Planeta Educação

De Olho na História

João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

Memórias do Coliseu
Gladiadores em combate

Imagem-de-Coliseu
O Coliseu foi o principal palco das lutas entre
gladiadores na Roma Antiga.

Capturado nos confins da Germânia, durante guerras travadas entre os romanos e meu povo, fui transformado em escravo e, como todos aqueles que possuíam qualidades reconhecidas na arte da guerra, fui transportado para uma localidade onde eram realizados os combates entre gladiadores. No mercado de escravos dessa cidade, uma reprodução em menor escala da grandiosa Roma, com prédios assemelhados ao Fórum, aos templos dedicados aos deuses romanos, as termas e, ainda, uma réplica do Coliseu, fui vendido a uma escola de gladiadores, para iniciar treinamentos.

Apesar de ser forte (o que foi comprovado a partir de meus dentes, que davam aos compradores de escravos a noção clara de que a ossatura de cada cativo era reforçada) e de ter experiência em combate, fui submetido a rigoroso treinamento físico e, ao mesmo tempo, introduzido às armas utilizadas regularmente em combates travados entre gladiadores.

Não era o único homem a vivenciar essa experiência, além de mim pude contar outros trinta escravos sendo preparados para lutar nas arenas, apenas na escola onde eu estava. Vinham de diferentes regiões anexadas ao Império, alguns da Ásia Menor, outros da Gália, vários africanos e mesmo alguns bretões e dois francos. Todos tinham em comum uma grande habilidade no manejo de escudos, arcos e flechas, espadas e outros armamentos, além do que, eram todos muito fortes.

Durante o período inicial de treinamento usávamos armas de madeira para que não machucássemos nossos oponentes, todos membros de uma mesma escola ou equipe. Com o auxílio de um experiente gladiador, vencedor de várias batalhas, inclusive no Coliseu, aprendemos diversas técnicas e pudemos aprimorar nossa forma física para que pudéssemos estrear o mais rapidamente possível em um dos vários torneios organizados pelo Império ou pelos ricos políticos e comerciantes das maiores cidades romanas.

Imagens-e-equipamentos-recuperados Imagens-e-equipamentos-recuperados
Imagens e equipamentos recuperados por pesquisadores permitiram que
modernamente pudéssemos reconstituir as batalhas campais entre os
gladiadores. Além disso, há documentos escritos que narram esses eventos.

Recordo-me, com clareza que, nas semanas que antecediam as lutas de gladiadores, eram espalhados cartazes pelas ruas principais das cidades divulgando o acontecimento. Na maior parte desses eventos não se cobrava ingressos, por isso mesmo, muitas pessoas começaram a perceber que os políticos queriam, com isso, ganhar apoio do povo, especialmente dos plebeus.

Como nesse período era regular a distribuição de alimentos pelo Império, muitas pessoas começaram a relacionar os acontecimentos e nomearam o livre acesso aos jogos romanos (além das lutas de gladiadores também existiam as corridas de bigas e os eventos com animais selvagens como leões, tigres, panteras, elefantes,...) e a cessão gratuita de alimentos como "política do pão e circo".

Outra peculiaridade das batalhas entre gladiadores refere-se ao fato de que existiam várias armas e equipamentos de defesa, como as espadas, o tridente, a rede, a lança, facas, escudos, capacetes, armaduras de proteção do peitoral,...

Alguns gladiadores acabavam se especializando na utilização de determinados tipos de armas e, em determinados casos, acabavam derrotados e mortos por conta de suas escolhas já que nem sempre tínhamos a opção da escolha das armas com as quais enfrentaríamos nossos oponentes e, quando isso acontecia, os lutadores muito especializados se tornavam presas fáceis por não possuírem um manejo rápido e eficiente das demais armas.

Era comum que ocorressem apostas entre as pessoas que freqüentavam as arenas. Elas apostavam nos lutadores ou nas equipes que eram colocadas frente a frente para lutar nos jogos.

Os gladiadores lutavam, na maior parte das vezes, sozinhos contra seus oponentes. Entretanto, algumas vezes eram organizados confrontos entre equipes formadas por duplas, trios, quartetos ou mesmo por um maior números de integrantes.

Imagens-de- armas-dos-gladiadores
A imagem acima nos mostra as armas dos gladiadores, como as adagas (dagger), lanças
(spear), redes (net), tridentes (trident), cordas, espadas, capacetes (helmet), protetores
de joelho e tornozelo (greaves), protetores dos braços (chain mail) e os escudos (shields).

Nas lutas o objetivo maior era sobreviver. Isso significava que, na prática, tínhamos que vencer a luta e, ao derrotar nosso oponente, executá-lo a pedido do público. Sempre que um lutador ficava de pé, em triunfo diante de seu adversário, ele olhava para o público a espera do sinal que definia se o derrotado merecia viver ou morrer. Esse sinal consistia num gesto em que os polegares eram colocados para cima ou para baixo. Caso a maioria colocasse os polegares para cima, significava que o derrotado merecia viver, pois fora um lutador bravo, valente e dedicado no combate. Se o público apontasse o polegar para baixo o derrotado deveria ser executado, pois fora fraco, fugira do combate ou fora dominado amplamente pelo seu oponente.

O público só poderia ser contrariado se sua opinião se confrontasse com a do imperador romano, quando o mesmo estivesse presente no Coliseu.

Diga-se de passagem, que o Coliseu, por si só, era um verdadeiro colosso. A primeira vez em que estive no maior de todos os palcos reservados aos gladiadores, me surpreendi com a quantidade de pessoas que podiam se acomodar em suas arquibancadas, cerca de cinqüenta mil!

Imagem-de-arena-com-leao-e-pessoas Imagem-de-gladiador-com-uma-arma-e-um-escudo
Além das lutas de gladiadores, as arenas eram utilizadas para sacrificar os inimigos do império em confrontos desiguais com feras selvagens como leões, tigres e panteras. Os gladiadores entravam nas arenas tendo a sua disposição uma arma e um equipamento de proteção, como podemos observar na miniatura a esquerda.

Algumas áreas eram cobertas por lonas para proteger os espectadores do calor excessivo ou ainda do frio e da chuva. A arena, coberta de terra, era na verdade de madeira e, logo abaixo do local onde estávamos travando nossos combates, ficavam as feras que seriam utilizadas em outros espetáculos. Diziam que o sangue que escorria dos gladiadores derrotados atiçava os famintos animais para que eles perseguissem os oponentes do Império, entre os quais, nessa época (séculos I e II d.C.), se destacavam os cristãos.

Quanto a mim, posso lhes garantir que, depois de muitos anos pelejando por arenas mal-cuidadas ou ainda tendo a possibilidade de enfrentar grandes e poderosos oponentes no Coliseu, me tornei um grande vencedor, recebendo como prêmio desde jantares fabulosos, muito vinho, mulheres lindíssimas e a confiança de meu dono para que me tornasse instrutor de novos gladiadores, até alcançar o prêmio máximo dado a qualquer um de nós, a liberdade...


Obs.: Para maiores informações assista aos filmes "Gladiador" e "Spartacus" e confira os artigos sobre esses filmes, disponíveis na coluna Cinema e Educação do Planeta Educação.

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