Planeta Educação

Diário de Classe

João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

O Mundo em um tabuleiro de xadrez
Coluna Diário de Classe

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Era mais ou menos dessa forma que podia ser entendida a Guerra Fria, como um jogo de xadrez. Tratava-se, na realidade, de um confronto vivido pela humanidade no pós 2ª Guerra Mundial em que os Estados Unidos e a União Soviética disputavam a primazia no mundo para comprovar a supremacia de seus sistemas ou modos de produção, o capitalismo e o socialismo, respectivamente.

Dessa prolongada querela travada entre as duas superpotências surgiram diversos acontecimentos históricos relevantes, todos eles direta ou indiretamente relacionados ao conflito entre russos e norte-americanos. Podem ser citados como derivativos da Guerra Fria acontecimentos como a Guerra do Vietnã, a Crise dos Mísseis em Cuba, a tentativa de invasão da Baía dos Porcos (também em Cuba), a corrida armamentista e espacial, a disputa pelas medalhas olímpicas, a competição pelos principais prêmios científicos e artísticos (como o Nobel), os golpes militares na América Latina,...

Pois era justamente esse tema fascinante que tínhamos pela frente em nossas aulas de história com alunos do 2° ano do ensino médio. Para facilitar nosso trabalho, o título do texto do material que utilizamos como norteador de nossas práticas mencionava justamente a idéia de que, pela delicada situação em que o mundo de então se encontrava (entre 1945 e 1990), as decisões tomadas por governantes da União Soviética e dos Estados Unidos deveriam ser pensadas uma de cada vez, com o máximo de cautela e a partir de muita reflexão e raciocínio, justamente como num intrincado jogo de xadrez...

O que fazer?

Que tal transformar o título numa fonte de inspiração para um pequeno, rápido e envolvente projeto para facilitar a compreensão do tema? E em que consistiria esse projeto relacionado ao jogo de xadrez?

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Que tal transferir para o tabuleiro de xadrez a história da Guerra Fria
travada entre Estados Unidos e União Soviética?

Em primeiro lugar lembrei os alunos que o xadrez é um jogo entre dois oponentes onde cada um deles tem a seu dispor um exército formado por peças como o rei, a rainha, os bispos, os cavalos, as torres e os peões. Da mesma forma, como uma analogia, lhes disse que a Guerra Fria era travada por dois poderosos oponentes (EUA e URSS) e que essas nações tinham importantes aliados a formar seus “exércitos” (os americanos contavam com o apoio da Inglaterra, França, Alemanha Ocidental, Japão, Austrália, Canadá, entre outros; os russos tinham ao seu lado a Alemanha Oriental, Polônia, Cuba, Iugoslávia, Romênia,...).

Combinamos então que o nosso tabuleiro de xadrez teria como peças mais importantes os Estados Unidos e a União Soviética que seriam, conseqüentemente, os reis de nosso jogo. Perfilados ao lado de nossos reis estariam seus principais aliados, cabendo a Inglaterra o posto de rainha do lado capitalista e a Alemanha Oriental a mesma posição no mundo socialista do pós-guerra. Cuba, Polônia, Romênia, China e outros importantes países aliados dos russos seriam as outras peças de elite do xadrez (bispos, torres e cavalos); alinhando-se aos norte-americanos entrariam o Canadá, a França, a Espanha e a Alemanha Ocidental. Os posicionamentos deveriam ser definidos de acordo com a maior ou menor proximidade com as potências centrais de cada lado do tabuleiro.

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Filmes como “Dr. Fantástico” (cujo subtítulo é “ou como aprendi a parar de me preocupar e amar a bomba”),
“O Dia Seguinte” ou “Treze dias que abalaram o mundo” tem como tema central a Guerra Fria.

Os peões seriam os países alinhados a política norte-americana ou soviética provenientes das regiões periféricas do planeta ou menos influentes no cenário europeu, caso do Brasil ou da Albânia, respectivamente aliados dos Estados Unidos e da União Soviética durante a Guerra Fria, importantes estrategicamente para a expansão e o domínio de certas regiões do mundo apesar de mais pobres ou de terem menor expressão no cenário de decisões geopolíticas do planeta.

O espaço central do tabuleiro entre as peças perfiladas em sua posição original (de acordo com as regras do xadrez) seria preenchido com informações a respeito de acontecimentos diretamente relacionados a Guerra Fria, como a corrida armamentista, a construção do muro de Berlim, a Perestroika ou a crise dos mísseis cubanos.

Aos alunos caberia selecionar as informações a partir do texto base de nosso material de apoio e estudo, produzir um tabuleiro de xadrez (desenhado em folhas de sulfite coladas umas as outras para aumentar a área disponível para o tabuleiro), desenhar peças de xadrez seguindo o padrão regular desse tradicional jogo, caracterizar as peças do xadrez como os países do lado socialista e do capitalista (com bandeiras, personagens históricos, símbolos da cultura de cada país, cores nacionais, letras indicativas,...) e indicar nos espaços centrais do tabuleiro os acontecimentos mais marcantes desse conflito.

Para tanto teriam que ler com atenção o material e definir os conflitos em uma tabela que serviria como legenda indicativa e explicativa da importância de cada um desses acontecimentos destacados para, inclusive, conseguir posicioná-los no tabuleiro de xadrez.

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A Guerra do Vietnã e o Muro de Berlim também fazem parte do triste legado
da Guerra Fria para a história da humanidade.

Para o desenvolvimento dessa atividade a turma foi dividida em grupos de três alunos e foi estipulado que o trabalho seria desenvolvido apenas em sala de aula. O tempo disponível para essa produção seria de quatro aulas de 50 minutos. Para o trabalho artístico não foram indicados previamente outros materiais. Não havia restrições quanto ao uso de nenhum tipo de recurso, podendo os grupos criar uma representação em seus tabuleiros e peças utilizando pinturas com guaches, canetas coloridas, lápis de cor, giz de cera, colagens, giz molhado, imagens de revistas ou jornais,...

Como o tempo de trabalho em aula foi considerado um pouco reduzido, ficou combinado que entre as aulas em que realizaríamos essa atividade os grupos poderiam agilizar a produção em encontros em suas casas.

O objetivo primordial era envolver os alunos com o tema e tornar a leitura do mesmo muito mais agradável e estimulante. Ao mesmo tempo, tinha como propósito fazer com que os alunos criassem fórmulas de apresentação e representação da Guerra Fria, criando conexões que lhes permitissem entender as ligações entre esse acontecimento e todos os demais que a ele de certa forma se relacionam (Vietnã, Muro de Berlim, Pacto de Varsóvia, Otan,...).

Como a atividade em questão foi utilizada para promover a leitura e iniciá-los no assunto, ao final foi a apresentação de seus tabuleiros e peças aos outros grupos, com justificativas quanto à escolha de cores, modelos, acontecimentos destacados, aliados escolhidos para cada um dos lados,...

Depois dessa atividade, coube ao professor, utilizando muitas das informações levantadas pelos alunos em cada um dos grupos, fazer um fechamento do tema “Guerra Fria”, com explicações e diagramas que lhes permitissem visualizar os acontecimentos discutidos e trabalhados no tabuleiro de xadrez.

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Gorbatchev, Fidel Castro e Richard Nixon, personagens destacados da Guerra Fria.

O aprofundamento fez-se necessário para que determinados fatos, personagens, eventos e conceitos pudessem ser aprendidos a partir de uma conceituação acadêmica. Idéias como socialismo, capitalismo, revolução, luta de classes, propriedade privada e tantas outras foram revistas ou introduzidas. As disputas entre russos e americanos foram discutidas e detalhadas. Os conflitos paralelos travados por aliados mereceram destaque e foram contextualizados. Textos adicionais retirados de revistas e jornais puderam complementar e fechar o projeto.

E de repente o mundo realmente coube num tabuleiro de xadrez... Ao menos em nossa aula de história sobre a Guerra Fria...

Avaliação deste Artigo: 3 estrelas