guerra civil que abateu o país em 1994 e praticamente nada a respeito do assunto foi divulgado para os países do Ocidente.
O descaso foi tão grande em relação a Ruanda que as tropas de paz da ONU (Organização das Nações Unidas) foram retiradas do país e recomendou-se que não interviessem nos embates entre hutus e tutsis (as etnias locais que disputavam o controle político do país).
A diferença quanto ao interesse internacional em relação aos dois acontecimentos também fica evidenciada pela repercussão quanto aos dois filmes. O investimento, a divulgação, a quantidade de salas de cinema, os números relativos ao lançamento do filme em vídeo e DVD, as vendas de ingressos e cópias da produção de Spielberg foram gigantescas quando comparadas com os resultados obtidos por Hotel Ruanda.
Isso não quer dizer que um filme seja necessariamente melhor do que outro. Tanto é assim que o reconhecimento por parte do público e da crítica foi ótimo em ambos os casos. Isso nos permite afirmar, com certeza, que Hotel Ruanda, do diretor Terry George, é uma daquelas pequenas e muito brilhantes pérolas que ocasionalmente são lançadas pelo cinema.
Trata-se de um filme de grandes qualidades e que, entre todas elas, tem como seu maior trunfo levar o grande público a refletir sobre as desgraças que afligem o continente africano e a verdadeiramente se sensibilizar e mobilizar-se em favor de maior justiça, paz e harmonia no mundo em que vivemos.
O Filme
Paul Rusesabagina (Don Cheadle, indicado ao Oscar pelo papel) é gerente do hotel Milles Collines em Ruanda. Esse estabelecimento recebe hóspedes do mundo todo e é muito conceituado pela qualidade de seus serviços e acomodações. Trata-se, evidentemente, de um hotel de luxo. Apesar de trabalhar nesse ambiente rico e privilegiado e também de ter uma vida confortável numa casa de bom padrão, Paul vive num país a beira do caos, uma autêntica bomba relógio prestes a explodir...
Seu país é uma ex-colônia belga dividida entre duas etnias, os hutus e os tutsis. Avesso aos problemas políticos, Paul é uma pessoa muito bem informada quanto às pendências e disputas por trabalhar num dos locais onde se reúnem autoridades locais e internacionais que discutem o futuro de Ruanda. Pelos corredores de seu hotel circulam diplomatas, políticos, generais, representantes das Nações Unidas, investidores estrangeiros e turistas.
O hotel Milles Collines, em virtude de sua importante clientela internacional, torna-se então um local relativamente protegido contra os abusos e violências praticados na guerra. Quando estoura o conflito muitas pessoas (tanto da população local quanto estrangeiros que estão no país) buscam refúgio no estabelecimento gerenciado por Rusesabagina.
É nesse momento que se revela a grande história que movimenta o filme e que sensibiliza os espectadores, Paul recebe os refugiados e se torna protetor de todos aqueles que estão escondidos no Milles Collines, inclusive sua mulher e filhos.
Hotel Ruanda é um filme que tem como temática central a humanidade de seu personagem principal. Paul Rusesabagina é um daqueles anônimos heróis do cotidiano que, a despeito de qualquer glória que possam atingir, age movido pelo coração e pela fé apesar do medo e das ameaças que sofre. Numa atmosfera em que a morte ronda a todos (há milhares de corpos de vítimas inocentes jogados pelas ruas e rios da região), era preciso ter muita coragem e dignidade para enfrentar as hostilidades e é nesse quesito que a história contada em Hotel Ruanda conquista espectadores no mundo inteiro...
Para Refletir
1- Em uma das cenas mais importantes do filme Hotel Ruanda, o jornalista Jack Daglish (interpretado por Joaquin Phoenix) volta das ruas com fortes imagens do horror da guerra. Inúmeros mortos espalhados pelo chão enquanto as violentas ações continuam aparecem nas filmagens mostradas pelo repórter ao chefe de sua equipe e são também vistas por Paul Rusesabagina. Preocupado com a reação do gerente do hotel, Daglish se desculpa e Paul responde que acha importante que a comunidade internacional saiba dos acontecimentos em Ruanda para que se mobilize. A resposta do jornalista é então sintomática quanto à repercussão desses ocorridos quando ele diz que as pessoas verão isso enquanto jantam, se sentirão sensibilizadas e, depois de alguns segundos de indignação, retornarão as suas refeições... De que forma podemos superar essa tão evidente indiferença? O que pode ser feito para que não fiquemos apenas pasmos com os acontecimentos e imobilizados em nossas ações? Conversem com seus alunos. Discutam o tema. Busquem respostas em enquetes através da Internet ou entrevistas. Leiam sobre o assunto. Algo tem que ser feito em situações como essa...
2- A África é um continente esquecido e abandonado, em especial os países que não dispõem de petróleo, ouro, diamantes ou outros produtos de grande interesse comercial. Destruída por guerras em certas regiões, padecendo com epidemias de grandes proporções (como a Aids), sofrendo com as guerras pelo poder e a ambição desmedida de líderes corruptos e despóticos, o berço da humanidade foi deixado a sua própria sorte, sem amparo e projetos de recuperação por parte da comunidade internacional. Seria interessante propor um grande projeto de pesquisa sobre a África que levasse os estudantes a entrar em contato com embaixadas, trocar informações pela Internet com pessoas de nações africanas, levantar dados pela rede mundial de computadores, buscar livros sobre o tema, assistir outros filmes,...
3- O humanitarismo percebido nas ações de Paul Rusesabagina não pode ser desprezado como tema a ser trabalhado em aulas e debates sobre o filme. Carecemos de mais exemplos de solidariedade, dignidade, coragem e ética. Vivemos num mundo onde os escândalos parecem prevalecer, a corrupção endêmica tomou conta de vários países (até mesmo do nosso), a violência grassa vidas sem que os outros se sensibilizem e a desonestidade é a regra e não a exceção. Trabalhar valores, respeito e despertar os jovens para uma vida mais engajada em favor da justiça e da harmonia no mundo é tarefa urgente e importantíssima da escola e da sociedade.
Ficha Técnica
Hotel Ruanda
Título Original: Hotel Rwanda
País/Ano de produção: EUA/Itália/África do Sul, 2004
Duração/Gênero: 121 min., Drama
Direção de Terry George
Roteiro de Keir Pearson e Terry George
Elenco: Don Cheadle, Desmond Dube, Hakeem Kae-Kazim,
Tony Kgoroge, Neil McCarthy, Nick Nolte, Sophie Okonedo,
Joachin Phoenix, Fana Mokoeda.
Links
-http://www.adorocinema.com/filmes/hotel-ruanda/hotel-ruanda.asp
- http://epipoca.uol.com.br/filmes_detalhes.php?idf=10432
- http://www.cineclick.com.br/criticas/index_texto.php?id_critica=9071