Filosofando
Resiliência
Limão e limonada / Tom Coelho
"O
problema não é o problema. O problema
é sua atitude com relação ao
problema." (Kelly Young)
Hoje a tristeza me visitou. Tocou a campainha, subiu as escadas, bateu
à
porta e entrou. Não ofereci resistência. Houve um
tempo em que eu fazia
o impossível para evitar que ela adentrasse os meus
domínios. E quando
isso acontecia, discutíamos demoradamente. Era uma
experiência
desgastante. Aprendi que o melhor a fazer é
deixá-la seguir seu curso.
Agora,
sequer dialogamos. Ela entra, senta-se na sala de estar,
sirvo-lhe uma bebida qualquer, apresento-lhe a televisão e a
esqueço!
Quando me dou por conta, o recinto está vazio. Ela partiu,
sem arroubos
e sem deixar rastros. Cumpriu sua missão sem afetar minha
vida.
Hoje a doença também me visitou. Mas esta tem
outros métodos. E outros
propósitos. Chegou sem pedir licença, invadindo o
ambiente. Instalou-se
em minha garganta e foi ter com minhas amígdalas. A
prescrição é sempre
a mesma: amoxicilina e paracetamol. Faço uso destes
medicamentos e
sinto-me absolutamente prostrado. Acho que é por isso que os
chamam de
antibióticos. Porque são contra a vida.
Não apenas a vida de bactérias e
vírus, mas toda e qualquer vida...
Hoje problemas do passado também me visitaram.
Não vieram pelo telefone
porque palavras pronunciadas ativam as emoções
apenas no momento e
depois perdem-se, difusas, levadas pela brisa. Vieram pelo correio,
impressos em papel e letras de baixa qualidade, anunciando sua
perenidade, sua condição de fantasmas eternos
até que sejam exorcizados.
Diante deste quadro, não há como deixar de
sentir-se apequenado nestes
momentos. O mundo ao redor parece conspirar contra o bem, a
estabilidade
e o equilíbrio que tanto se persegue. O desânimo
comparece estampado em
ombros arqueados e olhos sem brilho, que pedem para derramar
lágrimas de
alívio. Então, choro. E o faço porque
Maurice Druon ensinou-me, através
de seu inocente Tistu, que se você não chora, as
lágrimas endurecem no
peito e o coração fica duro. ( Limão e
Limonada)
As Ciências Humanas estão sempre tomando
emprestado das Exatas, termos e
conceitos. A última novidade vem da Física e
atende pelo nome de
resiliência. Significa resistência ao choque ou
à propriedade pela qual
a energia potencial armazenada em um corpo deformado é
devolvida quando
cessa a tensão incidente sobre o mesmo.
Em Humanas, a resiliência passou a designar a capacidade de
se resistir
flexivelmente à adversidade, utilizando-a para o
desenvolvimento
pessoal, profissional e social. Traduzindo isso através de
um dito
popular, é fazer de cada limão, ou seja, de cada
contrariedade que a
vida nos apresenta, uma limonada, saborosa, refrescante e
agradável.
Aprendi que não adianta brigar com problemas. É
preciso enfrentá-los
para não ser destruído por eles, resolvendo-os. E
rapidamente, de
maneira certa ou errada. Problemas são como bebês,
só crescem se forem
alimentados. Muitos deles resolvem-se por si mesmos. Mas quando
você os
soluciona de forma inadequada eles voltam, dão-lhe uma
rasteira e, aí
sim, você os anula corretamente. A felicidade pontuou Michael
Jansen,
não é a ausência de problemas. A
ausência de problemas é o tédio. A
felicidade é quando grandes problemas são bem
administrados.
Aprendi a combater as doenças. As do corpo e as da mente.
Percebê-las,
identificá-las, respeitá-las e
aniquilá-las. Muitas decorrem não do que
nos falta, mas do mal uso que fazemos do que temos. E a velocidade
é
tudo neste combate. Agir rápido é a palavra de
ordem. Melhor do que ser
preventivo é ser preditivo.
Aprendi a aceitar a tristeza. Não o ano todo, mas apenas um
dia, à luz
dos ensinamentos de Victor Hugo. O poeta dizia que "tristeza
não tem
fim, felicidade sim". Porém, discordo. Penso que os dois
são finitos. E
cíclicos. O segredo é contemplar as pequenas
alegrias ao invés de
aguardar a grande felicidade. Uma alegria destrói cem
tristezas...
Modismo ou não, tornei-me resiliente. A palavra em si pode
cair no
ostracismo, mas terá servido para ilustrar minha atitude
cultivada ao
longo dos anos diante das dificuldades, impostas ou auto-impostas, que
enfrentei pelo caminho, transformando desânimo em
persistência,
descrédito em esperança, obstáculos em
oportunidades, tristeza em
alegria. Nós apreciamos o calor porque já
sentimos o frio. Apreciamos a
luz porque já estivemos no escuro. Apreciamos a
saúde porque já fomos
enfermos.
Podemos, pois, experimentar a felicidade porque já
conhecemos a tristeza. Olhe para o céu, agora! Se for dia, o
sol brilha e aquece. Se for noite, a lua ilumina e abraça. E
assim será novamente amanhã. E assim é
feita a vida.