Planeta Educação

Filosofando

João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

A Teoria Crítica de Adorno e a Educação
João Luís de Almeida Machado

como Jurgen Habermas, Max Horkheimer, Erich Fromm e Herbert MarcuseE

O filósofo e sociólogo alemão Theodor Adorno (1903-1969) foi um dos iniciadores da Escola de Frankfurt, movimento que trazia em seu cerne a proposta de uma formação de cunho humanista que proporcionasse as pessoas o desenvolvimento de uma consciência crítica.

As bases do trabalho da Escola de Frankfurt, que além de Adorno contou ainda com a participação de outros notáveis pensadores, como Jurgen Habermas, Max Horkheimer, Erich Fromm e Herbert Marcuse, fundamentou seu pensamento nos princípios da ideologia marxista, ainda que fossem críticos quanto aos rumos do socialismo no mundo, colocado em prática pelos partidos comunistas ortodoxos, como na União Soviética de Josef Stálin.

Estavam, igualmente, atentos ao fato de que o capitalismo se desenvolvia de modo diferenciado daquilo que havia sido previsto por Karl Marx. Tendo em vista a complexidade do mundo em que viviam, não se limitaram a pautar seu pensamento e produção somente na obra de Marx, indo além de suas proposições e buscando subsídios em outras produções filosóficas, como nas obras de Kant, Hegel, Freud, Lukács e Max Weber. Também se dispuseram a adicionar aos seus estudos o pensamento psicanalítico, a sociologia antipositivista e a filosofia existencialista.

No que se refere especificamente a educação, Theodor Adorno amplia seu raio de visão, para além da sala de aula e da própria escola, iniciando suas abordagens com foco na chamada indústria cultural que, segundo ele, tolhia a capacidade das pessoas de atuar de forma autônoma e altiva.

Este assunto aparece em destaque em 1947, em sua obra “A dialética do Esclarecimento”, produzida com seu colega da Escola de Frankfurt, Max Horkheimer. De acordo com Adorno e Horkheimer, o mundo materialista, no qual tudo se torna objeto de consumo, passível de venda e comercialização, transforma também a produção e os bens culturais em mercadorias e os banaliza, atingindo em cheio a própria consciência humana.

Este fenômeno foi identificado pelos pensadores como semiformação. Neste sentido, o conceito define que a humanidade, inserida num contexto consumista, no qual o afã da compra e venda se estabelece até mesmo nos elementos culturais, lega aos homens a alienação, ou seja, retira dos mesmos a sua condição de autonomia não apenas em relação ao produto do seu trabalho, conforme preconizado pelo marxismo, mas de sua própria consciência, existência e do sentido da vida, tornando-o passivo e submetidos aos padrões sociais a eles impingidos pelo sistema, conforme podemos perceber no trecho abaixo, extraído de sua obra:


“Para ele [o homem semiformado] todas as palavras se convertem num sistema alucinatório, na tentativa de tomar posse pelo espírito de tudo aquilo que sua experiência não alcança, de dar arbitrariamente um sentido ao mundo que torna o homem sem sentido, mas ao mesmo tempo se transformam também na tentativa de difamar o espírito e a experiência de que está excluído, e de imputar-lhes a culpa, que, na verdade, é da sociedade que o excluí do espírito e da experiência.”(Theodor Adorno e Max Horkheimer em “A Dialética do Esclarecimento”, pág. 182)


Adorno percebe, então, que a educação, cujo propósito deveria ser elevar o homem a condição de pleno domínio e ciência do mundo em que vive por meio da experiência da aprendizagem e consequente construção do conhecimento utilizando de sua capacidade de pensamento e reflexão, não ocorrem de fato.

Segundo Adorno a educação deixou de ser o elemento que pode emancipar as pessoas para atuar a serviço da indústria cultural, com o uso da escola como elemento disseminador da semiformação, com o ensino e aprendizagem se tornando, também, mercadoria pedagógica e, com isso, ceifando qualquer possibilidade de que os formandos atinjam a necessária condição de livres pensadores, capazes de desenvolver pensamentos autônomos e viver de forma independente.

As escolas, neste sentido, são estabelecidas como parte de um sistema em que se cultua a massificação e o consumo. Os homens e mulheres formados nos sistemas escolares deixam de ter vontade própria e se submetem ao que estabelecem terceiros, como as corporações, os governos e o sistema como um todo. Ocorre, então, o fenômeno da heteronomia, que consiste justamente nesta sujeição dos indivíduos aos desígnios alheios.

Na prática, nas escolas, isso pode ser visto, por exemplo, quando o estudo com profundidade, analítico, buscando a leitura plena de mundo, no contato com as grandes obras produzidas pela humanidade, é deixado de lado e substituído pelo compromisso rápido, difuso, destinado a uma entrega cega, sem a devida compreensão e inserção do estudante no âmago da produção em estudo. Isso consiste, na leitura superficial, de trechos ou excertos previamente selecionados (Por quem? Porque? Para que?), para responder questionários repetitivos e, com isso, obter êxito escolar com a aprovação em provas e a obtenção de diplomas.

A teoria crítica de Adorno não se posiciona contra a educação pois compreende suas possibilidades e fins nobres, mas se posiciona contrariamente a massificação do ensino e aprendizagem que escravizam os homens neste contexto consumista em que até a cultura vira objeto de compra e venda, perdendo seu valor intrínseco, relacionado a estética, a beleza, a abstração, a criação e a inventividade humanas.

Neste sentido, o teórico alemão defendia em suas obras a proposta de uma educação de caráter humanista, que possibilitasse aos estudantes a capacidade de agir de forma crítica, consciente e autônoma a partir dos elementos oferecidos em seu processo educativo, no contato com o conhecimento, para que não viessem a se tornar meros joguetes a serem manipulados pelas forças dominantes do sistema.

Suas crenças caminhavam na direção de uma educação que deveria oferecer aos homens uma vida digna, em que a intolerância e os preconceitos não existissem, e sim o respeito as diferenças, sem que ninguém se sujeitasse, mesmo que inconscientemente, a alienação, a massificação e a qualquer de opressão, fossem elas evidentes ou ocultas, silenciosas e invisíveis a olho nu.

A educação, para Adorno, deveria ensejar os homens e mulheres, individual e coletivamente a se tornarem cultos, sábios, tendo acesso aos conhecimentos produzidos pela ciência e pelas artes, desenvolvendo todas as suas possibilidades e, se estabelecendo em sociedades democráticas e humanistas.


Referências

ADORNO, Theodor; HORKHEIMER, Max. Dialética do Esclarecimento. RJ: Jorge Zahar.

ADORNO, Theodor. Educação e Emancipação. RJ: Paz e Terra.

ADORNO, Theodor. Indústria Cultural e Sociedade. RJ: Paz e Terra.

ADORNO, Theodor. Teoria Estética. SP: Ed. 70.

ADORNO, Theodor; HORKHEIMER, Max. A falsa identidade do universal e do particular. In A Indústria Cultural: O iluminismo como mistificação das massas". Disponível em http://www.plannetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=596. Acesso em 27 mar 2018.



Leia também…

# A educação infantil no Brasil em números

# Os pais e as tecnologias educacionais


Avaliação deste Artigo: Matéria ainda não avaliada.