Universo Escolar
É uma língua brasileira com certeza...
E com certeza não uma língua portuguesa...
“Inspirado num trocadilho do reflão da música “Uma casa portuguesa”, interpretada pelo cantor português Roberto Leal, que fez sucesso no Brasil nos anos 80", o título acima me levou a uma reflexão sobre a origem e a identidade de nós brasileiros, que desde criança tivemos em sala de aula o nosso conhecimento embasado numa literatura didática, que sempre por todos fora aceita e nunca questionada. Elaborada por um grupo seleto de “intelectuais,” essa literatura direciona de uma maneira implícita - obviamente para não denegrir ou causar impactos negativos em nossa “democracia” - que a nossa língua e a nossa cultura não são valorizadas.
Quando me refiro à nossa língua, não estou falando da língua portuguesa propriamente dita como todos falam, mas sim, da língua brasileira. Dessa língua que teve sua origem oriunda da miscigenação do povo europeu com aqueles que foram os primeiros e verdadeiros donos dessa terra, os índios. Falo da língua que nos séculos XVIII e XIX foram enriquecidas pela cultura africana com a chegada dos negros. Falo dessa “língua aberta” que recebe influência de todos os povos do mundo formando uma grande bacia, que derramada em afluentes desemboca por todo o nosso território sob vários dialetos.
Vemos em “Iracema”, obra do romance de José de Alencar, que essa miscigenação já era retratada nos primórdios de nossa história. A história desse romance narra o relacionamento da índia Iracema com o português Martim nascendo o valente Moacir. Diz a lenda que desse casal descendeu milhões de brasileiros. Esse mesmo autor descreve ainda em sua outra obra, “O Guarani” as peripécias do valente índio Peri para encantar a sua amada Ceci. Nessa história o autor deixa uma incógnita, abrindo vários caminhos para o leitor decidir qual será o seu final. Mais adiante vemos Jorge Amado, o mestre da literatura brasileira, enaltecendo a convivência harmoniosa das raças como a dádiva mais rica dos brasileiros para a causa do humanismo.
Há de se destacar também as palavras do sábio Darcy Ribeiro em sua obra, O Povo Brasileiro: "Estamos nos construindo na luta para florescer amanhã como uma nova civilização, mestiça e tropical, orgulhosa de si mesma. Mais alegre, porque mais sofrida; melhor, porque incorpora em si mais humanidade; mais generosa, porque aberta à convivência com todas as raças e todas as culturas;
e porque assentada na mais bela e luminosa província da Terra."
Ora, se esses e outros autores destacam a convivência harmoniosa entre as raças, o humanismo em nosso solo enaltece a nossa cultura, a nossa língua, quebram paradigmas da discriminação, alavancadas por ideais maquiavélicos, por que então teimamos em não fazer de nossa língua, tão rica como destacado ser autenticamente brasileira? Por que não rompemos com as forças antagônicas que insistem estranhamente reduzir o valor dessa valiosa língua? Por que criar uma reforma ortográfica a fim de unificar a escrita de nossa língua com outras, cujas culturas são totalmente diferentes.
É triste saber que embora todos digam que somos um país do futuro, pois possuímos recursos naturais em abundância, temos um povo autêntico e humanitário, tudo para ser uma nação de primeiro mundo, entretanto infelizmente não temos aquilo que se caracteriza como a maior riqueza de um povo, a língua.
Oxalá num futuro a nossa língua hoje portuguesa, passe a ser chamada de língua brasileira, e que este grito possa se estender a todos os países, em que todos possam também criar a sua própria identidade e fazer florescer a sua verdadeira língua, como por exemplo, língua americana, língua argentina, língua peruana etc.
Se em 1822 demos o grito de liberdade, rompendo as algemas do domínio português, esse artigo também de certa forma é um brado de inconformismo por chamarmos a nossa língua de portuguesa. Por outro lado, ele também desponta crepusculamente um raio de esperança, de que o sol da liberdade em raios fulgidos brilhe em nossa língua nesse instante.