Ensino de Línguas
O que nossas provas provam?
Rodolfo Mattiello
Infelizmente, nosso país tem uma veneração cega pelas notas que os alunos tiram nas provas. As provas acabam sendo a única métrica responsável por informar se o aluno aprendeu ou não uma determinada matérias escolar. Só que no caso de ensino de línguas, temos um processo aquisitivo que explora diversas habilidades linguísticas dos alunos e, portanto, as atividades que colocamos no papel podem não ser a melhor maneira de se medir o status da aquisição.
Primeiramente precisamos nos lembrar de que a língua, seja ela materna ou estrangeira, é aprendida para fins comunicativos, isto é, para ser falada. Quer você tenha uma percepção gerativista ou interacionista do desenvolvimento de fala, um consenso deve ser a de que línguas são adquiridas para serem produzidas e não para ficarem sufocadas no interior do cérebro ou limitadas a leitura ou escrita de textos. Afinal de contas, aprendemos a falar muito antes do que aprendemos a ler e escrever. Mais ainda, quando aprendemos a escrever, não utilizamos a escrita para ficar escrevendo frases mecanizadas ou completando sentenças com léxicos que foram deletados. Porém, é exatamente esse tipo de coisa que é exigido dos alunos quando eles têm prova, como se aquela atividade fosse favorecer ou otimizar o processo de aquisição de língua estrangeira dos nossos "anjinhos". Vamos tentar entender, analisando o exemplo de atividades que são comuns nas provas de língua inglesa nas escolas brasileiras.
(1) Complete the sentences with comparatives or superlatives
"My father is _____ my sister. (tall)"
(2) Use negative to correct false sentences
"A giraffe has a long nose - A giraffe doesn’t have a long nose"
Primeira consideração a ser feita é que a língua não funciona de forma tão mecanizada. Se o objetivo é atingir um desempenho alto na oralidade, esses tipos de atividades não têm eficácia alguma, nem mesmo usando o argumento de que alunos vão aprender as regras esse tipo de atividade ajuda. Os alunos vão responder as perguntas de forma mecanizada, como se fossem papagaios da escrita, isto é, eles vão perceber que existe um padrão - em (1) eles tem que colocar taller ou more + adjetivo + than e em (2) passar as frases falsas para a negativa usando o auxiliar em 3a. pessoa do singular - e nas outras frases, o foco vai sair do "como fazer isso nessa língua" e se tornar algo do tipo "só preciso fazer isso em todas as frases". Essa automatização não faz com que os alunos aprendam a língua.
A segunda consideração sobre esses tipos de atividades é a falta de contextualização com o que nossos alunos estão expostos todo dia. A contextualização é o que vai fazer com que nossos alunos fiquem engajados e, além disso, essa proximidade com que eles estão acostumados a fazer fora da sala de aula facilita o relacionamento entre a língua estrangeira e o conceito - já aprendido na língua materna. Por exemplo, as atividades (1) e (2) são escritas, mas em nenhuma situação comunicativa os alunos vão se deparar com situações reais do cotidiano em que eles precisem completar uma frase em língua estrangeira ou ficar simplesmente modificando frases afirmativas para negativas em sequência. Escrita no mundo real envolve escrever uma mensagem no celular pra alguém, postar algo nas redes sociais, enviar um email, conversar com alguém via mensagem instantânea, etc. Nenhuma dessas opções tem absolutamente qualquer relação com as atividades costumeiramente encontradas nas provas de língua inglesa e então você pode retrucar dizendo "na vida real meus alunos não ficam escrevendo redações e isso é um jeito de analisar o conhecimento da língua através da escrita". Perfeito! Então faça-os escrever uma redação pra avaliar até onde os alunos adquiriram conhecimento linguístico durante as aulas e também para deixar a avaliação mais contextualizada.
Portanto, já que estamos num país em que a prova é o objetivo mais valioso nas escolas, temos o dever de oferecer atividades que estejam de acordo com as habilidades linguísticas usadas na comunicação. Em vez de pedir que os alunos completem uma frase - sendo que eles podem até trapacear sem ninguém ver e vai dar a impressão de que ele aprendeu - peça pra que eles criem um panfleto relacionado a um evento que a escola vai oferecer. Ofereça algo relevante em que a língua seja uma ferramenta de comunicação e você consegue engajá-los e avaliar o quanto eles aprenderam.