A Semana - Opiniões
Educar em Rede
A Escola do Futuro já está sendo gestada
Gestação, de acordo com o dicionário Aurélio, pode ser definida como o “tempo decorrido da concepção até o nascimento” ou, de forma mais abreviada, como “gravidez”. Se quisermos ir um pouco além daquilo que o dicionário nos explica, podemos pensar em gestação de uma forma mais idílica e romântica, entendendo-a como os poetas, que a pensam como um acontecimento mágico, surgido a partir de um ato de amor e percebido como uma luz que se projeta no horizonte, no futuro...
Penso que as duas definições são complementares e igualmente importantes para a compreensão que precisamos ter da escola do futuro, que como disse no subtítulo deste artigo, “já está sendo gestada”.
A primeira, mais técnica e precisa, retirada do dicionário, dá para todos nós uma medida precisa, estabelece um parâmetro necessário ao qual todos devemos nos ater, mas que muitas vezes relegamos a segundo ou terceiro plano. Ao estipular que a gestação equivale a um período de tempo, estabelece que temos prazos e que, como tal, devemos estar atentos a eles.
Se, no que tange a gravidez propriamente dita, a natureza estipulou em nove meses o período da gestação, no que se refere à educação, não há certezas, reinam as indefinições. Ainda que as leis sejam os referenciais obrigatórios aos quais devemos nos ater, e que nelas se estabeleçam prazos, estes dados são apenas acessórios aos olhos daqueles que devem implementar as mudanças necessárias para melhorar a educação no país.
Estes acessórios, ou “perfumaria”, como queiram, relógios concebidos de forma artificial pelas mãos humanas, até tocam nos prazos previstos, mas diferentemente dos despertadores que teimam em nos acordar todos os dias para a labuta cotidiana, não criam o senso real de urgência e necessidade para as questões prementes da educação.
Por este motivo, continuamos a ver a educação sendo reformulada e atualizada no país em ritmo espasmódico e assimétrico entre o que se passa nos gabinetes em que se aprovam as leis e aquilo que ocorre nas salas de aula, em especial das redes públicas. Espasmos são os registros que ocorrem de norte a sul do Brasil em unidades escolares públicas ou privadas e que, de alguma forma garantem avanços e ganhos isolados que, apesar dos avanços das tecnologias de informação e comunicação, somente chegam a outros rincões depois de muito, muito tempo...
Deveríamos estar muito preocupados com isso. Gerenciar esta informação de forma eficiente garantiria acesso mais rápido aos avanços e, através de socialização em rede, permitiria que inúmeras escolas, senão em tempo real, mas com maior proximidade temporal, pudessem usufruir de conquistas localizadas.
Isto permitiria que a gestação da Escola do Futuro, constituída em nosso país a partir de vários espasmos ocorridos em diferentes localidades da ação de um sem número de agentes sociais relacionados à educação, fosse mais coesa, tranquila e de melhores resultados.
Discutem-se hoje no país, por exemplo, questões como Educação a Distância, a utilização de lousas e carteiras digitais, o projeto “Um computador por aluno”, o uso de estratégias como as redes sociais em sala de aula, os blogs como recursos a serem acessórios para os professores e alunos, as possibilidades do YouTube para a educação, uma melhor aplicação dos recursos áudio-visuais nas escolas (como o Cinema na Escola)... Enfim, há uma gama de possibilidades sendo testadas e apreciadas aqui, acolá e sabe-se Deus onde mais...
Mas o que efetivamente chega às escolas? Quando será possível conciliar para todas as redes e unidades escolares do país estas ações de forma uniforme? Será possível criar elementos que aproximem os sucessos das redes privadas das escolas públicas (e vice-versa)? De que adianta louvar experiências isoladas se tais ações ficam restritas a algumas localidades e não se tornam nacionais?
E aí voltamos, novamente, a gestação... Qualquer ginecologista que acompanhe o pré-natal de uma futura mamãe certamente irá aconselhar sua paciente a alimentar-se de forma variada e rica em nutrientes, a não carregar peso, a consumir algumas vitaminas, a ouvir música tranquila e conversar com seu bebê, a compartilhar a experiência de forma muito próxima com o futuro papai...
E isto não é nada diferente daquilo que precisamos para a gestação e nascimento de uma educação de qualidade para o nosso país... A Escola do Futuro, não apenas tecnologicamente adequada às demandas das novas gerações, precisa estar atenta aos prazos definidos para suas ações e informar-se quanto às transformações e realizações previstas para que efetivamente venha a melhorar como a futura mamãe que busca o auxílio da ginecologista...
Isto significa que o diálogo, a troca, o intercâmbio e, principalmente a comunicação, devem ser muito mais efetivas. As distâncias que ainda separam as diferentes regiões do país podem ser vencidas com ou auxílio da própria tecnologia. Os muros que ainda dificultam uma maior proximidade entre o que está sendo construído na universidade e o que ocorre nas escolas precisam ser demolidos. Redes públicas e privadas precisam trocar com regularidade informações que garantam acesso realmente universal a ações que promovam a qualidade da educação.
Educar em rede demanda ações mais pontuais e efetivas dos governos nas bases operacionais da educação brasileira, ou seja, nas próprias escolas. Discutir e elaborar leis e projetos que demandem medidas em prol de uma melhor educação no país é somente parte do caminho a ser trilhado. Realizar, efetivar, transformar estas propostas em ações é certamente o maior dos desafios para as políticas públicas.
Precisamos melhorar a “gestação” e garantir que o bebê que está a caminho nasça saudável, forte, vigoroso e capaz de trazer para o futuro da nação melhores perspectivas. Neste sentido, “Educar em Rede” constitui, talvez, a maior de todas as dificuldades, pois ainda não agimos e pensamos dessa forma, atuamos ainda em contextos reduzidos, não ampliando as ações para que tantos outros possam compartilhá-las, melhorá-las, recriar o que originalmente foi concebido, aplicá-las a diferentes contextos...
Falamos tanto em redes e, diga-se de passagem, utilizamos esta terminologia muito antes do advento da Internet, inclusive como termo corrente na educação, para nos referirmos as redes de escolas públicas ou privadas, mas... Em termos efetivos, o que realmente estamos constituindo, ou melhor, “gestando” para o futuro da educação?
Mais que tecnologias e inovações – também indispensáveis para a plena concepção da educação do futuro em nosso país e nos quatro cantos do mundo – precisamos também melhorar a alfabetização, elevar a qualidade do ensino das disciplinas, reforçar conceitos e práticas em prol de uma maior valorização das ciências, promover e consolidar a leitura, estreitar as relações entre educação e cultura, reforçar práticas empreendedoras a partir da escola...
Sendo assim, para que no amanhã tenhamos o tão sonhado “bebê saudável” que tanto almejamos, ou melhor - uma educação realmente de qualidade - precisamos efetivar práticas de educação em rede que distribuam, da forma mais equitativa possível não apenas a informação, mas os meios e as condições para que ações em prol da qualidade se efetivem por todas as escolas brasileiras. Para que a educação se torne, de fato, acontecimento mágico, surgida a partir do amor e percebida como luz que se projeta no horizonte, no futuro...