Superproteção
Deise Fernandes
Em algum momento de
nossas vidas temos necessidade de proteção, de
nos sentirmos acolhidos, acarinhados e, até mesmo, que o
outro nos defenda, resolva todos os nossos problemas; que
não precisemos fazer nada, apenas ficarmos quietos e, de
preferência, deitados no colo de nosso protetor.
Quando somos bebês, essa é uma
condição fundamental, não temos
maturidade e nem força física para podermos nos
cuidar. O Homem é um animal que demora muito tempo para
conseguir assumir sua independência.
A questão é que muitos de nós temos
dificuldade de saber quando termina a época do
“bebê” e começa a da
independência. Tanto nossos pais como nós, filhos,
temos essa dificuldade de avaliação, e quanto
mais isso não ficar claro, mais e maior acontecem os
equívocos.
Se somarmos ainda uma deficiência, as dificuldades,
dúvidas, inseguranças aumentam muito! Os pais
não recebem um manual de como educar seus filhos, a
educação tem de ser feita por tentativa e erro ou
baseada na educação que receberam, que
também não contava com nenhum manual e, portanto,
não são perfeitas. Tudo isso se potencializa
quando existe uma deficiência.
Não sei onde começa, mas em algum momento a
proteção que é benéfica
evolui para superproteção que, invariavelmente,
traz sofrimento.
As inseguranças de pais e filhos os levam a se protegerem
além do necessário, segurando uns aos outros para
que possam aguentar os desafios, que de fato não
são fáceis! Mas, os resultados dessa
relação acabam sendo prejudiciais aos protetores
e aos protegidos. Vamos desenvolvendo, em nós, mais
inseguranças e mais necessidade de
proteção, e vira um círculo vicioso.
A única solução é enfrentar
nossos medos, nos conhecer melhor, nos aceitar como somos, conseguir
ter coragem de enfrentar nossos Leões e, devagar, no nosso
ritmo, superarmos os limites, que na grande maioria são
criados por nossos receios e falta de conhecimento.
Minha experiência de 53 anos e cega desde os 15, mostra que
no fim e a cabo, quem determina como seremos tratados somos
nós mesmos! Independente de como os outros nos enxergam ou
de suas expectativas em relação a nós,
somos donos da batuta e, queiramos ou não, acreditemos ou
não, somos nós que somos o Maestro.
Lembro-me que quando fiquei cega houve grande confusão e
equívocos tanto da parte de meus pais como da minha, e a
primeira ação é de nos fortalecer, nos
deixando proteger por nossos pais e eles, por sua vez,
também se sentem responsáveis em nos Proteger.
Tem também a questão do que transmitimos para os
outros, do quanto demonstramos inseguranças e medos. Hoje
sou mãe e trato meus filhos de acordo com o que eles
demonstram, um com mais cuidado, outro mais solto, outro ainda com
muita insegurança. Como mãe, quanto mais me sinto
segura, mais não me sinto responsável em proteger.
No fundo, em definitivo, cada um de nós é que
alimentamos o que pensam e como nos tratam, somos de fato os Maestros
de nossas Vidas.
A música, o tom, o ritmo dependem do que queremos, do que
gostamos, de nosso propósito de vida, nossos objetivos, que
nem sempre são claros.
Hoje, quando lembro de alguns fatos passados, percebo que nem sempre
sabia o que estava fazendo, mas existia uma força interior
muito mais forte do que eu, e que me impulsionava para continuar, para
não desistir, para tentar outra vez e, às vezes,
na verdade inúmeras vezes, para bater de frente com os
“protetores”, que vinham através dos
outros, mas também por mim mesma.
Aqueles famosos “Não vai dar certo!”,
“Você não vai aguentar” ,
“É muito difícil”,
“Nunca ninguém conseguiu”, e minha voz
interior: “Não sei como fazer... É
muito grande pra mim... eu não merecia isso! Coitadinha de
mim...”.
Enfrentar esses limitadores não é uma tarefa
fácil para ninguém, e quando temos uma
deficiência, que não sabemos direito como superar,
causando insegurança e medo, os sentimentos e pensamentos
negativos somados aos reforços externos, particularmente de
nossos amigos e familiares, podem nos imobilizar totalmente.
Para mim, de longe, esse é o maior desafio.
Superar nossos medos e inseguranças. Acreditar no nosso
potencial. Assumir os riscos e sacrifícios em busca de
nossos sonhos. Saber ouvir o coração e se deixar
guiar por ele. Ser amável, compreensiva, mas não
se deixar influenciar pelos outros. Em definitivo, se conseguirmos
desenvolver tudo isso em nós, seremos capazes de conquistar
a Felicidade.
Deise Fernandes: PRD - Departamento de Desenvolvimento de
Pessoas/Consultora Interna de RH.