Matemática
O Contrato Didático
Análise de um trecho do Livro “Didática da Matemática” de Saddo Ag Almoloud
Fazer uma autoavaliação da prática docente deve ser um exercício contínuo dos educadores, e nesta revisão um dos importantes itens a ser observado é o Contrato Didático.
O Contrato Didático é definido por Guy Brousseau como sendo a totalidade de comportamentos do docente esperados pelo aluno e a totalidade dos comportamentos do aluno que são esperados por esse docente, ou seja, são as expectativas do professor em relação ao aluno e deste em relação ao professor, incluindo-se o saber e as maneiras como esse saber é tratado por ambas as partes.
É importante diferenciar o Contrato Didático do Contrato Pedagógico, visto que este último é gerido de relações sociais, atitudes, regras e convenções, porém não coloca em jogo o saber. Esse saber é específico do contrato didático, o qual é influenciado pelos contextos de ensino e aprendizagem.
A partir do momento em que o contrato é mal-administrado ou qualquer uma das partes (professor ou aluno) não o respeitam, será necessária sua ruptura e consequentemente sua renegociação. Com este fato, podem emergir fatores tanto positivos quanto negativos na aprendizagem.
Substituir a maneira de apresentar um determinado saber pode ser identificado como quebra de contrato, seja na abstração geométrica ou na resolução de problemas. E é neste momento que o professor deve atentar-se para as dificuldades que poderão surgir por parte dos alunos.
O trabalho com a resolução de problemas é uma forma de criar experiências valiosas nos processos de matemática, porém o professor deve ter atenção aos tipos de problemas que irá propor.
Geralmente são trabalhados, com os alunos, os problemas fechados (aqueles que são resolvidos, fazendo-se uma “conta”). Esses até podem continuar sendo trabalhados, porém não de forma sistematizada e única como o professor costuma trabalhar.
O aluno carece da percepção de que aquela não é a única forma de resolver o problema, porém isso é vigente no contrato didático pactuado. Acreditar que um problema é resolvido através de uma conta e que, seu enunciado dá pistas sobre qual operação utilizar são “cláusulas” do Contrato Didático firmado em sala de aula.
O professor ao propor problemas abertos (aqueles que são resolvidos por diversos meios), problemas que não tenham solução, que tenham mais de uma solução ou problemas com dados em demasia, faz com que o aluno sinta dificuldades em resolvê-los, justamente em virtude do Contrato Didático.
Negociar continuamente o contrato pode tirar o verdadeiro caráter dos conteúdos matemáticos, pois o professor tende a “ajudar” o aluno a acertar através de diversas atitudes ou práticas (rupturas de contrato). Com isso concluímos que a mediação do professor é importante, porém não pode interferir no processo de autoconstrução do conhecimento dos alunos.
Alguns efeitos do contrato didático podem emergir.
O efeito “Pigmaleão” é um deles, onde o professor limita suas expectativas e cobranças em relação aos alunos pela imagem que cria sobre eles, ou seja, não avança com a turma ou com um determinado aluno.
Quando o professor institui circunstâncias para o aluno superar dificuldades, porém sem seu genuíno engajamento pessoal é chamado efeito “Topaze”. Aqui o professor seleciona questões que tenham respostas “prontas”, ou então questões que incitam respostas esperadas. Isso pode guiar para o desaparecimento do conhecimento visado.
O efeito “Jordain” acontece quando o professor utiliza conhecimentos dos alunos (que não são os conhecimentos corretos, porém que cheguem às respostas) para apresentar e desenvolver com os alunos o conhecimento de fato visado.
O deslize metacognitivo acontece quando o professor faz uso de técnicas úteis para solucionar determinados problemas e não prioriza o legítimo saber a desenvolver.
A utilização constante de analogia também pode ser um efeito a ocorrer. Mostrar um saber analogamente a outro, pode ter seu lado positivo, porém pode descaracterizar esse novo saber. Com isso, o professor deve mediar quando utilizar tais analogias.
Ao examinar estes efeitos, percebe-se que o professor fica em um “fogo cruzado”, pois ao mesmo tempo em que precisa criar situações para a aprendizagem, será que sua prática em sala de aula não está atrapalhando essa aprendizagem?
Enfim, entende-se através deste fragmento do livro de Saddo Ag Almouloud que o contrato didático é uma relação de tamanha importância para a aprendizagem significativa do aluno, e às vezes o professor não tem consciência de sua importância e como fazer uso dele de maneira eficaz para a prática docente.