Na repetência escolar, quem deve ser reprovado: o aluno ou o colégio?
Francisca Romana Giacometti Paris
A palavra reprovação escolar está
vinculada à ideia de condenação,
incapacidade e insucesso.
Trata-se de uma questão que aflige todos os envolvidos no
processo: os estudantes, os pais e os educadores, além de
trazer no seu bojo um conjunto de mitos que necessitam ser
esclarecidos, principalmente aos pais.
Acredito que a reprovação não deveria
existir no ensino fundamental, pois, tratando-se de escolaridade
obrigatória, é esperado que seja oferecida para
que todos obtenham sucesso ─ compreendido na maior pluralidade
possível ─ no percurso escolar que lhes é imposto
por força da lei.
Melhor dizendo, os meninos e meninas não escolheram estudar,
mas são obrigados a frequentar a escola porque a sociedade
brasileira assim decidiu, com o que concordo.
Ora, se a sociedade decidiu pela escolaridade obrigatória
entre os seis e os 14 anos de idade, então que se mobilize
para que ela seja eficaz para todos. Isso porque todos são
capazes de aprender, desde que sejam respeitados seus sentidos, ritmos,
cultura e condições cognitivas.
Partindo desse pressuposto, podemos nos perguntar: por que,
então, existe a reprovação? Explico: a
reprovação existe porque não sabemos
fazer uma escola que trabalhe com as diferenças.
Nosso olhar “educador-míope” concebe um
aluno-padrão e elabora práticas
pedagógicas com base nele. Assim, quem não se
enquadra no padrão ─ não por ser pior, mas por
ser diferente ─ acaba sendo reprovado.
Outra hipocrisia da pedagogia da reprovação
localiza-se no fato de reprovar apenas o aluno, desconsiderando
questões fundamentais do complexo processo escolar.
O aluno, aquele que deveria ser resguardado, acaba sendo o culpado pelo
seu próprio não saber. Ora, mas a escola
não existe para ensinar? O aluno não vai
à escola para aprender? Caso ele não aprenda,
quem deve ser reprovado: ele ou a escola?
Contudo, apesar do exposto, se você ainda viver um momento de
reprovação escolar, pode tirar dele um pequeno
potencial pedagógico. É preciso reconstruir o
termo, já que reprovar é um verbo cujo
significado pode ser “provar de novo”, como o
refazer significa, também, “fazer de
novo”.
Confesso que não acredito muito nisso, mas, para acalentar
pais angustiados, talvez eles possam dizer aos filhos que, se tivermos
que provar um saber num determinado momento e não
conseguirmos, resta-nos uma segunda chance. Então, poderemos
provar de novo aquilo que sabemos, só que em outro tempo.
É importante sabermos ensaiar o discurso para dizer aos
nossos filhos que reprovar pode ser um novo momento de provar e que,
para isso, é preciso revisitar alguns saberes. Seria jogo de
palavras? Penso que sim, mas vale tudo para recuperar a
esperança e a autoestima de quem é o sujeito do
existir escolar.
Francisca
Romana Giacometti Paris
é Pedagoga, Mestre em Educação,
diretora Pedagógica do Agora Sistema de Ensino
(www.souagora.com.br) e do Ético Sistema de Ensino
(www.sejaetico.com.br), da Editora Saraiva, e ex-secretária
de Educação de Ribeirão Preto (SP).