Cinema na Educação
Um amor à altura
João Luís de Almeida Machado
Vivemos num mundo em que a diversidade é a marca. Somos iguais e diferentes. A igualdade se refere ao fato da humanidade que nos aproxima e nos faz membros de uma mesma espécie. As diferenças, por outro lado, transparecem nas particularidades físicas, decorrentes da genética ou da etnia, nas bases culturais, na origem de cada um, no contexto em que vivemos, na geração a qual pertencemos e nas escolhas que fazemos ao longo de nossas existências, para o bem e para o mal.
Legalmente falando, ou seja, em termos jurídicos, a não ser que atentemos contra as leis vigentes ou, eventualmente, contra os hábitos e costumes dominantes numa determinada localidade, somos todos, a princípio, iguais. É evidente que, na realidade, fatores como poder, status, prestígio, reconhecimento público, notoriedade e dinheiro têm peso, infelizmente, na avaliação que fazem das pessoas, o que torna o conceito de “igualdade” bem desigual no cotidiano de todos. Os ricos, famosos e poderosos sempre parecem ter algum benefício ou vantagem imediata quando comparados com os meros mortais.
As diferenças, no entanto, em especial aquelas relacionadas as particularidades físicas, podem dificultar a existência cotidiana das pessoas. E não me refiro aqui, particularmente, as deficiências de nascença ou aquelas provenientes de algum tipo de acidente ao longo da vida. Aspectos corriqueiros, como aqueles relacionados a altura, ao peso ou mesmo aos traços e características que são herdadas da família, podem causar grandes embaraços e dificuldades.
Imaginem, por exemplo, o que significa para uma pessoa muito alta os problemas relacionados à habitação, vestuário ou transporte. Coisas corriqueiras como comprar uma cama ou andar de ônibus são mais difíceis se você tem mais de 2 metros de altura.
Pessoas obesas, com mais de 120 ou 130 quilos, por sua vez, precisam adquirir roupas em lojas especiais já que peças para eles não são correntes no catálogo das lojas que atendem o grande público. Andar de avião para estas pessoas é igualmente um sofrimento, tendo em vista que os assentos são criados para pessoas que pesem entre 50 e 100 quilos...
Sapatos para pessoas muito altas são igualmente difíceis de comprar pois os números se concentram naquilo que é mais regular entre as pessoas, por exemplo, entre os números 34 e 39 para as mulheres e 37 e 42 entre os homens, de acordo com o padrão vigente no Brasil. Experimente calçar 45 ou 46, se for homem, para ver como suas opções são muito reduzidas...
Estes são casos que, no cotidiano, verificamos várias vezes e que, são bastante embaraçosos para todos, em especial para quem apresenta tais características. Isso sem mencionarmos o fato de que estas pessoas são, tantas vezes, vítimas de brincadeiras de mau gosto, bullying ou mesmo discriminação explícita por suas características físicas.
No filme francês “Um amor à altura” (baseado no original argentino “Coração de Leão – O amor não tem tamanho”), do diretor Laurent Tirard, de forma leve, numa comédia romântica, examinamos uma situação a que poucos remetem no que tange as particularidades dos seres humanos. O enfoque é dado na relação entre uma mulher de altura mediana, dentro dos padrões europeus, e um homem que está bem abaixo da estatura padrão para franceses como ele. Ambos são bonitos e elegantes, mas a flagrante diferença de altura, com o homem sendo mais baixo, gera desconforto no relacionamento entre eles desde o primeiro encontro. Um filme que diverte, mas que, ao mesmo tempo, nos propõe pensar a situação, se colocar no lugar do outro, para que tentemos entender e respeitar a diversidade entre os semelhantes.
O filme
O telefone fixo toca e a jovem advogada Diane (Virginie Efira) atende. Do outro lado da linha uma voz masculina a informa que ela esqueceu seu celular no bar em que estava há pouco. Ele, o arquiteto Alexandre (Jean Dujardin), se prontifica a entregar para ela e marca um encontro no qual fará a devolução. Ele tem uma bela e sedutora voz, parece bem sedutor e divertido e isso, certamente faz com que ela se interesse em marcar este momento no qual irá receber seu aparelho de volta. Há mais do que uma devolução em jogo, sente-se a possibilidade de um romance surgir deste encontro casual.
O que ela não previa é que, na sorveteria em que irão se encontrar, irá se deparar com um belo e sedutor homem que tem apenas 1,36 metros de altura, ou seja, bem mais baixo que ela...
A cena inicial já demonstra o desconforto da moça em relação a seu acompanhante, mas ele é tão incisivo, confiante e deveras divertido que ela logo se propõe a acompanha-lo numa segunda parte deste encontro, que certamente será diferente de tudo o que já viveu e que a convencerá a encontra-lo em outras ocasiões.
O que, a princípio, é uma amizade, vai se tornando um romance, mas as situações a serem vividas por ambos irão gerar constrangimento variado e obstáculos surgirão para que eles continuem juntos, por parte do ex-marido dela, da família, dos amigos, de colegas do trabalho e, até mesmo, da forma como ela, principalmente, percebe esta relação.
É possível superar as diferenças para viver um grande amor ou estabelecer, no mínimo, uma amizade sincera para toda a vida? “Um amor à altura” nos coloca diante deste dilema e nos força a pensar como reagiríamos diante de situação análoga caso ocorresse conosco. Comédia leve, inteligente, com tema delicado, mas que não se torna piegas ou apelativa em nenhum momento. Não perca!
Para refletir
1- Embora algumas pessoas entre nós sejam consideradas belíssimas, praticamente perfeitas, com rostos que estampam revistas de moda ou estrelando produções para o cinema ou televisão, não há perfeição entre os seres humanos. Algumas pessoas que conheço costumam brincar sobre esta pretensa perfeição de alguns homens e mulheres dizendo que provavelmente tem mau hálito, pé chato, personalidade irritante, voz esganiçada ou algo do gênero. Não se faça de rogado e entenda o recado, ou seja, valorize todas as pessoas, exalte a beleza que há em cada um, demonstre que as pequenas (ou grandes) imperfeições não devem ser algo que nos atormente ou assombre ao longo de nossas vidas. Somos, felizmente, imperfeitos e incompletos, iguais e diferentes e é disso que a vida é feita. Entender isso é algo essencial para diminuir o sofrimento e ficar buscando fórmulas para ser algo que não existe ou outro alguém...
2- A busca pela perfeição e pela beleza movimenta bilhões de dólares anualmente pelo mundo afora. Compreender esta indústria, quanto a seus aspectos sociais, econômicos e culturais é algo que precisamos fazer. Na escola, por exemplo, seria interessante mapear todos os segmentos que visam atender esta demanda humana, da produção de cosméticos as cirurgias plásticas, passando pela moda ou pelo surgimento de ícones no cinema ou na TV, até a matemática desta incessante busca que mobiliza tantas e tantas pessoas. Propor pesquisas, tanto no que se refere a sociologia, a filosofia e a história da beleza até o mapeamento dos países onde isso é mais frequente ou quanto em cifras movimentam estes segmentos produtivos é uma proposta interessante que pode resultar em entrevistas, criação de painéis, exposição aberta a outras turmas, contato com especialistas ou mesmo apresentação para pais ou responsáveis.
3- O que é o nanismo? Porque ele ocorre? Como a biologia e as ciências explicam esta situação? Como é a vida de alguém que é anão? Colocar-se o lugar do outro é uma proposição que deve ser proposta pela escola para seus alunos. Realizar levantamento e compor um blog sobre o assunto, com o intuito de esclarecimento, contendo depoimentos, dados, entrevistas, sugestão de vídeos e filmes, entre outros recursos é algo que pode ser proposto para seus alunos.
Veja o trailer do filme
Ficha Técnica
Filme: UM AMOR À ALTURA
Título original: Un homme à la hauteur
País/Ano: França, 2016
Duração:< 100 minutos
Gênero: Comédia, Romance.
Direção: Laurent Tirard
Roteiro: Laurent Tirard, baseado no original de Marcos Carnevale
Elenco: Jean Dujardin, Virginie Efira, Cédric Kahn, César Domboy, François-Dominique Blin, Myriam Tekaïa, Eléa Clair, Eric Berger.