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Filosofando

Ana Suy Sesarino  Professora do UniBrasil Centro Universitário e doutoranda em psicanálise.

Falar de vida é caminho para afastar os adolescentes do jogo Baleia Azul
Ana Suy Sesarino

13 reasons why, GTA, Baleia Azul

Toda pessoa viva já pensou na morte. Pensar na morte faz parte da vida. O que diferencia alguém vivo de alguém morto é que o vivo ainda não morreu. Vida e morte são coisas claramente separadas, apenas nas palavras. Viver é morrer um pouco a cada dia. Morrer é parar de morrer. Uma vez, uma aluna minha, do curso de psicologia, disse que o "problema da vida" é que a gente já nasce morrendo. Assim, pensar na morte, faz parte da nossa constituição psíquica. É normal, não tem nada de errado com quem pensa na morte. Porém, a gente não pensa na morte de modo uniforme, ao longo de toda a vida. Se tem um tempo onde é mais comum pensar na morte, esse tempo, certamente, é a adolescência.

Isso porque, na primeira infância, a gente vive como se fosse objeto do outro. "Sou da mamãe", "sou do papai", "sou da dinda", dizem os bordados nos macacões e babadores que os bebês usam. Quer dizer, somos do outro. É no fim da infância e no começo da adolescência que vamos tomando posse do nosso corpo. É só aí que vamos entendendo, (inconscientemente, porque geralmente não percebemos que pensamos nisso) que nós pertencemos a nós mesmos. Se por um lado isso pode ser libertador, pois "se sou de mim mesmo, posso fazer o que eu quiser da minha vida" – por outro lado, isso pode ser vivido como pura angústia: "não sou de ninguém, então, não há ninguém por mim".

O encontro com essa descoberta em torno da liberdade/solidão, próprio da adolescência, pode levar vários jovens a imaginarem como seria a sua morte, como seria a reação das pessoas diante da morte dele. E pode levar os jovens ao desejo de morte – não como quem quer morrer, mas como quem quer levar o outro a sentir sua falta. No texto "Luto e melancolia" Freud diz que ninguém tem energia suficiente para tirar a própria vida, a não ser que entenda que, tirando a própria vida, está matando alguém em si. Nesse sentido, fica fácil entender como algumas pessoas podem tentar ou até mesmo conseguir tirar a própria vida. Nada parece mais eficaz para fazer falta no outro do que a eternização de uma falta.

Assim, é comum na adolescência, certa melancolia. Os sentidos que os pais deram aos seus filhos para a vida, até então, demonstram falir. Até que os adolescentes encontrem seus próprios motivos para viver, por meio dos amigos, das causas e dos amores, um luto pode advir. É preciso que o adolescente possa expressar sua tristeza, porque vai descobrindo que seu modo de ver a vida, não é exatamente o mesmo que o dos pais. É por aí que ideias suicidas podem aparecer, e é bem aí que o jogo a baleia azul pode "cair como uma luva". Um desastre.

Se o adolescente consegue elaborar sua tristeza dizendo do que o incomoda, isso é uma coisa – e tem solução. Mas se ele não pode elaborar isso, se ele não encontra palavras para falar dessa tristeza, e então, se depara com o jogo da "baleia azul", então temos um problema de solução mais difícil, bem mais difícil. Um adolescente que levava a ferro e fogo as palavras dos pais, diante da falência das palavras deles, pode encontrar no jogo da "baleia azul", algo que substitua o que os pais disseram. É aí que mora o perigo.

Por isso, pais, é de extrema importância que a gente fale com nossos filhos adolescentes. Não sobre o jogo da baleia azul, ou sobre o GTA (que é aquele video-game super agressivo que deixa muita gente de cabelo em pé) ou sobre o 13 reasons why, mas sobre as coisas da vida. Sobre a vida do vizinho, sobre a matéria do jornal, sobre o filme que passou na tevê, sobre propagandas, trivialidades, sobre qualquer coisa.

O desejo de morrer, ou as fantasias sobre a morte, que esses jovens nos trazem, não devem nos assustar e assim nos levar a apressadamente a calá-los - mas deve nos convocar a escutá-los, deve nos levar ao convite para falarem mais disso. A palavra é o único modo de elaborarmos. Com aquilo que vira palavra podemos fazer algo. Mas aquilo que não vira palavra, nos faz refém dos acontecimentos.



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