Educação para o Pensar
O que estamos ensinando e aprendendo?
João Luís de Almeida Machado
Observe atentamente as questões apresentadas abaixo:
1 - Quais os afluentes da margem esquerda do Rio Amazonas?
2 - Resolva a equação a seguir: 2x² + 5x + 3 = 0
3 - O que foi o coronelismo?
4 - Descreva o processo da Fotossíntese.
É provável que você já tenha feito alguma avaliação na escola em que uma destas perguntas foi feita. Isso tanto pode ser verdade se você é um aluno que está na escola hoje quanto se frequentou salas de aula há algum tempo.
É igualmente muito provável que ao fazer provas em que estas questões (ou similares) foram realizadas você tenha estudado muito para se lembrar das informações necessárias para sua resolução. Assim como é possível que hoje não se lembre mais das respostas ou mesmo dos motivos pelos quais aprendeu estes saberes.
Pode ser que em um, ou outro caso, tendo em vista o professor com quem estudou tais conteúdos, você tenha aprendido, de fato, o significado das informações cobradas em tais provas, mas, em linhas gerais o aprendizado então lhe pareceu pouco significativo.
Atualmente, imagina você, uma rápida pesquisa no Google pode lhe permitir acesso a esta informação, se você dela precisar por algum motivo, é claro... E se ao invés destas questões as propostas encaminhadas a você e seus colegas, no intuito de estudar tais assuntos fossem realizadas de outra forma, por exemplo, através de projetos?
Imaginemos então que ao invés de memorizar nomes de rios da bacia amazônica a proposta trazida pelo seu professor de geografia fosse na direção de embarcar em rios da região para que fizessem um relato, a ser publicado em um jornal ou site, com fotos, sobre a vida dos ribeirinhos, a preservação dos rios locais, as perspectivas econômicas da região dentro de uma linha de atuação sustentável ou alguma proposta do gênero? E mais, que depois de todo o levantamento - que incluiria contato por internet com escolas dos estados banhados pelos rios amazônicos, busca de dados oficiais no site do IBGE (e afins), contato com autoridades públicas para obter fotos, mapas e outros recursos visuais, produção de infográficos, entrevistas com pessoas que vivem na região – os alunos tivessem que apresentar uma mostra com os dados obtidos para pais, alunos de outras turmas e comunidade em geral?
Será que o aprendizado seria mais efetivo?
As equações matemáticas, por seu lado, para que servem? Como lidar de um modo mais efetivo, interessante e estimulante com fórmulas, geometria, dados numéricos, estatísticas e outros elementos desta importante e rica linguagem? Que tal pensar e propor aproximações com a realidade, criar jogos e desafios matemáticos, propor a construção de games que usem os conhecimentos das diferentes matérias abordadas nas aulas de matemática, atuar em ações de empreendedorismo nas quais o uso cotidiano destes saberes seja uma realidade... Equações do segundo grau, por exemplo, poderiam ser usadas para a criação de games como Angry Birds ou similares, com foco em basquete (arremessos), balística, futebol (chutes a gol) ou algo do gênero.
Se formos pensar nas aplicações relativas ao conhecimento de conceitos históricos, filosóficos ou sociológicos, como na questão relativa ao Coronelismo, ao invés de propor leituras inócuas, sem aparente propósito, apenas com a finalidade de cumprir a programação dos livros e currículos educacionais, seria mais interessante partir de premissas reais, como a política brasileira atual, na qual expedientes semelhantes ainda são aplicados. Imagine então que seus alunos sejam desafiados a fazer uma pesquisa de campo, na qual tenham que coletar dados na rua, juntamente a população e, depois, indo a câmara de vereadores ou a prefeitura municipal para verificar o que o termo “coronelismo” significa. Antes disso, é claro, trechos de livros de literatura e artigos ou partes de filmes e documentários sobre o assunto já poderiam estar sendo usados para que os alunos fossem se informando sobre o tema, tirando dúvidas com o professor, criando um imaginário a respeito de assuntos correlatos como “currais eleitorais”, “eleitores fantasmas”, “votos de cabresto” e as decorrências de tudo isso no passado e hoje em dia.
No que se refere a ciência e seus ciclos, processos e fenômenos, como a Fotossíntese, a experimentação simples ou em laboratórios escolares tem efeitos duradouros para a imaginação dos estudantes e, devidamente registrado o procedimento, transformado em alguma ação que faça com que a informação não se restrinja a reprodução em cadernos ou avaliações, mas que seja compartilhada e compreendida como útil na vida de todos, proporciona uma outra leitura e resultado para a aprendizagem final da biologia, química e física.
A revisão do como se ensina é importante e, também, a releitura e adequação dos conteúdos escolares e de sua utilidade, interesse e estímulo no que tange aos alunos. Inserir novas ferramentas, em especial aquelas relacionadas à tecnologia, compõem o novo cenário educacional. Introduzir metodologias e práticas pedagógicas mais estimulantes é igualmente fundamental. É preciso, no entanto, pensar o que se ensina e a pertinência de tais saberes no currículo educacional. Rever, atualizar, inserir dentro de um novo contexto e linguagem, ensinando não mais como blocos estanques, mas como peças que se articulam, como um autêntico Lego em que a união de recursos permite a construção de algo que seja realmente útil, funcional, necessário e de valor para a vida das pessoas.
Não significa inserir mais conteúdos no currículo, mas repensar as propostas existentes para que componham saberes relacionados as verdadeiras necessidades das pessoas em sua busca de ferramentas e conhecimento que melhorem a qualidade de suas vidas, tanto no âmbito profissional quanto no pessoal. Ensinamentos relacionados as relações humanas, a qualidade de vida, ao empreendedorismo, a sustentabilidade, a ética, a utilização inteligente das tecnologias e outras questões pertinentes tem que surgir e andar lado a lado com práticas que estimulem a iniciativa, a ação propositiva, a curiosidade, a superação do senso comum, a ação com foco e metodologia científica...
Até mesmo a forma como as ações educativas são avaliadas precisam ser repensadas, fazendo com que o processo seja contínuo, validado por ações do cotidiano, personalizando a observação e não mais relegando a instrumentos de momento, pontuais, em que a memória é privilegiada...
Obs. Eu não me lembro mais dos afluentes da margem esquerda o Amazonas... E se precisar vou pesquisar, mas para que isso tenha algum sentido, seria importante relacionar isso a alguma ação de sustentabilidade ou educação na qual venha a estar envolvido...
# Investir na Primeira Infância: Passo decisivo para um futuro melhor