Cinema na Educação
O Poder das Imagens Cinematográficas
Filmes como ferramenta de aprendizagem interdisciplinar
No oceano da ignorância sempre existem ilhas de racionalidade às quais precisamos aportar. Os saberes constituintes dessas ilhas organizam-se em função das ações humanas, sejam de natureza cultural, científica ou prática. Sendo assim, volta a nos conclamar à importância das disciplinas científicas, norteadoras dos caminhos a serem seguidos no naufrágio da ignorância. A prática interdisciplinar necessita de disciplinas que atendam todas as suas necessidades, sejam ou não científicas. (FAZENDA, Ivani Catarina. Interdisciplinaridade na educação brasileira: 20 anos. São Paulo: Criarp, 2006)
O que é Interdisciplinaridade? À primeira vista o conceito de interdisciplinaridade refere-se à interação, encontro e relação de proximidade que se estabelece como modalidade de pensamento, estudo, reflexão e compreensão de mundo entre as diferentes disciplinas ou áreas do saber.
Devemos, no entanto, estar atentos ao fato de que tais encontros acontecem em diferentes níveis, o que propicia a compreensão do fenômeno em pelo menos quatro diferentes instâncias identificadas pelos estudiosos e pesquisadores, a saber: a multidisciplinaridade, a pluridisciplinaridade, a interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade.
Cada um destes termos refere-se a degraus a serem atingidos até que a relação entre os diferentes saberes e campos do conhecimento humano se estabeleça com o máximo de força possível. Apesar de inúmeros estabelecimentos de ensino no Brasil apregoar que realizam projetos interdisciplinares, não é exatamente isso o que acontece na prática.
Há uma enorme distância entre a teoria e a ação e, a efetivação de qualquer prática realmente interdisciplinar supõe não apenas a compreensão do conceito, mas à mudança de comportamentos e formas de pensar que estão arraigadas entre nós desde a consolidação do moderno pensamento científico, que dividiu os saberes em “caixinhas” ou disciplinas. Ao se realizar essa divisão, a proposta era facilitar a compreensão, o estudo e as pesquisas sobre todos os assuntos.
Escrevi um artigo ressaltando as possibilidades do Cinema e dos filmes como elementos de aprendizagem interdisciplinar [A Interdisciplinaridade nas Telas] e, em oficina realizada no município de Bertioga, levei este artigo para a discussão e apreciação da ideia. Para tanto, estruturei a apresentação usando as bases do texto, dividido em quatro cenas de filmes e apresentei as sequências das referidas produções cinematográficas como elemento de discussão adicional. O que pudemos perceber é que, realmente, a partir da ação desenvolvida, ficou claríssimo o caráter interdisciplinar dos filmes.
Pudemos ler ao longo das projeções, refletindo em grupo, partindo também do texto mencionado, que no celuloide há inúmeras mensagens e várias disciplinas sendo trabalhadas ao mesmo tempo sem que fique clara qualquer divisão ou linha fronteiriça demarcatória entre os distintos campos do conhecimento ou disciplinas. Nessa oportunidade, pudemos referendar não apenas o que estava sendo dito no texto, mas principalmente, perceber ainda mais o valor do cinema e da cultura em geral para a educação.
Para melhor perceber esta possibilidade, apresento a seguir o exemplo de ação desenvolvida pela professora Andreia, de Cabo Frio, no Rio de Janeiro, a partir do depoimento espontâneo dado por ela nos comentários do filme “FormiguinhaZ”.
Trabalhei este filme para uma sexta série, num período de greve (branca) nas escolas do Estado. Eu estava me sentindo mal por não ter aderido à greve desta vez e queria contribuir de alguma forma. Acho que fiz a minha parte e surtiu muito mais efeito do que se estivesse em greve. As formigas foram uma excelente metáfora para retratar a nossa luta, que às vezes parece mesmo ser assim tão pequena, tão minúscula, mas não menos importante por isso! É muito importante sabermos manter a nossa individualidade, mas sem nos isolarmos, o que infelizmente tem sido tão comum a muitos. Só quando nos permitimos trabalhar em grupo é que aprendemos verdadeiramente a lidar com as diferenças, das mais variadas, a amarmos aquele que de nós difere e entendemos que só chegaremos a algum lugar se formos de mãos dadas. É preciso UNIÃO, sempre, para tudo. (Andreia - Cabo Frio/RJ)
O comentário da professora Andreia nos dá uma clara ideia da proximidade entre a arte e a vida. Sabem aquele velho chavão, "a arte imita a vida"? Pois é... E por que nos referimos a ele? Pelo simples fato de que a aproximação dos saberes trabalhados nas escolas com os acontecimentos da vida cotidiana de nossos alunos é, por si só, um elemento que desperta os estudantes para uma participação mais ativa e, até mesmo, empolgada, para os trabalhos desenvolvidos em sala de aula.
Nesse sentido, ao usarmos um filme, sabendo exatamente as principais ideias destacadas nele e as sequências chaves em que tais proposições estão sendo trabalhadas, podemos fazer com que as produções cinematográficas orientem debates, projetos em grupo, tarefas, produções em sala de aula...
O exemplo do filme "FormiguinhaZ" é caso típico e clássico nesse sentido. As abordagens relativas ao trabalho em equipe, como mencionado pela professora de Cabo Frio, são maravilhosas para que os professores ensejem entre os educandos práticas de produção coletiva e cooperativa. Não apenas no sentido da produção, mas também no congraçamento coletivo em torno de ideias e ideais (que transparecem, inclusive, na alusão feita pela professora em seu comentário, no paralelo entre a greve branca dos educadores e a união das formigas na animação).
E isso é possível fazer com inúmeras produções... Basta colocarmos nossa memória para resgatar esses trechos no caso de filmes já assistidos ou, ainda, prestar bastante atenção naqueles que ainda veremos para que percebamos possibilidades neles tais oportunidades...