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A Semana - Opiniões

João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

15/6/2004 - Os 60 Anos de Chico Buarque de Hollanda
Com Açúcar, Com Afeto

Foto-de-Chico-Buarque-de-Hollanda

Imagine o Brasil sem Chico Buarque de Hollanda. Será que você ou qualquer um de nós conseguiria? Afinal de contas desde os anos 1960, a contribuição desse excepcional artista faz parte obrigatória do acervo cultural de nosso país. Além de cantor e compositor, Chico se tornou referência por seus posicionamentos políticos, especialmente por sua luta contra a ditadura militar. Não bastasse tudo isso, recentemente o filho pródigo do grande historiador Sérgio Buarque de Hollanda entrou no mundo das letras, onde também faz sucesso de crítica e público (publicou “Estorvo”, “Benjamin” e “Budapeste”).

Já havia dado as caras pelo teatro (e também pelo cinema), com contribuições polêmicas e consagradas como “Roda Viva”, “Calabar” e “Ópera do Malandro”. Chico compõe aquilo que costumamos chamar de artista completo. Um homem a ser celebrado “com açúcar, com afeto” (conforme título de uma de suas mais conhecidas músicas) pelo Brasil.

Daqui a 50 anos, com certeza será lembrado como um dos maiores expoentes da cultura nacional. Será motivo de honrarias e celebrações pelo país afora. Terá seu nome alçado a condição de ícone da brasilidade. Seus versos serão tema de aulas, teses, filmes e considerações filosóficas. Será a vitória do “malandro” sonhador que com sua timidez e seus olhos azuis arrebatou a simpatia e a consideração de todo o país.

Afinal, porque deixar para bater palmas para esse grande brasileiro somente daqui a alguns anos? Que tal valorizar seu trabalho e sua arte desde já?

Imagens-de-Chico-Buarque-de-Hollanda

Francisco Buarque de Hollanda teve em casa uma das grandes heranças que podem ser deixadas pelos pais a seus filhos, muito estímulo e incentivo para crescer e conhecer o mundo ao seu redor. Conviveu com grandes personalidades do mundo da cultura e da música quando poucos o reconheceriam fora do ambiente doméstico. João Cabral de Mello Neto, Vinicius de Moraes, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tom Jobim, a irmã Miúcha, João Gilberto, Nara Leão e tantos outros grandes nomes da cultura brasileira foram decisivos para o desenvolvimento e a maturação intelectual do jovem Chico.

Nos anos 1960 iniciou sua carreira musical e teatral. Ainda pouco conhecido, se tornou vanguarda a partir de suas parcerias (como aquela com Nara Leão que fez com que ganhasse em 1966 o festival da canção da TV Record com a música “A Banda”) e das letras politizadas de suas músicas que afrontavam a censura e estimulavam um debate amplo da situação constrangedora vivida pelo Brasil dos generais e do AI-5.

Foi “convidado” a um exílio na Itália em virtude das perseguições empreendidas pelo regime ditatorial. Pouco antes disso havia ganhado, em 1968, em parceria com Tom Jobim, o festival da canção com a música “Sabiá” (nessa ocasião seria alvo de uma das maiores e mais conhecidas vaias empreendidas no país, tendo sua vitória contestada pelo público). Nesse mesmo ano ainda iria compor com Tom as músicas “Retrato em Branco e Preto” e “Pois é”.

Chico iria estreitar laços com Vinicius e Toquinho em sua estadia na Europa. Cultivaria ainda um amor incontido com o futebol brasileiro (torce pelo Fluminense) tendo a oportunidade de dar abrigo a ninguém menos que Mané Garrincha e Elza Soares na Itália. Esse período coincide também com um afastamento de Gil e Caetano, que haviam optado pela busca do feio em oposição ao belo com seu Tropicalismo e entraram em choque com as composições e a arte de Chico.

Chico-Buarque-de-Hollanda

No final dos anos 1960, Chico se casou com a atriz Marieta Severo, com quem viveu até os anos 1990 e com quem teve três filhas.

De sua primeira década (anos 1960) como expoente da MPB surgiram composições consagradas como “Pedro Pedreiro”, “A Rita”, “A Banda”, “Com Açúcar, Com Afeto”, “Retrato em Branco e Preto”, “Carolina” e “Roda Viva” (entre outros).

Nos anos 1970 viriam algumas de suas maiores contribuições para a produção musical de nosso país. Alguns de seus discos desse período são celebrados como peças fundamentais para uma discografia completa da MPB, como são os casos de “Ópera do Malandro”, “Meus Caros Amigos”, “Construção” e “Sinal Fechado”.

São dessa época as canções mais politizadas e conhecidas de Chico, como é o caso de “Desalento”, “Construção”, “Gota D’água”, “Mulheres de Atenas”, “Geni”, “Cálice” e “Apesar de Você”.

Além das músicas, durante a década de 1970, Chico trabalha em produções para o cinema (colabora com músicas e como ator em produções como “Vai Trabalhar Vagabundo”, “Joanna Francesa”, “Quando o Carnaval Chegar”, “Dona Flor e seus dois maridos” e “Bye-bye, Brasil”) e para o teatro (escreve “Gota D’Água” em parceria com Paulo Pontes, “Calabar” com o amigo Ruy Guerra, faz a adaptação da peça infantil “Os Saltimbancos” e escreve texto e música para “Ópera do Malandro”).

Escreve ainda seus primeiros livros “Fazenda Modelo” (em 1974) e o infantil “Chapeuzinho Amarelo” (em 1979).

Os-saltimbancos-e-Opera-do-malandro

Os anos 1980 são marcados pela intensa atividade política em favor das Diretas-Já. Chico é um dos maiores ativistas e participa de comícios por todo o país ao lado de grandes expoentes da luta contra a ditadura no país (como Ulysses Guimarães, Franco Montoro, Lula, Fernando Henrique Cardoso,...).

Nessa década continua ativo na literatura, no cinema, no teatro e, principalmente, na música. Suas principais contribuições são:

- No Cinema – auxilia com músicas produções como “Os Saltimbancos Trapalhões”, “Ópera do Malandro” e “Para viver um grande amor” (onde também escreveu o roteiro adaptado em parceria com o diretor Miguel Faria Jr.).
- No Teatro – compõe canções para os balés “O Grande Circo Místico” e “Dança da Meia Lua” e para a peça “Suburbano Coração”.
- Na Literatura – publica o livro de poesias “A Bordo do Rui Barbosa”.
- Na Música – lança os discos “Vida”, “Os Saltimbancos Trapalhões”, “Almanaque”, “Francisco” e “Chico Buarque”.

Dessas contribuições surgiram sucessos como “Vida”, “O Meu Guri”, “Almanaque”, “Brejo da Cruz”, “Samba do Grande Amor” e “Suburbano Coração”.

Chico-Buarque-Budapeste-e-Estorvo

A década de 1990 foi marcada pelos grandes sucessos literários com os livros “Estorvo” e “Benjamin”. Chico entra na luta contra a fome empreendida pelo sociólogo Herbert de Souza (o Betinho) e participa das campanhas contra a violência nos estádios de futebol. Lança discos que resgatam sua obra (como os shows “Ao Vivo – Paris – Le Zenith”, de 1990 e “Chico Buarque ao vivo”, de 1999) ou novas produções, como “Paratodos”, “Uma palavra” e “As Cidades”.

Ufa! Ao completar 60 anos nesse próximo dia 19 de Junho, Chico merece, certamente, todo o nosso carinho e nossos aplausos. Viva Chico!

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