Planeta Educação

A Semana - Opiniões

João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

22/3/2004 - Para não morrer de sede
O Dia Mundial da Água

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"Água que nasce na fonte serena do mundo
E que abre o profundo grotão
Água que faz inocente riacho e deságua
Na corrente do ribeirão
Águas escuras dos rios
Que levam a fertilidade ao sertão
Águas que banham aldeias
E matam a sede da população"
(Planeta Água, Guilherme Arantes)

O noticiário da televisão (TV Globo, Jornal Hoje, edição de 22 de Março de 2004) divulgou que aproximadamente 1% de toda a água existente no planeta é apropriada ao consumo humano. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) lançou, entre o final de fevereiro e o início de março, a nova campanha da fraternidade com o tema: "Água - Fonte de Vida". A Sabesp tem feito campanhas regulares de conscientização na televisão e em outras mídias para motivar (e educar) a população a diminuir o desperdício de água no estado de São Paulo.

Há uma enorme preocupação no Brasil e em todo o mundo quanto ao desperdício de um recurso que é essencial a sobrevivência não só dos seres humanos, mas também de todas as outras espécies que vivem na Terra. Ao decretar a existência de um dia mundial da água, a humanidade se dá conta, com grande atraso, de sua dependência desse recurso e do mau uso que tem feito do mesmo há tanto tempo.

O pior de tudo é constatar que apesar de todos os esforços que tem sido feitos nos últimos anos para evitar um colapso na distribuição de água no planeta, o aumento do consumo em função do crescimento econômico e populacional praticamente nos condena a um futuro de enormes dificuldades no setor, inclusive com a previsão de guerras pela posse dos mananciais do recurso.

Nem mesmo um país privilegiado como o Brasil, possuidor de aproximadamente 13% de toda a água doce do planeta, está isento dos problemas. Especialmente se considerarmos que nossas maiores fontes se encontram na região Norte do país e que o maior pólo consumidor se concentra no centro-sul, especialmente em São Paulo.

São Paulo, diga-se de passagem, já tem vivido situações de consumo controlado em diversos bairros e regiões. Sabe-se que há um grande desperdício ocorrendo na maioria das cidades de nosso país ocasionado por vazamentos em tubulações e, principalmente, em função do consumo exagerado por parte da população.

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"Se todos os habitantes de São Paulo fecharem a torneira ao escovarem os dentes, todo dia
será economizada água equivalente ao que cai nas cataratas do Iguaçu por 9 minutos.
Consuma sem consumir o mundo em que você vive".
www.akatu.org.br

Ao se apregoar na televisão, em outdoors ou através da imprensa escrita que as pessoas devem fechar a torneira enquanto escovam os dentes ou que deveriam tomar banhos menos prolongados (ou ainda que desliguem a água enquanto se ensaboam), que não se deve desperdiçar água lavando carros e calçadas com a enorme constância com que isso acontece, ou ainda que a água das chuvas pode ser aproveitada a partir de cisternas, o que se pretende é fazer com que as pessoas colaborem consigo mesmas e com as gerações que irão habitar o país e o planeta nas próximas décadas.

A redução dos gastos pode auxiliar cidades como a capital paulista não apenas em períodos de escassez, provocada por prolongada estiagem, como o período pelo qual passou o país há uns dois anos atrás. O uso racionalizado da água permite que a economia dos recursos repercuta também no bolso dos consumidores, com a redução do valor das contas. Vale lembrar que já estão sendo criadas taxas de água em alguns municípios e que, a tendência com a escassez do produto, é que o preço de mercado aumente e onere ainda mais os consumidores...

Outro assunto relacionado ao consumo de água que merece especial atenção refere-se ao fato de que a maior parte da água consumida no mundo é utilizada pelo setor primário e secundário da economia de todos os países. Técnicas de irrigação e abastecimento de água para rebanhos das mais variadas espécies; água utilizada para a refrigeração dos sistemas industriais ou para a geração de energia; água conduzida para o saneamento de instituições e estabelecimentos das mais diversas naturezas; obviamente não há como brecar o progresso ou estancar o desenvolvimento, até mesmo porque ao fazer isso estaríamos condenando uma quantidade ainda maior de pessoas ao desemprego e a pobreza.

Como então poderíamos criar um meio de utilização da água por parte dos setores produtivos da economia sem causar problemas como desemprego, crise econômica, empobrecimento da população, oferta menor de gêneros no mercado (e consequentemente o aumento de preços)?

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O maior consumo de água no planeta está relacionado à produção econômica; no campo através
da irrigação e do fornecimento de água para os rebanhos; na indústria com o uso da água para o
saneamento, a produção de energia e o acionamento e resfriamento de máquinas e motores.

Esse é um dos grandes dilemas vividos pelos economistas e estudiosos da questão da água no planeta. Defendem alguns que a utilização da água por setores produtivos deveria ser mais cara e que, com os recursos adicionais captados poderia ser feita a recuperação de mananciais poluídos ou em novas campanhas de conscientização quanto ao consumo.

Outros acreditam que todas as indústrias deveriam ser obrigadas a ter recursos e técnicas de reutilização da água e de recuperação de sua pureza (se é que isso é possível). Na agricultura, o uso poderia ser racionalizado com a realização de uma irrigação equacionada para distribuir apenas a quantidade de água fundamental para o desenvolvimento das espécies plantadas, sem jamais exceder o montante previsto a partir dos dados fornecidos por pesquisadores e cientistas. Esse controle poderia ser, inclusive, acionado por computadores para evitar que erros acontecessem.

Outra forma de aumentar os recursos disponíveis, que tem sido muito utilizada no nordeste do Brasil, é a construção de cisternas de captação da água das chuvas. O melhor de tudo nesse projeto é que os custos iniciais não são muito altos.

Menino-sorrindo-aparendo-agua-com-as-maos
A melhor resposta talvez esteja na conscientização das
crianças quanto a importância da água e a necessidade
de economizar e utilizá-la de forma racional.

Vale lembrar que apesar das campanhas realizadas na televisão ou pela igreja, o melhor caminho para a plena conscientização e a efetivação de atitudes que revertam em favor da economia de água começa com o trabalho nas escolas. O pior de tudo é que muito pouco ou praticamente nada tem sido feito no setor para conscientizar as crianças e adolescentes da necessidade de controlar o consumo de água em casa.

Quando isso ocorre, a reação das crianças e dos adolescentes é estimulante. Eles normalmente se apegam tanto aos ensinamentos e demonstram tão grande consciência quanto ao valor e a importância da água para a vida de todos que, invariavelmente, passam a fiscalizar o comportamento dos pais e demais adultos cobrando maior responsabilidade e economia no consumo desse recurso tão valioso.

Talvez a nossa maior chance de não morrer de sede esteja nas mãos de nossas crianças...

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