Planeta Literatura
Por que lemos literatura?
Isabel Furini
Lemos porque queremos entender a realidade de outro ponto de vista ou porque precisamos fugir dela por um momento para voltar mais lúcidos.
Lemos livros de ficção porque queremos saber como os outros vivem, enfrentam os problemas, como vencem ou como sucumbem. Lemos porque queremos ver refletido nosso eu no mundo dos personagens.
A força do teatro é o arroubamento emocional, a participação grupal – que alimente, além do instinto estético, o instinto gregário do ser humano. Os espectadores estão na mesma sala assistindo à peça.
Ao contrário do teatro, a leitura é atividade solitária. Podemos falar sobre um livro com um amigo, familiar ou colega de trabalho. Mas lemos e nos emocionamos sozinhos. Contudo, um bom livro nos ajuda a suportar melhor a solidão. Por isso, os livros foram chamados de “bons amigos”. Estão sempre esperando os leitores.
No teatro, os personagens estão diante do espectador, podemos olhar os personagens. A leitura, ao contrário, coloca em jogo a imaginação do leitor. No teatro as reações de qualquer pessoa da plateia podem ser observadas pelos outros.
A leitura dá lugar a expressões – como rir, chorar ― que muitas vezes, a pessoa oculta em público. Tanto a leitura de obras ficcionais quanto o teatro têm função catártica, mas as estradas são diferentes.
No final de uma peça, o público aplaude. Ao terminamos de ler um livro também podemos sentir desejos de aplaudir ou de criticar. Mas aplaudimos ou criticamos mentalmente.
Também podemos escrever nossas impressões ou procurar outras pessoas para fazer comentários ou trocar opiniões. Por isso é tão importante a criação de clubes de leitura. O ser humano é gregário e precisa de outros para dialogar e crescer.
Podemos entender que o esforço do escritor é ciclópeo. Ele precisa encontrar caminhos para chegar à mente do leitor e despertar o interesse. O importante é cultivar o hábito da leitura seja como fonte de informações, como caminho de autoconhecimento ou simples entretenimento.
Em síntese, lemos literatura para interpretar o mundo, para esquadrinhar a alma humana, para conhecer, para compreender, para sair do dia a dia rotineiro. Ítalo Calvino, Julio Cortázar e outros aconselham ler os clássicos.
Os clássicos passam valores enquanto desenvolvem histórias.O escritor Jorge Luiz Borges dizia que ler deve ser um ato prazeroso. Ler é vital para nosso desenvolvimento como seres humanos.
Por que escrevemos?
A criação literária é como a frágua de Vulcano. Escrever nunca é morno.
Escrever é angústia, raiva, incêndio, esperança, fingimento e desespero. É criar castelos de areia com palavras e temer a ventania.
Escrever é emoção primitiva, instinto de autoexpressão. É gritar, usando corretamente a linguagem. É, então, grito medido, sofisticado – chamo isso de fingimento – pois é grito visceral, mas contido. Educado para expressar-se através de figuras estilísticas, discursos e silêncios, focos narrativos e personagens.
Escrever é colocar rédea nos cavalos da emoção. Civilizar a cólera. Contê-la para não expor em demasia esse eu paradoxal que deseja expressar-se e ora aparece, ora volta-se sobre si mesmo.
Escrever é, às vezes, um ato de coragem e outras, um ato de estupidez. Mas sempre uma busca de catarse.
O texto é o produto do transbordar de um eu – Netuno, escondido nas águas do inconsciente. E é esse eu desconhecido que brinca com as palavras... deleita-se com as próprias histórias e incentiva o leitor a navegar no tempestuoso mar da literatura.
Como escrever um poema
Poema nasce da alma (se você não acredita em alma, pense que o poema nasce em algum lugar desconhecido do hemisfério cerebral direito – o da criatividade). Como mensagem, todo poema tem seu valor. Agora, se vamos falar tecnicamente, o discurso muda. Você pode se perguntar o que faz um poema ser amado e outro ser desprezado.
Bem, não existe uma regra nem um critério universal. A Poesia não é ciência, não é objetiva. Ela atinge diretamente nossa subjetividade. Uns gostam de rima, outros não. Alguns adoram sonetos, outros detestam.
Há os fanáticos do Haikai e os que acham chato tanta economia de versos (o haikai é formado de 17 sons, distribuídos em três versos de 5, 7 e 5 respectivamente).
Uma das características da poesia contemporânea é a quebra de paradigmas. O poeta precisa inovar. A imagem também adquire um lugar predominante na literatura contemporânea.
A poesia não pode fugir disso.Uma obra de ficção precisa de descrições detalhadas e ponto de vista original, a poesia precisa de imagens, só que devem ser rápidas e de impacto.
A figura de estilo chamada enumeração também dá força ao poema. Apresenta sucessivamente vários elementos ou justapõe palavras. Também é valorizada a enumeração caótica com elementos que parecem dispostos ao acaso como nos poemas de Ruy Belo:
"Cão que
matinalmente farejava a calçada/
as ervas os calhaus os seixos
e os /paralelepípedos
/ os restos de comida os
restos de manhã / a
chuva antes caída..."
Agora,
poesia é criatividade, por isso ninguém pode dar
parâmetros fixos. Então, vamos escrever ao som de
nossa alma. Uns amarão e outros vão odiar. Esse
é preço da ousadia.
Isabel Furini é escritora e palestrante, autora de
“O Livro do escritor”, da editora Instituto
Memória de Curitiba.