Universo Escolar
Relatório de Participação
Conferência Nacional de Educação Básica
A Conferência Nacional de Educação Básica, com caráter deliberativo, teve como o objetivo principal apresentar, a partir de um diagnóstico da realidade educacional brasileira elaborado por meios de conferências municipais e estaduais, um conjunto de propostas que orientarão programas e políticas educacionais no âmbito da educação básica, em todos os níveis de governo.
Os objetivos específicos, constantes em seu regimento interno, foram:
I – Promover a construção do Sistema Nacional Articulado de Educação, como conseqüência de um regime de colaboração que garanta a institucionalização de um trabalho permanente do Estado com a Sociedade, no sentido da garantia do direito à educação;
II – Indicar, para o conjunto das políticas educacionais de forma articulada entre os sistemas de ensino, a garantia da democratização da gestão e da qualidade social da educação básica;
III – Definir
parâmetros e diretrizes para contribuir com a
qualificação do
processo de ensino e aprendizagem;
IV – Apontar os requisitos básicos para a definição de políticas educacionais que promovam a inclusão social, de forma articulada, entre sistemas de ensino. Foi organizada em cinco grandes eixos de discussão, cada um deles com uma conferência.
Foram eles:
Eixo I - Os Desafios da
Construção de um Sistema Nacional Articulado de
Educação;
Eixo II - Democratização da Gestão e Qualidade Social da Educação;
Eixo III - Construção do Regime de Colaboração entre os Sistemas de Ensino, tendo como um dos instrumentos o Financiamento da Educação;
Eixo IV - Inclusão e Diversidade na Educação Básica;
Eixo V - Formação e Valorização Profissional.
Além das conferências, houve a realização de 34 colóquios para discutir os temas que seriam votados.
Nossa participação ficou concentrada nos dois colóquios referentes à Educação.
Especial que estavam alocados nos eixos, II e IV respectivamente:
1. Transversalidade da educação especial na educação básica.
a. Cláudio Roberto Baptista – apresentou dados sobre pesquisas realizadas no Neipe – Núcleo de Estudos de Políticas de Inclusão Escolar na UFRGS – acerca de dados mundiais sobre políticas de inclusão nos países europeus e das diferentes diretrizes adotadas pelos mesmos.
b. Antonio Carlos do Nascimento Osório – fez uma retrospectiva histórica dos conceitos de aprendizagem e de desenvolvimento e sua importância na construção da idéia de educação inclusiva. Foi incisivo em relação ao direito à diversidade e a importância de ambientes heterogêneos para o sucesso educacional dos alunos.
c. Magela Lindner Formiga
– apresentou e experiência do município
de Esteio.
2. Educação de pessoas com deficiências, altas habilidades/superdotadas.
a. Rosângela Machado – apresentou e experiência do município de Florianópolis, focando sua apresentação no Atendimento Educacional Especializado.
b. Patrícia Cunha – apresentou e experiência do município de Belo Horizonte enfocando experiências exitosas nas salas de aulas da escola regular comum no atendimento de alunos com transtornos globais do desenvolvimento.
c. Claudia Werneck – centrou seu discurso na idéia de construção de uma sociedade inclusiva e de seus estudos sobre o papel da mídia e trabalho a frente da Escola de Gente.
Após as discussões nos 34 colóquios, houve a realização de plenárias por Eixos Norteadores, onde foram discutidos o Documento Base composto por Emendas Incorporadas ao Documento Referência, Propostas Vinculadas a cada Eixo Temático e Propostas para a Construção de Políticas Públicas Educacionais, oriundas dos estados.
As Emendas Incorporadas foram votadas em bloco, salvo aquelas que foram objeto de destaque por parte dos delegados.
O conjunto das Propostas Vinculadas a cada Eixo Temático foram debatidas e votadas. As propostas de Construção de Políticas Públicas Educacionais, embora não precisassem ser debatidas para constarem no documento final, no caso específico do Eixo IV - Inclusão e Diversidade na Educação Básica, foram todas debatidas e aprovadas pela plenária do Eixo. A este eixo coube a discussão dos seguintes assuntos:
• Formação de professores para a diversidade e valorização docente;
• Políticas Públicas;
• Gestão Escolar;
• Prática Educativa e Diversidade;
• Educação do campo;
• Educação e Afrodescendência;
• Educação Indígena;
• Educação Especial;
• Educação Ambiental;
• Crianças e Adolescentes em Situação de Risco;
• Diversidade Sexual;
• Organização da jornada Escolar;
• Violência na Escola.
Cabe apontar que a dinâmica dessas plenárias de eixos foi questionada, uma vez que pela metodologia implantada, foram disponibilizadas apenas três horas de discussão, que deveriam ser cumpridas independentemente do término das discussões ou não.
No eixo do qual participamos, o grupo resolveu “desobedecer” essa regra e ficou até o último ponto ser discutido. Assim, todas as emendas sugeridas foram analisadas pelo grupo que participou da plenária no eixo IV.
Em relação à educação especial, foram encaminhadas como apreciadas e aprovadas todas as emendas para a plenária geral. Portanto foram incorporados ao documento:
1- A
educação especial, na perspectiva da
educação inclusiva, tem como
objetivo assegurar a inclusão escolar de alunos com
deficiências,
transtornos globais do desenvolvimento e altas
habilidades/superdotação nas turmas comuns do
ensino regular,
orientando os sistemas de ensino para garantir o acesso ao ensino
comum, a participação, a aprendizagem e
continuidade nos níveis mais
elevados de ensino; a transversalidade da
educação especial desde a
educação infantil até a
educação superior, a
formação de professores
para o atendimento educacional especializado e demais profissionais da
educação para a inclusão; a
participação da família e da
comunidade; a
acessibilidade arquitetônica, nos transportes, nos
mobiliários, nas
comunicações e informações;
e a articulação intersetorial na
implementação das políticas
públicas.
2- Oferta do Atendimento Educacional Especializado, extra turno aos estudantes com deficiência, altas habilidades/superdotação e com transtornos globais do desenvolvimento, de preferência na rede pública de ensino, com professores e profissionais especializados com formação nas diferentes áreas da educação especial estipulando o número de alunos por turno.
3- Transformação dos sistemas educacionais em sistemas educacionais inclusivos e a afirmação da escola como espaço fundamental para a valorização da diversidade e garantia da cidadania.
4- Criar formas e mecanismos de melhorar o acesso e permanência dos alunos com Necessidades Educacionais Especiais nas classes comuns do ensino regular, fortalecendo a inclusão educacional nas escolas públicas.
5- Incluir
crianças, adolescentes e jovens com necessidades educacionais
especiais no ensino regular.
6- Realizar o debate da inclusão em toda educação básica, aprofundando a discussão sobre a construção de aprendizagens nos diversos espaços educativos, assim como a reflexão a respeito da superação da enturmação por nível de conhecimento e a possibilidade de avanço e de desenvolvimento de cada aluno na sua individualidade e seu desenvolvimento integral, com uma atenção especial ao ensino médio, tendo em vista o pouco acúmulo e debate sobre a inclusão para este nível de ensino.
7- Priorizar inclusão de crianças com deficiência e transtornos globais do desenvolvimento na educação infantil, buscando a universalização do acesso e garantindo a permanência da oferta de atendimentos educacionais especializados em estimulação precoce.
8- Expandir e fortalecer o Atendimento Educacional Especializado, que deve ser realizado no contra turno, disponibilizando acesso ao currículo e proporcionando independência para a realização de tarefas e construção de autonomia. Esse serviço diferencia-se da atividade da sala de aula comum, não sendo substitutivo à escolarização.
9- Implementar
serviços de apoio especializado, através da
organização e
implementação da sala de recursos
multifuncionais, visando promover o
atendimento individualizado dos alunos com necessidades educacionais
especiais (deficiências, transtornos globais do
desenvolvimento e altas
habilidades) nas escolas públicas, com a
atuação de profissionais
qualificados.
10-
Efetivação das redes de apoio aos sistemas
educacionais, através de
parcerias com a saúde, ação social e
cidadania para atender as pessoas
com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e
altas
habilidades/superdotação.
11- Ampliar a equipe multiprofissional para o atendimento especial nas escolas públicas regulares.
12- Garantir, quando necessário, a presença do professor auxiliar, do tradutor intérprete, do guia intérprete para as salas do ensino regular com alunos inclusos de modo a viabilizar sua permanência no processo de escolarização.
13- Garantir a formação continuada dos trabalhadores da educação do ensino regular conteúdos referentes à inclusão de pessoas com deficiência.
14- Implementar/incluir os conteúdos programáticos de Educação Especial na formação docente em curso de formação profissional.
15- Definir diretrizes para as instituições de ensino superior, garantindo o processo de inclusão na formação de profissionais da educação.
16- Oferecimento de oportunidades de formação continuada, inclusive em nível de especialização, pelas instâncias educacionais reconhecidas, aos professores que já estão exercendo o magistério.
17- Distribuir livros, materiais didáticos, equipamentos e mobiliários adaptados para alunos com necessidades especiais.
18- Garantir financiamento para a aquisição de transporte escolar para atender aos alunos com necessidades educacionais especiais que apresentem limitações físicas e mobilidade reduzida.
19- Incluir a LIBRAS na educação básica.
20- Políticas públicas para o ensino de LIBRAS para os profissionais servidores.
21- Legalização da profissão do intérprete educacional e implantação do curso de Letras/Libras em todas as instituições de Ensino Superior.
22- Fortalecer parcerias com órgãos governamentais e não governamentais para promover acessibilidades arquitetônicas, serviços de saúde, assistência social, justiça e trabalho.
23- Criar e cumprir mecanismos que garantam a acessibilidade para favorecer o desenvolvimento do processo educacional, garantindo acessibilidade a todos os espaços da escola (adequando as já existentes), a comunicação, mobiliários, materiais didáticos e pedagógicos.
24- Oferta de EJA diurna para alunos com necessidades especiais
25- Inserir adolescentes e jovens com necessidades educacionais especiais no mercado de trabalho.
Também é importante ressaltar, que no eixo III, cuja discussão estava voltada sobre a “Construção do Regime de Colaboração entre os Sistemas de Ensino, tendo como um dos instrumentos o Financiamento da Educação” foi aprovada a seguinte emenda:
1- Evitar o conveniamento em estabelecimentos de educação especial. Isso fere o princípio legal da educação inclusiva. É preciso que APAEs e instituições similares sejam compreendidas como estabelecimentos assistenciais e não educacionais. O FUNDEB deve investir apenas em educação e não em assistência.
Vale lembrar que estas emendas, destes e dos demais eixos foram produzidas por representantes de movimentos sociais, sindicatos, organizações não governamentais e diversos setores da educação de todo o país.
Vários destes que estavam presentes nos Congressos Nacionais de Educação (CONEB) realizados desde o ano 1996 até o ano de 2004. Assim, essa pauta de lutas vem sendo construída e reavaliada ao longo de vários anos e já está posta em todos os espaços onde o debate sobre educação tem acontecido. Muitas delas, por exemplo, já constam do Plano Nacional de Educação: proposta da sociedade brasileira.
No caso específico da Conferência Nacional, cabe destacar que ela foi antecedida por Conferências Estaduais de Educação Básica, onde muitas das emendas foram feitas e incorporadas à versão preliminar do Documento Base. Justamente, no sentido de aprimorar esse caráter democrático, algumas mudanças foram sugeridas para a próxima Conferência Nacional de Educação Básica, a ser realizada em 2010, como a ampliação dos temas com discussões sobre educação superior e profissional e a inclusão de etapas municipais, no sentido de envolver mais as escolas no processo. Houve também a reivindicação de ampliação da Comissão Organizadora e a incorporação na mesma dos movimentos sociais.
No caso da Educação Especial houve em 2007, vários encontros promovidos pela Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação para a formulação do documento Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva.
Propostas formuladas nestes
encontros foram também encaminhadas às
Conferências Estaduais de Educação
Básica. Cabe ressaltar que o documento
final enviado ao Ministro da Educação em janeiro
de 2008 contém apenas o que a
comissão responsável pelo mesmo entendeu que eram
consensos entre os grupos de
debate, dentro do princípio da
educação especial na perspectiva da
educação
inclusiva.
Acreditamos assim, que o documento final da Conferência Nacional de Educação Básica, que ainda está sendo sistematizado e será publicado, enfatiza o resgate da escola pública como espaço de educação para todos, bem como o dever constitucional do Estado brasileiro para com a mesma. Reforça uma das prioridades históricas dos movimentos dos educadores qual seja a construção de um sistema nacional de educação articulado, presente como reivindicação no Manifesto final do V CONED (2005).
“O Sistema Nacional de Educação articulado e o Fórum nacional de Educação deliberativo ainda não foram constituídos, como também não foram reformuladas a composição e atribuições do Conselho Nacional de Educação”.
Este Sistema Nacional de Educação Articulado, também está delineado nos seis pilares do Plano de Desenvolvimento da Educação: visão sistêmica da educação, territorialidade, desenvolvimento, regime de colaboração, responsabilização e mobilização social.
A perspectiva da educação inclusiva sai fortalecida desta Conferência Nacional de Educação Básica por sustentar e ser sustentada por uma política pública que visa a efetivar os direitos na prática social, unindo uma legislação que adota princípios universais e grupos sociais interessados em não ficar a margem de conquistas como educação e cidadania. Em termos de educação especial, o destaque de propostas acerca da formação continuada de professores; da organização de equipamentos, recursos, materiais didáticos e pedagógicos e adequações de prédios escolares para romper com as diversas barreiras; e a oferta de atendimento educacional especializado dão formato a uma educação especial que está a serviço da educação como um todo e que, desta forma, garante seu espaço na efetivação de uma educação para todos.
Liliane Garcez
Raquel Regina Rodrigues Monteiro
Carta de Princípios
Fórum Permanente de Educação Inclusiva
1. Defendemos a inclusão total e incondicional de todas as pessoas em todos os contextos sociais e o direito de serem beneficiárias dos bens públicos e privados.
2. Defendemos o processo de transformação da sociedade para atender à singularidade humana e à pluralidade cultural, o que implica em rupturas e mudanças políticas, econômicas e sociais.
3. Defendemos a cultura da diversidade em oposição à cultura do preconceito, com base nos direitos humanos fundamentais de igualdade, participação, solidariedade e liberdade.
4. Defendemos a cultura da
diversidade na educação não como busca
do
melhor modelo educativo individual ou de
adaptações curriculares, mas da
construção de sistemas educacionais inclusivos
que assegurem o acesso e
permanência de todos como resultado da qualidade social da
educação.
5. Defendemos a educação como um direito de todos e dever do Estado, seja esse o provedor dos serviços educacionais ou fiscalizador dos serviços prestados por entidades privadas.
6. Defendemos a gestão democrática e controle social em todas as instâncias dos sistemas de ensino e nas unidades escolares.
7. Defendemos que a educação escolar é o instrumento fundamental de desenvolvimento individual, social, cultural, político e econômico do país para garantir o exercício da cidadania.
Contato: lilianegarcez@gmail.com