A Semana - Opiniões
Estamos todos armados: Campanha pelo desarmamento
João Luís de Almeida Machado
Inicialmente um esclarecimento. Não me refiro aqui, especificamente, as armas de fogo ou a qualquer tipo de recurso criado e utilizado pelos homens para ferir, matar e derrotar fragorosamente seus oponentes.
Quando digo que estamos armados o que pretendo é afirmar como as pessoas estão articuladas umas contra as outras de antemão.
Isso mesmo. Há no ar uma prévia precaução contra os demais como se o tempo todo alguém fosse atacar, ferir, lesar, injuriar ou causar qualquer tipo de perda a outrem, seja fisicamente ou não, em especial no segundo âmbito, no que tange a verborragia que por vezes ofende e machuca até mais do que qualquer agressão corporal.
E o pior de tudo é que, como consequência, até mesmo quem é mais tranquilo e menos estressado, tende a igualmente se preparar, se armar, para evitar que algum golpe de surpresa o atinja.
Veja, por exemplo, o que ocorre no seu trabalho, em casa com a família, no trânsito, na academia ou mesmo durante a sua refeição. Trago abaixo alguns relatos que ilustram bem a necessidade de criarmos uma campanha pelo desarmamento para que as pessoas vivam menos tensas, menos predispostas a agressividade e, é claro, mais leves, soltas e propensas a felicidade e a calma.
No trabalho o chefe está sempre a caça de erros e dos responsáveis por tais situações. Não há espaço para reconhecimento das boas realizações. Elogiar é proibido. Pecados capitais, no entanto, são muitos, desde um telefonema em que o atendimento não foi exemplar ou o atraso para uma reunião ainda que justificado até um negócio não fechado cujo desfecho infeliz ocasiona uma caça às bruxas atrás do principal responsável por tal fracasso.
Na academia, a pouco tempo, fui testemunha de uma discussão totalmente inócua na qual um homem de meia idade reclamava de um mais jovem por conta da forma como ocupava espaço em demasia na raia da piscina em que ambos nadavam. Nada de contemporizar. A ideia neste caso era a crítica aberta e até um certo chamamento para a briga. Coisa de moleque mesmo que era conduzida não pelo mais jovem e sim pelo grisalho senhor...
No trânsito isso ocorre a todo momento. Outro dia fui fechado por um ônibus que precisava se deslocar para a direita afim de atender o chamado de passageiros que o aguardavam no ponto. Ao invés de trafegar já na faixa específica, de maior proximidade com o ponto, o motorista conduzia o veículo no meio da avenida e simplesmente jogou o ônibus para cima de meu carro como a dizer: “saia da frente para que eu possa passar. Eu sou grande e o prejuízo real aqui, numa eventual colisão, será seu...”. Tive que parar meu carro para não ser abalroado pelo ônibus e, no final, o motorista ainda colocou a cara para fora e teve o desplante de me ofender... Condutor de veículo de utilidade pública sem educação e preparo para as regras do trânsito e para a mínima civilidade e, olhem que o errado na situação era ele...
Ofensas e farpas entre familiares são, igualmente, uma constante em muitos lares. Infelizmente as pessoas divergem quanto a várias questões e, ao invés de perceberem a riqueza que há nas diferenças e defenderem o direito dos outros assim pensarem e se expressarem, seja na família, no trabalho, na escola ou onde for, acabam se chocando, se confrontando, se ofendendo, se magoando, se humilhando tantas vezes.
Filhos e pais, no choque geracional, por exemplo, ao trazerem à tona os diferentes valores e práticas específicos de suas trajetórias, muitas vezes geram desnecessário confronto e instabilidade que pode desandar para confrontos, afastamentos, brigas e discussões.
Até mesmo em momentos nos quais deveria prevalecer certa tranquilidade e maior felicidade, como a hora das refeições, é marcada por enfrentamentos. Cream naquilo que dizem os especialistas, ou seja, para que uma alimentação saudável aconteça é preciso não apenas ter uma dieta equilibrada, mastigar algumas dezenas de vezes o alimento, comer sem pressa e outras recomendações conhecidas por todos, mas também que a refeição ocorra num clima ameno, descontraído, sem tensões, caso contrário se perde a fome ou se come demais e, a própria digestão é prejudicada.
A proposta de desarmamento relaciona-se a ideia de que devemos privilegiar o diálogo, permitir ao outro a expressão de suas ideias, entender melhor as mágoas, elogiar quando for justo que isso ocorra, reconhecer o outro acima de tudo respeitando-o, seja quem for, seu cônjuge, filho, amigo, colega de trabalho, chefe ou mesmo desconhecido.
A não agressão apregoada por Gandhi e por Martin Luther King, e mais recentemente pelo Dalai Lama e pelo Papa Francisco, entre outras personalidades respeitadas, precisa ser revisitada e, muito mais importante, retomada, colocada novamente em prática, para que a vida de todos seja muito melhor.
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