Filosofando
“O Olho do Furacão”
Leonardo Venicius Parreira Proto
“Tudo
muda ao teu redor:
o
que era certo, sólido
dissolve, desaba, dilui,
desmancha no ar”
(Humberto Gessinger)
A banda “Engenheiros do Hawaii” em sua expressão cultural tem muito a nos dizer sobre o atual estágio da civilização humana, isso por conseguir transpor para as composições musicais uma crítica da sociedade capitalista e seus desdobramentos na lógica da reprodução do individualismo, do consumismo e da competição em níveis de exarcebação. Níveis estes que operam no âmbito da cultura e da vida cotidiana dos indivíduos e de suas realidades.
O esforço de crítica da cultura e de como organizamos o mundo contemporâneo, de acordo com as letras do grupo, evidenciam o descontentamento com as formas de sociabilidade experimentadas pela condição desses intérpretes do universo musical brasileiro.
O grupo, de formação musical nos idos de 1984 (segundo informações do site oficial da banda), nasceu como projeto de estudantes da faculdade de arquitetura no contexto de explosão de grupos de rock nacional, tais como Legião Urbana, Titãs, Barão Vermelho etc.
É evidente que o “con-texto” nascedouro do projeto “Engenheiros do Hawaii” está ligado às questões do Brasil no conhecido período de “transição democrática”. Assim, dois aspectos são relacionáveis: a ascensão de grupos musicais juvenis e a crítica destes às formas de estruturação da sociedade brasileira naquele instante.
A história do rock brasileiro na década de 80 e a contribuição do componente político na esfera das traduções do universo musical dos jovens do Hawaii, em termos de ofertar aos próprios adolescentes e jovens uma ideia de insatisfação com os aspectos de manipulação, exploração e opressão ao conjunto social, repercute na formação cultural dessa parcela significativa da população do país.
Isso é importante devido à desconstrução da noção de que a participação política da juventude, de forma intensa, deu-se com efervescência durante o regime militar depois de 64.
A obra musical do legado dos “Engenheiros do Hawaii” constrói uma aproximação entre história e música numa articulação entre texto e contexto, própria do argumento explicativo sobre as relações entre a particularidade, no caso aqui exposto, as letras da música e o todo, ou seja, a referência ao momento histórico vivido pela sociedade brasileira.
Juventude, política e tempo histórico, eis uma aproximação presente no “centro do furacão” e “por dentro de tudo no olho do furacão”. A existência de uma linguagem voltada para o “público” juvenil, mediatizada pela própria indústria cultural, produtora de uma banda com o viés de uma abordagem de crítica social, apresenta-se para todos/as apreciadores um problema paradoxal, o de haver espaço na reprodução da indústria de massa para bandas com essa característica.
Essa constatação da contradição precisa também ser entendida no conjunto de apropriações que o capital vai desenvolvendo em determinadas condições particulares.
Nesse caso, da mercantilização da música e estilos de grupos que contestam à organização social e suas determinações, as letras contestatórias podem expressar, no bojo da própria contradição dessas apropriações culturais feitas pelo capitalismo uma “brecha” na luta dos que acreditam em elaborações culturais situadas no campo das rupturas com a institucionalização do capital na ordem existencial dos indivíduos.
Os destinatários juvenis da indústria cultural “assimilam” e “respondem” de formas variadas quanto à receptividade dessas músicas, seja indo a shows com amplo número de pessoas, comprando CDs, utilizando as letras em dinâmicas e trabalhos de grupos, lendo e interpretando a partir dos conteúdos elaborados nas letras, enquanto recurso educativo de compreensão da mensagem crítica.
Estamos todos/as no “olho do furacão”, incorporados de diversas maneiras ao modus operandi. Assim, depois desse diagnóstico podemos produzir como os “Engenheiros do Hawaii” uma nova “arquitetura” sedimentada em horizontes irruptivos, motivados igualmente por uma das mensagens da canção Dom Quixote: “por amor às causas perdidas”.
Leonardo Venicius Parreira Proto – bacharel e licenciado em História pela PUC-GO, especialista em adolescência e juventude no mundo contemporâneo pela Faculdade Jesuíta (FAJE-MG), mestrando em História pela UFG e bolsista da CAPES. Coordena o curso de História da UEG/UnU-Iporá.