Planeta Educação

Aprender com as Diferenças

 

Educação inclusiva
Razão e sensibilidade em um cenário educacional desfavorável

Adriangela Bonetti é Pedagoga, Pós-graduada em Administração, Supervisão e Orientação Educacional, Coordenadora-pedagógica de Educação Inclusiva - E-mail: adriangelabonetti@yahoo.com.br

Desde o alvorecer da civilização humana, a transmissão do conhecimento de geração a geração constitui a mais sagrada e essencial das tarefas. O professor, o educador, o mestre é quem conduz a chama viva do conhecimento. 

E a sala de aula é o terreno consagrado para o ensino, o lugar para a reflexão, o crescimento e a iluminação. No século XXI, no entanto, com a geração digital e todos os demais estímulos a que todos estamos expostos diariamente em uma complexa sociedade informatizada, o desafio da educação assume proporções avassaladoras em qualidade, quantidade e variedade. 

No olho desse furacão, encontra-se o educador, sempre dividido num dilema constante entre o idealismo e a realidade da profissão, numa verdadeira luta corpo a corpo frente às novas gerações (DVD Educação Especial).

Nesse universo de educadores, há aqueles que facilmente adaptam-se às muitas e drásticas mudanças na educação, mostrando-se, assim, resilientes ao contexto, o suficiente para se manter na profissão com certo grau de “conforto” e sem sofrer frustrações ou amarguras.

Porém, precisamos considerar que nem todos os educadores possuem as mesmas habilidades e competências e, por isso, sofrem com as mudanças na educação, em especial com aquelas que tendem a se tornar permanentes e com as quais não conseguem se adaptar de forma desejada.

A realidade aqui citada por si só já seria o bastante para estremecer qualquer profissional da educação que não estivesse bem convicto e atualizado nas suas práticas educacionais, pois a geração contemporânea não se insere em um modelo educacional, no qual os alunos são seres passivos, em que as salas de aula são espaços de aprendizagem padronizada, uniforme e classificatória. 

Antes, esta geração exige um espaço educacional diversificado, com recursos e estímulos variados, no qual possam interagir constantemente com o objeto a ser aprendido, manifestando-se de diversas formas e, acima de tudo, tendo suas individualidades identificadas, respeitadas e atendidas.

Quando se diz que é necessário atender e respeitar as individualidades dos alunos, não estamos nos referindo, exclusivamente, a dificuldades ou limitações oriundas de patologias ou qualquer outro quadro clínico que alguns dos estudantes possam apresentar. 

Antes, referimo-nos a qualquer diferença existente, que é própria de cada pessoa e que todos nós, num grau menor ou maior, possuímos e que está diretamente relacionada ou interferindo na nossa capacidade de aprender.

Algumas dessas diferenças são: timidez, pobreza extrema, maus-tratos, diferenças culturais e religiosas, problemas de saúde não diagnosticados, desestrutura familiar, problemas emocionais, ritmo e modo de aprender e assim por diante. A lista é muito extensa. 

Certamente que nos enquadramos em alguma ou algumas dessas diferenças. São, dentre outras, fontes produtoras dessas diferenças: a constituição humana, o contexto sociocultural, o descaso de alguns governantes em pensar políticas para amenizar os problemas sociais e educacionais, a negligência de membros de famílias com a saúde e bem-estar das crianças, a ausência de recursos adequados e necessários ao ensino de qualidade etc.

Por possuir uma ou mais dessas diferenças, aluno e professor necessitam e merecem ser atendidos corretamente, a fim de não haver prejuízos para ambos no processo ensino-aprendizagem. Sobre as diferenças mencionadas, para muitos de nós educadores constitui-se um verdadeiro desafio identificá-las, compreendê-las e atendê-las. 

Porém, o desafio se torna ainda maior quando somos, repentinamente, por força de lei, obrigados a matricular, atender e ensinar pessoas com necessidades especiais na escola regular, a qual ainda não recebeu as devidas adequações para oferecer atendimento de qualidade a esta nova demanda.

Tal obrigatoriedade origina-se do fato de que, principalmente nos últimos anos, a educação inclusiva conquistou espaço na pauta das prioridades e atenção daqueles que de alguma forma fazem a educação em nosso país. Já não era sem tempo! 

Embora em se tratando de um tema tão controvertido, há um consenso entre educadores de que os alunos devidamente matriculados em uma instituição de ensino devem e podem desenvolver aprendizagens. Não há consenso, porém, entre esses mesmos educadores, de que todos os alunos possam desenvolver aprendizagens, principalmente no contexto da escola regular.

Essa notável divergência entre educadores na forma de conceber a capacidade de aprender e o direito de todos à educação pode ser explicada pela educação que receberam, pela formação profissional que desenvolveram, pela cultura que possuem, pelas suas crenças, valores, meio e ainda por fatores pessoais e sociais envolvidos, e que nem sempre são identificados e conhecidos por quem os possui. 

Todavia, independentemente do grupo com o qual nos identifiquemos ou nos classifiquemos, todos os que de alguma forma fazem educação devem observar o prescrito no artigo 1º da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948: “Todasas pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade.” A educação inclusiva é de responsabilidade compartilhada.

O artigo 227, caput, da Constituição Federal de 1988, prevê como responsáveis por assegurar o direito à educação “a família, a sociedade e o Estado”. Nessa divisão de responsabilidades, compete aos educadores a tarefa árdua de aprimorar ou desenvolver uma prática pedagógica diferenciada. 

Essa prática deve prezar pela estimulação cognitiva de todos os alunos, ser adequada e capaz de incluir todos no mesmo tempo e espaço da escola regular e possibilitar, por meio de recursos e estratégias diversificados que todos desenvolvam habilidades e competências essenciais à vida e à convivência com a diversidade na sala de aula e na sociedade, conforme suas capacidades intelectuais e físicas lhes permitirem.

Porém, quando se trata de ensinar a todos os alunos no mesmo tempo e espaço da escola regular, talvez, apressadamente, nos reportemos àqueles alunos que, do nosso ponto de vista muitas vezes equivocado ou desinformado, não podem ou não conseguem aprender; ou pensemos que, além de todas as “atribuições” novas dos educadores, dentre elas as de ser médico enfermeiro, psicólogo, terapeuta, assistente social, conselheiro ou ainda servir in loco parentis, requer-se deles, também, que incluam em suas salas regulares pessoas que até então não faziam parte da clientela das escolas.

Esse pensamento, num primeiro momento, é até aceitável e compreensível, considerando que durante séculos, nas instituições de ensino, imperou o princípio da homogeneidade das classes escolares, do ensino padronizado, uniformizado, que por muito tempo “deu certo”, já que “todos aprendiam” as “mesmas coisas”, ao “mesmo tempo” e com o “mesmo método”. 

Mas isso, de fato, nunca aconteceu! Os humanos sempre foram diferentes e dessa forma sempre tiveram mais facilidade em algumas áreas e dificuldades em outras, e desenvolveram interesse maior por um ou por outro conteúdo; ou, ainda, nunca dependeram de um ensino formal para serem necessários e úteis à sociedade, como exemplificado por Papalia e Olds, apud Schulman, 1986:

"Nelson Rockefeller, que já foi vice-presidente dos Estados Unidos, tinha tantos problemas de leitura que improvisava seus discursos em vez de usar um roteiro. O inventor Thomas Edison nunca aprendeu como soletrar ou escrever de maneira gramatical. O General George Patton, herói na Segunda Guerra, lia mal e passou pela academia militar de West Point memorizando palestras inteiras." (2000, p. 274)

Como é possível observar dos exemplos acima mencionados, cada indivíduo tem a capacidade de desenvolver estratégias próprias de aprendizagem. Como, então, conceber que em alguma época na história da humanidade pessoas das mais diversas formações aprendessem as mesmas coisas num mesmo ritmo e com o mesmo método?

O que aconteceu, e que todos nós - senão a maioria -, sabemos é que a humanidade viveu uma época ou épocas em que nada ou muito pouco do que acontecia era questionado ou investigado. Só a partir de um determinado momento é que algumas poucas almas começaram a arriscar e até perder suas vidas para expor um ponto de vista diferente do então aceito pelas massas. 

Tomemos como exemplo dentre outros Martinho Lutero e Galileu Galilei, que, corajosamente enfrentaram a então dominante e hegemônica Igreja Católica por volta do século XVI, negando-se a aceitar alguns de seus dogmas.

A diversidade na raça humana sempre esteve muito presente em todas as épocas, mas nem sempre foi reconhecida, interpretada e aceita, isso porque, muitas vezes, representa desconforto, angústia, medo e insegurança para muitos, devido à necessidade de conhecimentos, adequações e buscas constantes para compreendê-la corretamente, valorizá-la e atendê-la. 

Com esta introdução, pretende-se levar o leitor a refletir no quanto ainda preservamos de nossos primórdios; o quanto conservamos práticas, ideias e conceitos, mesmo tendo evoluído significativamente em todos esses. Nas palavras de Goethe: “Que criatura de saber precoce e prática tardia é o homem!” (Viagem à Itália – 1786/1788).

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