Cinema na Educação
A moça que dançou depois de morta
Porta Curtas Petrobras - Direção de Ítalo Cajueiro
Em tempos de computadores e internet é pouco comum falar de xilogravura ou da arte dos repentistas, poetas populares que criam rimas e dão ritmo musical aos versos por eles elaborados ao sabor de desafios ou das palmas do público. A xilogravura, por sua vez, arte ancestral que fincou raízes e desenvolveu estilo próprio em terras do nordeste brasileiro, virou curiosidade apenas a partir de menções em livros ou mostras em museus.
Tanto uma quanto a outra sobrevivem nas ruas de grandes cidades brasileiras daquela região, como Recife, Natal, São Luís, Teresina ou mesmo Salvador a partir da curiosidade que motiva turistas que por ali passam. Os duelos de repentistas já se tornaram parte do calendário de algumas localidades e, misturados a outras tradições locais, como festas e eventos gastronômicos, acontecem de forma esporádica e, apesar de estarem entre o que há de mais típico na cultura sertaneja local, não atraem os mais jovens, não motivam a renovação dos artistas.
A xilogravura mantém-se através de outra riquíssima tradição cultural nordestina, a literatura de cordel. Mas, em tempos tão tecnológicos, que graça parece haver em tão rudimentares artes, pensam aqueles que vivem plugados, maravilhados e hipnotizados pela web e por tantas outras mídias eletrônicas.
A moça que dançou depois de morta, história contada pela literatura de cordel nordestina, a partir da obra e talento de mestre José Francisco Borges (ou J. Borges, como é mais conhecido), talentosíssimo artista da xilogravura e contador de histórias da região, adaptada para as telas pelas mãos do diretor Ítalo Cajueiro, busca não apenas contar uma história interessante, mas principalmente valorizar tanto a xilogravura quanto os repentistas e a literatura de cordel.
E se não bastasse isto, vai além ao nos colocar em contato com um caso verdadeiro, daqueles que dão um friozinho na barriga, que nos colocam em contato com o além, o sobrenatural... Quem não fica intrigado com “causos” como este relatado nesta produção?
Discute ainda a mudança dos hábitos que, perniciosa e rápida, devora e condena a extinção algumas das mais ricas tradições culturais brasileiras provenientes do nordeste, entre os quais os próprios elementos utilizados para contar esta história de amor entre vivos e mortos, substituídos que estão sendo pelas novas gerações, por insumos importados...
Ítalo Cajueiro montou um belíssimo libelo em favor do cordel, da xilogravura e dos repentistas e, para isto, utilizou-se de toda a sabedoria e talento de quem ainda preserva, persevera e luta por estes marcos da brasilidade sertaneja e nordestina, como mestre J. Borges, que compôs todo o trabalho visual do curta-metragem a partir da xilogravura e concebeu a história desta moça que dançou depois de morta...
Por João Luís de Almeida Machado, que sempre admirou a arte e a fibra do sertanejo e que espera, sinceramente, que assim como a moça que dançou depois de morta, também estas artes ressurjam com toda a força e intensidade, como a Fênix...