Planeta Educação - Desde quando você está na área de esportes?
Esporte e Luta, Arte marcial? Eu nasci em 1963 e fui criado no Leblon no Rio de Janeiro, em frente à praia, numa família de classe média. Minha mãe ficou muito doente quando eu ainda era muito novo, meu pai trabalhava em São Paulo, no Jornal “O Estado de São Paulo”.
Planeta Educação - Ele era Jornalista?
Meu pai foi diretor do Estadão. Dá aulas em duas Universidades nos Estados Unidos, e é correspondente de vários locais.
Planeta Educação - Qual o nome dele?
Luis Carlos Lisboa. Ele é da Academia Paulista de Letras. Então, o que acontecia é que meu pai trabalhava em São Paulo e minha mãe era doente, eu e meu irmão éramos criados por empregadas, ou uma Freira (minha vó era muito religiosa) contratada para cuidar da gente, absolutamente não a obedecíamos. Vivíamos na praia. Morava no primeiro quarteirão da praia. O esporte para nós surgiu até como uma alternativa ao clima de casa que não era muito bom. Minha mãe sofreu de depressão. Era um laboratório de doenças e remédios. Então, eu e meu irmão íamos para a rua. E rua era sinônimo de... Skate, Surf, bicicleta, futebol, pipa e todo o tipo de atividade que as crianças gostam. E lá para os meus... doze anos conheci o Reyson Graice que tinha uma academia no Shopping da Gávea. Tinha o Paulo Mauricio, outro professor que dava aulas lá, e aí eu pedi para o meu pai se ele pagaria uma aula por semana, porque o Jiu-Jitsu sempre foi um esporte caro no Rio de Janeiro e no mundo. Uma vez por semana o meu pai pagava. Um desses professores que dava aula para o Reyson Graice acabou me levando para a Academia do Osvaldo Alves, que era uma academia muito mais barata e que eu podia treinar todos os dias e que ficava a uma hora e meia de ônibus da minha casa. Não havia a violência que há hoje. E lá, eu comecei treinar todos os dias, de terça e quinta. Depois de alguns anos o Osvaldo instituiu uma coisa que foi novidade no Jiu-Jitsu, a aula feminina, para mulheres.
Planeta Educação – Então o Jiu-Jitsu feminino já existe há muito tempo?
E a melhor equipe que houve no Brasil foi do Osvaldo Alves, meu professor.
Eram grandes campeãs.
Planeta Educação - Você fez Faculdade de Direito?
Entrei na Faculdade de Direito e depois estagiei no Centro do Rio de Janeiro. Eu terminava o estágio às seis horas, pegava um ônibus no centro, naquele verão de 40º e ia até a academia no Leme – Copacabana. Treinava até as 10 horas e dormia as 11h30 e não me queixava da distância que percorria. E quando vejo hoje o pessoal reclamando que o Jiu-Jitsu é em outro bairro, que vai levar quinze minutos de bicicleta, ou dez de carro, eu fico pensando nas quatro ou cinco horas que todo dia enfrentava de ônibus para treinar. E era uma academia mínima, que concentrava uns trinta faixa preta, quarenta marrons, então, o espaço era disputado, você esperava a sua vez ansiosamente para treinar, e todo mundo dava palpite, todo mundo te ensinava, você observava as lutas era um ambiente muito legal, muito rico, assim, da Arte Marcial e da amizade. Treinei cinco anos, e me formei em faixa preta, aos dezoito anos.
“Eu e meu irmão íamos para a rua.
E rua era sinônimo de...
Skate, Surf, bicicleta, futebol,
pipa e todo
o tipo de atividade
que
as crianças gostam.”
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Planeta Educação - Com dezoito anos você pegou a faixa preta no Jiu-Jitsu?
Faz tempo né? (risos) E agora, por que eu peguei a faixa preta? Por que eu tive energia para o Jiu-Jitsu? Você sempre tem um motivo, as coisas não são assim tão sem sentido como imaginamos. Eu e o meu irmão éramos criados na rua. E rua para as crianças e para os jovens é selvageria. Meu irmão era muito magro e comprido, logo entrou para o Karatê, depois para o Jiu-Jitsu e depois finalmente me levou também. Ele acabou se tornando faixa preta de Karatê e Jiu-Jitsu, que era uma forma de nós sobrevivermos à violência juvenil da rua.
Fui muito amigo de vários atletas, o Renzo Graice que atualmente dá aulas em Nova York, Willian Grace. O Rolls Graice foi talvez, o melhor lutador de Jiu-Jitsu de todos os tempos, e morreu em um acidente de Asa Delta ao meu lado. Ele era o grande nome do Jiu-Jitsu, e ensinava um primo que veio a se tornar o número um no mundo, o Rickson Graice, grande Samurai que perdeu um filho recentemente em Nova York. O filho dele era um lutador, acabou virando modelo, foi para Nova York, e acabou sendo encontrado morto num quarto de hotel por overdose de Cocaína. Então, quer dizer que a droga sempre foi a sombra do esporte, e talvez o desequilíbrio na nossa vida. Passado dez anos, após eu ter pego a faixa preta, eu já trabalhava, era Gerente de Banco, Funcionário Público e resolvi fazer concurso para Advogado. Passei no Espírito Santo e depois em São Paulo. Vim pra Caçapava, dei aula e depois comecei em São José dos Campos. Formei os meus primeiros faixas pretas, Erivaldo Junior, o Juninho, o Gustavo Machado Pinto, Guga que está na Austrália, e o Flávio Ganbin. Posteriormente a Polyana Lago que já era Tricampeã Mundial, pegou a faixa preta e esse ano vai disputar o primeiro Campeonato Mundial com a faixa preta.
Sergio acompanha de perto e dá instruções aos atletas no tatame
Planeta Educação - Sua carreira no esporte é acadêmica. Você não participou de Campeonatos?
Eu sempre fui atleta competidor. Dar aula foi uma conseqüência depois que eu vim para São Paulo, exatamente por não ter com quem treinar. A minha idéia era uma só. Eu quero preparar o campo para daqui a uns anos eu ter com quem treinar. Então comecei a dar aulas na verdade com pensamento relativamente egoísta, mas para ter treino para mim, para eu continuar em contato com o esporte que eu gostava. Sempre pratiquei outros esportes, Vôo Livre e Surf. Fui Campeão do Rio de Janeiro de Surf. Nos finais de semana, hoje em dia, pratico o vôo livre, é uma paixão, não consigo ficar sem voar. Um dia bonito como este, que não tenha nuvens, eu imediatamente me imagino naquela nuvem... Os esportes que ficaram para mim definitivamente foram o Surf, o Jiu-Jitsu e o Vôo-Livre. Você perguntou de Campeonato?!
“A droga sempre foi a sombra do esporte, e talvez o desequilíbrio na nossa vida.”
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Planeta Educação - Isso...
Naquela época o Jiu-Jitsu no Brasil e no mundo se restringia somente ao Rio de Janeiro. Então, só existia Campeonato Brasileiro, com os atletas do Rio, eventualmente de Manaus que era a segunda potência. Eu lutei desde a faixa branca até a faixa preta tendo sido campeão em alguns campeonatos em todas as faixas. O último foi o Campeonato do Rio-Sul, que foi no Rio de Janeiro, e eu fui Campeão. É...lutei cinco lutas, inclusive com atletas daquela mesma academia e no outro campeonato eu fiquei em segundo lugar.
Planeta Educação - Cada vez mais o esporte vem revolucionando as escolas no país. Qual seria a importância do esporte na educação das crianças?
Hoje em dia se encara a obesidade, uma vida sem atividade física como doença, já se entendeu isso finalmente. O esporte dá saúde, oxigenação ao cérebro, dá talvez uma canalização para a energia dos jovens, das crianças, dos adolescentes que ficam no corpo sem serem canalizadas, e por isso às vezes leva para caminhos não tão bons. O esporte é saudável, emagrece, nos dá as endorfinas que são substancias que nos dão prazer, que são totalmente naturais. E a pessoa quando se habitua ao esporte nunca mais pára, exatamente porque ela se acostuma à sensação prazerosa. O esporte faz com que a gente se esqueça um pouco da comida, da preguiça e de outras coisas. Isso sem dúvida ajuda no estudo, na formação, na saúde e outras coisas mais.
Planeta Educação - Então, a criança hoje que pratica esporte tem um nível de aprendizado mais elevado?
Desde o momento que essa criança tenha mais saúde, ela tem mais capacidade de aprender, ela tem capacidade de entender, ela tem mais capacidade inclusive de se relacionar.
Planeta Educação - A Arte Marcial em especial o Jiu-Jitsu, pode ser classificado como um Esporte Radical?
Eu não classificaria a arte marcial como um esporte radical, aliás, eu não classificaria a luta como uma Arte Marcial, ela na verdade não é uma Arte da Guerra, ela é uma arte de extrema disciplina. Tudo isso pode ser adquirido através dessa atividade, dessa educação, desse condicionamento, mas não visa essa disciplina militar e também não é um esporte radical porque pode ser feita totalmente dentro de um controle que não vai expor a pessoa a risco algum. Na verdade é uma atividade como qualquer outra em que dá autoconfiança, que dá segurança e equilíbrio psicológico.
Polyana Lago, faixa preta de Jiu-Jitsu imobiliza Sergio no treino
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Planeta Educação - No inicio da nossa conversa você falou que entrar no Jiu-Jitsu foi uma forma de você se defender das brigas de rua que aconteciam na sua adolescência e que hoje, infelizmente, ainda acontecem. Você acha que os jovens e crianças de hoje também utilizam desse recurso?
Olha, eu não diria que a pessoa entra para brigar na rua, é uma forma infantil de se pensar. O ensinamento da luta, da arte marcial não é somente técnica. Eu acho que existe um ensinamento todo espiritual, preparatório pra vida e como nós vamos reagir aos problemas da vida, as questões da vida. Se a pessoa se tornar violenta não é por causa da arte marcial, ela já carrega em si essa semente da violência. Agora com relação à pessoa procurar a luta por algum motivo, cada um têm os seus. Eu gosto muito de ler, e o que me levou a ler foi uma curiosidade. Eu me segurei na luta porque eu precisava de certa forma me defender. Muitas pessoas seguiram porque gostam de ganhar campeonatos, outras permanecem porque se sentem bem, mas de certa forma, a persistência tem sempre algo haver com o nosso ego. É alguma coisa que fala a nós e que nos estimula, nos incentiva. A natureza cria muitos artifícios para nos levar onde ela quer.
“O esporte dá saúde, oxigenação ao cérebro, dá talvez uma canalização para a energia dos jovens, das crianças, dos adolescentes que ficam no corpo sem serem canalizadas, e por isso às vezes leva para caminhos não tão bons.”
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Planeta Educação - Hoje a mídia está colocando muito em evidência o mau uso dos anabolizantes. A utilização desse recurso para crescer músculo e para ficar mais forte. O que você pensa sobre isso?
Os anabolizantes e os esteróides foram criados para casos graves de anemias, pós traumáticos e pós operatórios, têm utilidades assim como as drogas. A morfina é usada para tirar a dor, o que faz mal é o desvirtuamento desse fim. Para a pessoa que está se recuperando de uma cirurgia grave, fez uma quimioterapia e precisa tomar anabolizantes, essa droga é um santo remédio. Agora, a pessoa que não precisa e toma aquilo diariamente para ter um ganho de massa muscular, para ter uma beleza de estética maior, para evitar sei lá o que, mulher que toma para evitar celulite, para diminuir o percentual de gordura, estão se vendendo, entregando a sua saúde em nome de sua mente e vaidade.
Planeta Educação - Existe um percurso para o atleta chegar às faixas? O que ele precisa fazer?
O Jiu-Jitsu para adulto tem poucas faixas, branca, azul, roxa, marrom e preta. Se você me perguntar o que precisa para alguém chegar na faixa preta seria só uma coisa, gostar do caminho, gostar de treinar. A gente quando entra em alguma coisa visando apenas o fim é porque o caminho não é prazeroso para nós, o caminho não é bom, e se o caminho não é bom nós não vamos agüentar treinar oito, dez anos para chegar a faixa preta, então, precisa que se goste de treinar. A pessoa gostando do que faz não importa se vai chegar à faixa preta, ou não, a faixa preta é a conseqüência. Termina na faixa. As faixas vão seguir e as cores não têm a menor importância. O importante é gostar de treinar e o que você sabe, o resto é título, é apenas vaidade, nada mais.
Jiu-Jitsu Feminino, o “rola”
Planeta Educação - Além do treino diário, de duas vezes por semana, o atleta necessita de um outro preparo? O que ele precisa exatamente para continuar esse percurso?
Um atleta que vive da competição precisa do que todo atleta competitivo necessita. Uma dieta saudável, dormir bem, se alimentar, nada além disso.
Planeta Educação - Podemos adequar algumas disciplinas do cotidiano da criança e do adolescente na prática do Jiu-Jitsu?
Mais saúde e autoconfiança que são muito importantes. Uma auto-imagem positiva para se sentir seguro e se desenvolver em outros caminhos e quanto a postura.
Planeta Educação – Como são ministradas suas aulas?
Consistem basicamente em aquecimento, breve alongamento, posições técnicas, treino prático de luta e algumas conversas.
Planeta Educação - Que tipo de aluno você tem? E quem são esses alunos?
Crianças entre 8 e 10 anos, meu filho e alguns amigos do colégio, jovens, muito jovens, adultos homens e mulheres. São pessoas que gostam do esporte, gostam, querem aprender a se defender, estão ali pela amizade, pelo companheirismo. É um clima muito bom.
“A pessoa gostando do que faz não importa se vai chegar à faixa preta, ou não, a faixa preta é a conseqüência.”
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Planeta Educação - E existem também aqueles com uma profissão formada?
Eu diria que 90% são pessoas que tem uma profissão. São médicos, advogados, comerciantes, empresários, pessoas a procura de emprego, estudantes, todos os tipos de pessoas. Ninguém está ali para viver de Jiu-Jitsu. Eventualmente acontece como é o caso Juninho que vive hoje para dar aula, e o Guga que apesar de formado em Direito está na Austrália, está vivendo de preparação física e de dar aulas de defesa pessoal e Jiu-Jitsu.
Planeta Educação - E existe uma idade adequada para o inicio da prática desse esporte?
O Jiu-Jitsu não é um esporte para se começar muito cedo até porque, aprender golpes é preciso que a criança tenha uma boa estrutura. Porém, a criança tendo uma boa estrutura, um bom alicerce, pode começar cedo, mas elas têm sempre que tomar cuidado para não se machucarem em treinos e para não utilizarem estrangulamentos, chaves que podem quebrar juntas em outras crianças, então, é importante esse ensinamento da não violência apenas da auto defesa e dentro dos limites da moderação.
Sergio na prática com a aluna Polyana Lago
Planeta Educação - Você poderia falar uma idade adequada em números?
12 anos.
Planeta Educação - Quais as competências que os atletas devem adquirir ao chegar no último estágio, no caso da faixa preta?
A faixa preta é uma analise que o professor vem fazendo o tempo todo, na verdade não existem regras exatas para chegar à faixa preta. Avalio o caráter, a lealdade, o companheirismo, se o atleta não é uma pessoa agressiva, se isso não será usado para a violência. Na verdade canalizamos não só a vida da pessoa dentro do tatame, mas a vida fora, a relação dela com o mundo, com a família. É lógico que todos nós temos problemas, mas a forma com que enfrentamos e reagimos é que demonstra quem somos.
Planeta Educação - E como você classifica o esporte, a arte marcial, o Jiu-Jitsu no Brasil?
É um Esporte em crescimento, o Brasil é líder Mundial no Jiu-Jitsu. Os campeões mundiais são maciçamente brasileiros. Ressurgiu no Brasil, por este motivo o país também lidera os campeonatos de Vale Tudo, inclusive o que estão ocorrendo lá fora. Os brasileiros sem dúvida gostam de luta, ação, esporte e o Jiu-Jitsu. Não é mais só o Futebol, se destaca também pelo combate. É interessante!
“O Jiu-Jitsu não é um esporte para se começar muito cedo até porque, aprender golpes é preciso que a criança tenha uma boa estrutura.”
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Planeta Educação - Qual a sua maior paixão?
Na verdade eu não tenho nenhuma maior paixão. A minha vida é uma mistura de muitas coisas, e essas coisas é que são a paixão da minha vida, então, se você se refere a esporte, Surf, Jiu-Jitsu, Alpinismo, Vôo Livre, eu tenho curiosidade e gosto. Quem gosta de esporte gosta de tudo, gosta de vida ao ar livre, gosta do dia. É lógico que têm outras paixões na minha vida, o hábito da leitura, acabei tomando gosto por poesia, por autores portugueses, depois de alguns autores brasileiros, literatura universal, muitas coisas, livros clássicos e hoje em dia tenho lido tudo. Eu só durmo depois de ler, essa talvez seja uma paixão...Leitura. E outras paixões que fazem um mesclado geral.
Planeta Educação - Existe algum sonho já realizado e algum que você ainda vá realizar ?
Nenhum, eu acho que... sei lá. Não tenho sonho nenhum eu apenas vivo. Vivo satisfeito e atento ao imediato, só isso. Gosto do que faço e vou fazendo enquanto me der prazer, o momento que não der prazer eu deixo de fazer.
“Os brasileiros sem dúvida gostam de luta, ação, esporte e o Jiu-Jitsu. Não é mais só o Futebol, se destaca também pelo combate.”
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Hoje quem quiser fazer uma aula de Jiu-Jitsu para conhecer pode procurar o Professor Sérgio Lisboa na:
Academia AKTIV Fitness - Rua Enseada, 230 - Jardim Satélite - Tel: (12) 3933-4520 ou no Clube de Campo Santa Rita - Av. Lineu de Moura - s/n - Tel: (12) 3949-1444 em São José dos Campos.
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