Cinema na Educação
Clandestina Felicidade
Porta Curtas Petrobras - Direção de Beto Normal e Marcelo Gomes
Onde está a felicidade? O que é a felicidade? Se estas questões são difíceis de responder para um adulto, imaginem então para as crianças. A princípio é o que podemos pensar quando nos colocamos a refletir acerca de assunto tão complexo quanto este. Mas, para as crianças, na verdade, responder esta questão é mais simples do que para os adultos, tão envolvidos que estão com as responsabilidades do mundo em que vivem.
A felicidade, como se diz em letra de música famosa, “é uma cidade pequenina, uma casinha, uma colina, qualquer lugar que se ilumina, quando a gente quer amar”. E é justamente neste ponto que as crianças, os poetas e os músicos parecem possuir uma sabedoria que muitas vezes falta até aos mais ilustres acadêmicos, estudiosos, filósofos e demais adultos responsáveis... A compreensão de que a felicidade está nas coisas simples, próximas, pequenas e cotidianas... Este alcance e entendimento só são possíveis a quem tem o coração mais puro, idealista, cândido - por isso acessível aos artistas e as crianças...
Aos olhos de uma criança, por exemplo, balançar numa rede, brincar no parquinho, chutar bola ou ler uma história contada por um mestre do quilate de Monteiro Lobato, como as “Reinações de Narizinho” são mais do que momentos felizes, constituem, na realidade, recortes de existências vividas em felicidade.
Uma caminhada para a escola, acompanhada de amigos pode ser igualmente saborosa. E quando isto se repete por dias a fio, ainda que possa parecer entediante aos olhos de muitos, é na realidade a oportunidade perfeita para reviver reinventando-se o tempo todo, a despeito das circunstâncias não parecerem favoráveis a isto. Ao menos aos olhos de uma criança é isto que acontece, não há tempo para a infelicidade, a dor, a amargura, o sofrimento...
Estes infortúnios também fazem parte da infância, mas mesmo diante deles as crianças parecem se sair melhor do que os adultos. Enquanto na cabeça de alguém que cresceu e deixou as calças curtas ou a Maria Chiquinha para trás qualquer problema parece sempre muito maior do que realmente é, para meninos e meninas os problemas não podem fazer o tempo escorregar por entre os dedos, fazendo com que eles deixem de viver de forma intensa tudo o que tem pela frente...
É o que percebemos, por exemplo, quando assistimos ao Curta-Metragem “Clandestina Felicidade”, de Beto Normal e Marcelo Gomes. Ao longo de seus 14 minutos embarcamos no túnel do tempo, rumo à infância, em Recife, de uma ucraniana/brasileira que se revelaria célebre escritora, Clarice Lispector.
A menina que amava os livros e as letras desde a mais tenra idade é astuta observadora da realidade e vai muito adiante disto, pois além de prestar atenção em tudo o que acontece ao seu redor, se envolve com as pessoas, os lugares, os bichos (como suas galinhas), as peculiaridades da cultura local, os livros, as coisas de criança...
E é de toda esta vivacidade e capacidade de ouvir, interagir, participar opiniões e compartilhar que nasce, floresce e se torna cada vez mais bela a voz que ecoou através de seus escritos, clássicos da literatura brasileira. De forma clandestina, ou seja, inserindo-se em todos os contextos, procurando saber, demonstrando curiosidade, disposta a vida, mesmo quando não era a protagonista, Clarice buscou a felicidade... E nela chegou!
Por João Luís de Almeida Machado, que como Clarice, sempre amou a vida e os livros e que hoje, adulto (mas com alma de artista), contempla esta mesma paixão pelas letras em sua filha Thaís...