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Ensino de Línguas

Rodolfo Mattiello é formado em Letras e mestre em Linguística Aplicada. Professor de língua inglesa desde 2002, em 2013 fundou a Mattiello Consultoria Acadêmica que oferece coaching especializado para professores de língua estrangeira.

Não, O Português Não Atrapalha
Rodolfo Mattielo

Quando eu era mais moleque, estava na escola ainda, uma professora de inglês que tinha disse uma coisa que realente me marcou pra vida. Surpreendentemente (ou não), não foi nada relacionado à matéria. Ela disse “vocês não podem pensar em português se quiserem aprender inglês”. Muito provavelmente ela disse mais coisas que eu não me lembro, mas o core da “super dica” – ou teria sido bronca – foi esse. Isso ocorreu em meados dos anos 90, o inglês ainda não era matéria oficial do currículo escolar, os professores não tinham fácil acesso às informações e, talvez por isso, ela tenha ignorado o fato de a língua materna poder ser, sim, um aliado na aquisição da língua estrangeira (L2).

Sempre disse aos meus alunos que o teacher que pede para não usar a língua materna para aprender inglês merece ficar de castigo no canto da sala. Para nós, o português pode ser o plano de fundo para sobreposição da L2, ou seja, os alunos devem e vão comparar as línguas e irão notar as similaridades entre nosso bom e velho português e o bom e novo inglês. A estrutura sintática da língua portuguesa, de maneira geral, respeita a regra SVO – susbstantivo, verbo, objeto. O inglês também respeita esse sistema (de maneira geral, claro) e essa similaridade ajuda muito o processo de aquisição da linguagem. Pois, vamos analisar (1) e (2) para entendermos como nosso background em português pode ajudar na decodificação do inglês.

(1) Armando Nogueira wrote an amazing article.

(2) Armando Nogueira escreveu um artigo incrível.

Com exceção dos adjetivos e dos artigos, pode-se notar o sistema SVO tanto em (1) quanto em (2). Esse tipo de informação, não necessariamente passada de maneira descritiva, auxilia o entendimento da nova língua, inglesa, confirmando quão positiva pode ser essa transferência.

A ideia de transferência positiva (positive transfer) influencia, como vimos, a aquisição da língua no que diz respeito ao pragmatismo (Kasper, 1992, Takahashi, 1996). Por isso, em diversas vezes, o português acaba sendo a pedra no sapato de alguns alunos pois nem sempre nossa língua nativa foi aprendida de maneira boa o suficiente para que haja tranferência positiva.

Nesse caso, a língua nativa pode acarretar em uma transferência negativa (negative transfer). Um dos problemas que podem ser notados é a ocorrência de erros (errors), ou seja, quando o aluno definitivamente não tem conhecimento e, por dedução causado pela língua materna, acaba produzindo e errando. O que pode acontecer é o erro em nível lexical devido às palavras cognatas. Considerando anniversary, alunos podem ter a brilhante ideia: “já que anniversary é igual em português, então posso usar ‘niver’ para me referir à aniversário em inglês”. Definitivamente isso não vai dar certo. Antes de descer paulada na influência do portguês no processo de aquisição, é importante perceber a transferência positiva da palavra em questão. O aluno associar a palavra estrangeira como sendo igual a palavra da língua portuguesa é uma evidência. Porém, usar “niver” em língua inglesa não tem valor, sem significado e nós, professores, podemos usar essa situação como abertura para introdução de algo novo. No caso, a referência informal à “aniversário”, pode ser ensinada a expressão “b-day”, por exemplo.

Seja influenciando positiva ou negativamente, a língua portuguesa deve sim ser parte integrante do processo de aquisição. Não nas aulas, falando português ou fazendo aulas de tradução, mas os professores precisam desenvolver aulas que trabalhem essa transferência, essa sobreposição que é realizada no pensamento dos alunos. De tudo isso só fico triste por minha professora não ter lido os linguístas que estudam pragmática, porque ela jamais teria dito aquilo e teria usado nossa língua como aliada às suas aulas.



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