Universo Escolar
"Modelo Segregador de Escola precisa ser Erradicado"
Entrevistado pelo Jornal da AME, Fábio Adiron discute a questão da Educação Inclusiva.
O consultor em marketing, Fábio Adiron, 47 anos, casado, é membro da Comissão Executiva do Fórum Permanente de Educação Inclusiva e moderador do grupo Síndrome de Down.
Graduado em comunicação, é Coordenador do Curso de Especialização em Marketing Direto da ABEMD - Associação Brasileira de Marketing Direto e palestrante do IIR - Institute of International Research.
Em que mais se destaca, no entanto, é na defesa incondicional da Educação Inclusiva. Tem dois filhos: Samuel, de 8 anos, com síndrome de Down, e Letícia, de 6 anos.
Contato: Fábio Adiron [fadiron@terra.com.br]
Ao Jornal da AME concedeu entrevista exclusiva.
Confira!
AME - Como foi o "momento da notícia", como se sentiu quando soube que seu filho nasceu (ou nasceria) com síndrome de Down?
Fábio Adiron - O momento da notícia sempre é traumático. É um choque de expectativas. No meu caso, além da questão da síndrome de Down, o Samuel nasceu com uma cardiopatia séria (foi operado com 8 meses de vida), então, no primeiro momento, a preocupação nem era com a síndrome, mas com a sobrevivência. De qualquer forma, mesmo quando a notícia é dada de forma adequada (que não foi o caso), ela é assustadora.
AME - Antes dele, você havia tido contato com pessoas com deficiência?
Fábio Adiron - Antes do Samuel, havia tido contato somente com o filho de uma amiga da minha mãe, que tem hidrocefalia.
AME - Como foram os primeiros momentos de escola de seu filho e seu envolvimento com esse momento?
Fábio Adiron - Foram ótimos, ele adorou ir para a escola, conviver com mais crianças. Nós sempre nos preocupamos com o modelo educativo da escola, não só porque o Samuel tem SD, mas porque nos preocupamos com o que a escola vai colocar na cabeça dos nossos filhos. Nós levamos para a escola um modelo conceitual de inclusão que é o Projeto Roma e temos trabalhado em casa e na escola com muitos dos seus princípios.
AME - E o que é Projeto Roma?
Fábio Adiron - É uma proposta pedagógica, concebida, a partir de 1990, em uma investigação conjunta com a Universidad de Bologna e o Hospital Menino Jesus, de Roma, pelo Prof. Miguel Lopes Melero, atualmente professor na Faculdad de Ciencias de la Educación, Málaga, Espanha.
O foco central do projeto Roma é justamente tirar o foco central das pessoas com deficiência. As intervenções propostas não estão dirigidas às pessoas, mas ao contexto. É a partir do contexto humano, culturalmente rico, que as pessoas se apropriam de ferramentas da cultura, como a linguagem, por exemplo. Um segundo ponto apresentado pelo projeto, não menos importante, é a confiança na capacidade de aprendizado das pessoas. Se não existe essa confiança, não há o comprometimento necessário para a relação de ensino e aprendizagem.
No Brasil, está sendo usado, desde 1999, por alguns grupos de pais em Belo Horizonte, Campinas, São Paulo, Recife e Brasília.
AME - Qual é a sua concepção de inclusão educacional?
Fábio Adiron - Minha concepção é bastante simples. A escola como qualquer contexto social, deve ser de qualidade para todas as pessoas. Eu não acredito na inclusão das pessoas com deficiência. Ou a inclusão é de todos ou não é de ninguém.
AME - Como formou a sua idéia de educação inclusiva?
Fábio Adiron - Num primeiro momento, visitando escolas especiais e descobrindo que não era aquilo que eu queria para os meus filhos. Depois, com bastante leitura e participação em grupos inclusivos. Devo muito a algumas pessoas, dentre as quais destaco a Professora Maria Tereza Mantoan, de Campinas, e o Professor Miguel Lopes Melero, e também a pessoas que resolveram transgredir o status quo e lutaram pela inclusão como a Margarida Seabra, a Glória Amato e outros pais e mães. Nunca é demais ressaltar: Margarida Seabra é advogada em Natal, RN.
Ao contrário do que preconizavam todas as idéias na época que nasceu sua filha com Síndrome de Down (25 anos atrás), ela lutou pela inclusão da filha, que nunca estudou em alguma escola que não fosse comum. Hoje a Débora é professora (formada em Magistério), trabalha numa escola de educação infantil e foi a vencedora do prêmio Sentidos.
Glória Amato é mãe da Mariana (que tem quase 30 anos), foi ativa no movimento "apaeano", de onde saiu por acreditar que o futuro das pessoas com SD estava na inclusão e não na segregação.
AME - Quais são os principais entraves para a efetiva inclusão educacional?
Fábio Adiron - O principal entrave são as barreiras atitudinais. E não estou falando só de preconceito. As pessoas (e professores) têm medo de lidar com as pessoas com deficiência, como se elas fossem seres de outro planeta. Com isso, caem em um dos dois erros opostos, ou fogem dessa responsabilidade ou adotam uma postura assistencialista e superprotetora, quando deveriam tratá-las como outros seres humanos. Tanto de um lado (rejeição) como de outro (superproteção), a pessoa com deficiência sai perdendo e não é preparada para a autonomia.
AME - O que pensa sobre as escolas especiais?
Fábio Adiron - Depende. Se nos referirmos às escolas especiais que se dedicam ao ensino de questões especiais (tecnologias assistivas, comunicação especial), elas são extremamente úteis no desenvolvimento das pessoas com deficiência e complementam o aprendizado. Agora, se por escola especial nos referirmos ao modelo segregador que afasta as pessoas com deficiência da sociedade e as mantém escondidas em guetos, essas são uma praga que precisa ser erradicada.
AME - Qual a diferença entre a educação especial e a educação inclusiva?
Fábio Adiron - Acho que a diferença está em educação especial e educação comum. A escola comum precisa ensinar as coisas comuns, não existe uma "pedagogia da pessoa com deficiência", não existe geografia do surdo ou a matemática da pessoa com síndrome de Down. Existem Geografia, Matemática, Língua Portuguesa, etc. Educação especial é para currículo especial. Creio que os profissionais das escolas especiais poderiam contribuir com a inclusão educacional funcionando como apoio complementar (e nunca substitutivo) naquelas situações em que são necessários suportes especiais.
AME - Poderia deixar uma mensagem a nossos leitores?
Fábio Adiron - O ponto de partida para educar qualquer pessoa é a confiança de que ela possa aprender. Se não acreditarmos nisso, não vamos fazer nenhum esforço para ensinar. E, quando nos recusamos a ensinar, obviamente ninguém aprende. As pessoas com deficiência, mostradas como exemplos de sucesso, são apenas pessoas em quem alguém acreditou que aprenderiam.