Filosofando
O desafio da criatividade e da originalidade
João Luís de Almeida Machado
Se uma varredura fosse feita na internet mundial em busca de trechos copiados e colados qual seria o percentual de réplicas de obras e trechos originais?
A postagem de trechos de textos originais copiados e colados por tantas outras pessoas na rede mundial de computadores por vezes apaga a origem da autoria ou dificulta sua identificação. Como descobrir quem de fato escreveu algo e produziu uma ideia original?
Quanto se deixa de pagar em direitos autorais a escritores, pensadores, técnicos, cientistas, artistas e tantos outros profissionais pelo que produziram a partir do copiar e colar que se estabeleceu como prática em todo o mundo? Como isso afeta a continuidade de seus trabalhos?
A confecção e produção de um artigo não acontece somente ao longo das horas em que o escritor, acadêmico ou jornalista se senta à frente de seu computador e, com base em notas, leituras, pesquisas, entrevistas e demais dados coletados, escreve seu texto. Há um histórico por trás daquilo que se produz, que se concebe intelectualmente, que se traduz em palavras.
A produção de um texto começa muito antes no tempo. Volta lá atrás, quando o realizador deste material, ao longo de sua vida, se especializa, coleta dados relacionados ao seu contexto, convive com outras pessoas, frequenta aulas específicas, gasta horas e horas praticando em textos prévios, realiza levantamentos, viaja, vai a museus, observa fotos, prova alimentos, interage com a natureza... Começa em sua infância e se estende por toda a sua vida...
Escrever é o ato derradeiro em que o escritor coloca no papel não apenas as ideias mais imediatas, as informações específicas e gerais que compõem o raciocínio e o argumento ali apresentados, criando personagens e cenários ou trazendo elementos da vida real para que outras pessoas possam com ele compartilhar o que viu, pensou, criou, vivenciou, experimentou...
A produção humana fundamental é toda ela pautada nas diferentes e várias experiências vividas por cada um, passíveis de interpretação, racionalização e sensibilização nos conformes de cada indivíduo, apresentadas e compartilhadas por meio das diferentes formas de comunicar ideias criadas pela humanidade, seja por meio de textos, fotos, filmes, gravações em áudio, pinturas, esculturas, danças, documentos, tratados científicos ou como as pessoas entenderem possível e o quanto considerarem necessário socializar.
A originalidade é algo que se persegue, que se busca, seja nos meios artísticos ou nos acadêmicos, na esfera econômica, política ou social. É inerente ao ser humano a criação. Mas criar e ser original demandam tempo, estudo, foco, disciplina e determinação. Não é possível criar sem investir e, neste caso, não me refiro somente a dinheiro.
O advento das novas tecnologias de informação e comunicação permitiram a humanidade o acesso a um enorme, bilionário acervo de informações de toda natureza. Hoje o acesso é rápido e fácil a documentos e produções de todo o mundo, seja nas especialidades mais concorridas ou em nichos, por mais fechados que sejam.
Assim como há o ensejo a criação humana, há também a ação encurtada, relacionada a reprodução de material ou pensamento alheio sem que os devidos créditos sejam reconhecidos, a apropriação indevida, o plágio e, mais especificamente, em virtude do mundo conectado em que vivemos, o copiar e colar.
É possível se basear em ideias prévias, apoiar-se em pesquisas e pensamentos alheios, citar e mencionar com os devidos créditos outros autores e, com isso validar trabalhos originais. Isso acontece todo o tempo. Não precisamos recriar a roda, reinventar ideias e recursos, elaborar novas teorias e universos, porém, o que não pode e nem deve acontecer é a replicação de ideias e conceitos, projetos e iniciativas, sem o reconhecimento de autoria, como forma de apropriação daquilo que é produzido por outrem.
Em escolas e universidades, no reino da educação, campo de estímulo e sagração do pensamento original pautado no exame, estudo, compreensão e apropriação daquilo que a humanidade produz há séculos, apesar da orientação e proposição pelos educadores da busca pela produção própria, referenciada e valorizada pela individualidade e pelas experiências únicas vividas por cada um dos seres humanos que passam pelo planeta, os estudantes cada vez mais se utilizam de expedientes de plágio, utilizando o copiar e colar como ferramenta através da qual cometem crime não apenas contra a autoria e a originalidade, mas contra eles mesmos, ao não se propor o desafio de sua própria realização.
Leonardo Da Vinci, considerado por muitos como o maior realizador humano, capaz de criar técnicas e produções em diferentes áreas do conhecimento com incrível maestria, em suas anotações, que eram uma constante, instigava os jovens a observar atentamente o mundo ao seu redor, a fazer anotações constantemente, a explorar e tentar novas ações. Inovação e originalidade, criação e mérito, são decorrentes deste grande e permanente esforço.
William Shakespeare era, como Da Vinci, alguém que estava constantemente atento as pessoas, aos movimentos ao seu redor, as especificidades do ser humano no tocante as expressões, fala, gestual, estabelecimento de relações, sentimentos, ações e histórias. Somente assim é possível descrever de forma tão rica e única, como em suas obras, o ser humano e suas diferentes facetas.
Não há caminhos curtos para a originalidade e a criação. Por outro lado, se as práticas relacionadas ao copiar e colar representam atalhos para resultados mais imediatos que se buscam na concretização de tarefas e trabalho, são igualmente meios através dos quais se alcançam prejuízos notáveis para a formação mais ampla, seja a intelectual, a emocional ou, mesmo, relativamente a ética e ao caráter.
Num mundo em que a fraude é o que combatemos e queremos extirpar do cotidiano, seja aquela relacionada a corrupção no universo da política ou corporativo, num sentido mais amplo e pontual, ou os pequenos desvios de comportamento percebidos em nossas próprias crianças, quando agem de forma errada e temos que educa-las para o comportamento correto, se não formos capazes de agir nos limites da ética, sem a necessária coerência entre o pensar e o agir, de que forma iremos, de fato, melhorar o mundo ao nosso redor.
Não reduza o tamanho do erro de alguém que “copia e cola” ao simples ato de entrega de uma produção, na escola ou no trabalho, que não realizou. Há muitos prejuízos por trás daquilo que parece algo tão pequeno ou, mesmo, insignificante aos olhos de outros...
# Distribuição desigual de renda aumenta no Brasil e no mundo