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João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

ENEM 2014: Publicação dos resultados mostra domínio das escolas privadas na lista das melhores do Brasil
João Luís de Almeida Machado

A divulgação pelo INEP dos resultados do ENEM 2014 neste mês de agosto de 2015, baseado em levantamento feito em mais de 15 mil escolas e quase 3 milhões de alunos, confirmam novamente o predomínio de escolas particulares na lista das melhores do país. Nenhuma novidade então no que tange a pátria educadora, ou seja, constatar que as redes de ensino públicas precisam melhorar muito para que, em algum momento, se equiparem aos colégios privados.

Os dados, no entanto, vão além e nos permitem, por exemplo, saber que a diferença de notas entre os alunos das redes privada e pública em todo o território nacional tem uma variação de 14% a mais para os estudantes que frequentam os bancos escolares de escolas particulares.

Esta diferença significa, aparentemente, que o salto a ser dado pelas redes públicas de ensino é menor do que aquele que esperava.

Revela, no entanto, além desta diferença reduzida, que a média das escolas privadas, em que pese o investimento das famílias, é mais baixa do que deveria ser. Gastar dinheiro duas vezes com educação num país como o Brasil, investimento este que, segundo especialistas, equivale a mercado que está próximo de 10 milhões de alunos matriculados, teria que ter uma reversão muito mais favorável para tais educandos.

A escola particular garante algum benefício para tais alunos, mas muitas vezes o retorno é reduzido, sendo possível percebê-lo, por exemplo, no fato de que nestas escolas e respectivas redes, há aulas todos os dias, com poucas faltas de professores e sem greves; outro benefício imediato está relacionado as instalações, ao acesso a recursos, a disponibilidade de apoio aos estudos, atendimento aos pais e responsáveis, maior segurança ou uso mais frequente de tecnologias associadas as metodologias aplicadas.

É claro que isso, por si, ajuda a entender a distância existente, mas entre as melhores escolas, não é só este aparato oferecido no tocante a recursos materiais e humanos que faz a diferença. O melhor rendimento está associado, na maior parte dos casos, a uma retaguarda e participação mais intensa das famílias e ao subsídio cultural, com o acesso à leitura, filmes, viagens, exposições e outros elementos que enriquecem os alunos e lhes permitem maior participação, melhor escrita, clareza em sua argumentação, exemplos para compor suas produções nas escolas...

A divulgação dos resultados demonstrou também que o estado de São Paulo possui a maior quantidade de escolas entre as 100 melhores do país. É fácil associar isso ao fato de que os paulistas têm a economia mais pujante entre todos os estados e territórios do Brasil. Não é possível, porém, reduzir ao quesito econômico este predomínio deste estado nesta lista. Deve-se adicionar o fato de que em cidades do interior ou na capital há uma competição árdua por parte das escolas para garantir e fidelizar sua clientela. Há mais concorrentes e para participar na disputa pelos primeiros lugares é preciso ter excelência no corpo docente, dotar as unidades com o máximo de recursos de ponta, ter acompanhamento por parte de equipe de apoio pedagógico como orientação educacional, oferecer aulas de apoio no contra turno, disponibilizar os melhores recursos de tecnologia como base do trabalho educacional, trabalhar com metodologias modernas...

Adicione a isso o fato de que os pais são extremamente exigentes quanto mais informados forem e que isso tende a acontecer em áreas mais densamente povoadas e urbanizadas em que o rendimento per capita seja mais alto. A cidade de São José dos Campos, por exemplo, tem 2 escolas entre as 100 melhores do país, uma delas, o Colégio Engenheiro Juarez Wanderley, é fruto da ação da Embraer, empresa localizada no município, que subsidia a escola em projeto de natureza social que beneficia os melhores alunos das escolas públicas da região do Vale do Paraíba paulista. A escola promove um concorrido vestibulinho de acesso que lhe permite ter os melhores alunos oriundos do ensino fundamental II numa rica e industrializada região do interior de São Paulo. Na outra ponta, no mesmo município, o Colégio Poliedro, com sistema de ensino próprio, tem resultados expressivos a partir de um projeto que trabalha com clientela mais heterogênea de forma a consolidar entre seus alunos a consciência, a responsabilidade e a dedicação, ou seja, a disciplina e o foco, para que seus resultados sejam sempre os melhores. Além disso, tem corpo docente selecionadíssimo e uma intensidade de estudos e tarefas avassaladores que levam seus alunos a resultados expressivos no ENEM, na Fuvest, na Unicamp, no ITA e nos exames mais difíceis do pais.

Os resultados publicados pelo ENEM revelaram também, como apresentado no artigo “Escolas que ‘não existem’ representam 80% dos primeiros lugares no ENEM”, que para garantir maior exposição de sua marca, vendendo para maior quantidade de usuários a ideia de qualidade de seus sistemas de ensino, algumas redes de ensino criam escolas dentro de suas escolas, ou seja, atuam com um CNPJ adicional através do qual separam seus melhores alunos para que estes lhes garantam lugar entre as 10 melhores unidades educacionais do país.

Isso não é ilegal mas é, certamente, atitude reprovável pois não apresenta os resultados reais de tais escolas ao separar o joio do trigo, discriminando seus alunos e estabelecendo que para a própria escola deve haver um tratamento diferenciado. Falseia os dados do ranking para que benefícios financeiros possam ser colhidos ao final dos processos com mais matrículas sendo efetivadas.

Outro dado muito expressivo em relação ao ENEM 2014 refere-se ao fato de que apenas 93 escolas públicas estão entre as 1000 melhores do país. Este índice é melhor que o de 2013, quando apenas 78 escolas públicas figuravam nesta relação, mas ainda assim, representa menos de 10% do total auferido nesta relação das 1000 escolas com melhor desempenho em todo o país.

No que tange aos conteúdos há melhoras em todas as áreas do conhecimento, ainda que não sejam muito expressivas. Matemática, no entanto, teve resultados piores que na edição de 2013 do ENEM, passando de 514 no ano anterior a atual edição para 476 pontos no último levantamento. Em Linguagem e Códigos o rendimento médio cresceu 20 pontos, passando de 508 para 528. Em Ciências da Natureza, o salto foi de 15 pontos, passando para 507. Na área de Ciências Humanas, a melhoria no desempenho foi de 28 pontos, atingindo os 484 pontos.

Novos dados, a partir da análise dos microdados que estão em mãos do INEP serão divulgados nas próximas semanas ou meses, de qualquer modo, as informações apresentadas são reveladoras, acima de tudo, do quanto precisamos evoluir, em especial na educação pública, para que o país possa atingir níveis mínimos de qualidade em educação.



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